Acórdão Nº 4020500-15.2019.8.24.0000 do Segundo Grupo de Direito Criminal, 30-10-2020

Número do processo4020500-15.2019.8.24.0000
Data30 Outubro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Piçarras
ÓrgãoSegundo Grupo de Direito Criminal
Classe processualRevisão Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Revisão Criminal n. 4020500-15.2019.8.24.0000

Relatora: Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho

REVISÃO CRIMINAL. ROUBO DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA E CONCURSO DE AGENTES (ART. 157, § 2º, I E II, DO CÓDIGO PENAL, COM REDAÇÃO ANTERIOR À LEI N. 13.654/18). PRELIMINARES DE NULIDADE DO PROCESSO. ATOS PROCESSUAIS OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 11.719/08. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. DESNECESSIDADE DE REPETIÇÃO DE ATOS PRATICADOS SOB O MANTO DA LEI REVOGADA.

NULIDADE POR AUSÊNCIA DE CITAÇÃO PESSOAL DO ACUSADO PRESO. REQUISIÇÃO PARA O INTERROGATÓRIO DEVIDAMENTE ATENDIDA. PROCEDIMENTO QUE SEGUIU OS DITAMES DO ART. 394 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL VIGENTE À ÉPOCA. ADEMAIS, RECONHECIMENTO DE NULIDADE QUE DEPENDE DA COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO À PARTE, O QUE NÃO SE VERIFICA NO CASO CONCRETO.

ALEGADA NULIDADE POR DESRESPEITO AO INTERROGATÓRIO COMO ÚLTIMO ATO DA AUDIÊNCIA INSTRUTÓRIA. MÁCULA NÃO VERIFICADA. INTERROGATÓRIO DO RÉU PRATICADO ANTES DO ADVENTO DA LEI N. 11.719/08. PRESERVAÇÃO DOS ATOS REALIZADOS SOB À ÉGIDE DE LEI PROCESSUAL VIGENTE À ÉPOCA DE SUA CONCRETIZAÇÃO. ADEMAIS, OITIVA DAS TESTEMUNHAS POR CARTA PRECATÓRIA QUE NÃO SUSPENDE A INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PROCEDIMENTO QUE ADMITE A INVERSÃO DA ORDEM. EXEGESE DO ART. 222, §§ 1º E 2º C/C ART. 400, AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. OUTROSSIM, AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO EM MOMENTO OPORTUNO E PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO.

NULIDADE DO ATO PELA AUSÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO INTERROGATÓRIO. INSUBSISTÊNCIA. PRESCINDIBILIDADE DA PRESENÇA DA ACUSAÇÃO PARA A REALIZAÇÃO DO ATO, MAS TÃO SOMENTE A DO DEFENSOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 185 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.

LEVANTADA NULIDADE PELA ERRÔNEA NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVA PARA O INTERROGATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. ACUSADO QUE AFIRMOU, NA REFERIDA AUDIÊNCIA, NÃO TER CONDIÇÕES DE CONTRATAR ADVOGADO.

NULIDADE DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA AO ARGUMENTO DE QUE FOI AUTORIZADA JUDICIALMENTE POR JUÍZO DE OUTRA COMARCA, ALÉM DA IMPOSSIBILIDADE DE SE UTILIZAR COMO PROVA EMPRESTADA. TESE RECHAÇADA. ADMISSIBILIDADE DA PROVA EMPRESTADA, DESDE QUE TENHA HAVIDO A CORRELATA OBSERVÂNCIA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. PRECEDENTES. PRINCÍPIOS ASSEGURADOS NO CASO. DECISÃO ANEXADA AO FEITO AINDA NA FASE INDICIÁRIA.

AUSÊNCIA DE JUNTADA AOS AUTOS DA MÍDIA EM QUE FOI GRAVADA A CONVERSA DO ACUSADO E SEUS COMPARSAS. EIVA AFASTADA. PROVA OBTIDA LICITAMENTE. PREENCHIDO OS REQUISITOS NECESSÁRIOS. DEGRAVAÇÃO EFETUADA POR POLICIAIS. PRESCINDIBILIDADE DA JUNTADA DO CONTEÚDO INTEGRAL DAS DEGRAVAÇÕES DAS ESCUTAS TELEFÔNICAS REALIZADAS NOS AUTOS DO INQUÉRITO.

NULIDADE NO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO DO AUTOR. AUSÊNCIA DE MÁCULA FULMINANTE. ART. 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL QUE APENAS VEICULA RECOMENDAÇÕES À PRODUÇÃO DA PROVA. CONJUNTO PROBATÓRIO VÁLIDO, CONSIDERANDO O PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO MAGISTRADO. ELEMENTO INFORMATIVO IDÔNEO QUE RATIFICA AS DEMAIS PROVAS ACOSTADAS AOS AUTOS. NULIDADE AUSENTE.

AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEFENSOR NOMEADO ACERCA DO ACÓRDÃO CONDENATÓRIO. TESE AFASTADA. EXTENSO LAPSO ATÉ A ARGUIÇÃO. PRECLUSÃO. PREFACIAIS AFASTADAS.

MÉRITO. ABSOLVIÇÃO POR FALTA DE PROVAS E ADEQUAÇÃO DA REPRIMENDA. TESES JÁ ENFRENTADAS EXPLICITAMENTE QUANDO DA APRECIAÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELO REVISIONANDO. NÍTIDO CARÁTER DE REEXAME E REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. PLEITO INCABÍVEL. NÃO CONHECIMENTO, NO PONTO.

JUSTIÇA GRATUITA. AÇÃO SEM ÔNUS PROCESSUAIS. FALTA DE INTERESSE. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO.

REVISÃO CRIMINAL PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, INDEFERIDA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Revisão Criminal n. 4020500-15.2019.8.24.0000, da comarca de Balneário Piçarras 2ª Vara em que é Requerente Mario Jorge Rodrigues.

O Segundo Grupo de Direito Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer em parte da revisional para, na parte conhecida, afastar as preliminares e indeferir o pedido. Sem custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pela Excelentíssima Desembargadora Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer, com voto, e dele participaram os Excelentíssimos Desembargadores Luiz Antônio Zanini Forneroli, Carlos Alberto Civinski, Getúlio Corrêa, Ernani Guetten de Almeida, Luiz César Schweitzer, Sidney Eloy Dalabrida e Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva.

Funcionou como representante da Procuradoria-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho.

Florianópolis, 30 de outubro de 2020.

Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho

Relatora

RELATÓRIO

Mário Jorge Rodrigues, com fulcro no artigo 621, inciso I, do Código de Processo Penal, ajuizou a presente revisão criminal contra a sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da comarca de Piçarras/SC, nos autos da ação penal n. 0001812-51.2004.8.24.0048, que condenou o Revisionando como incurso nas sanções do art. 157, §2º, incisos I e II, do Código Penal (com redação anterior à Lei n. 13.654/18), ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos (fls. 292/299).

Irresignada com o decreto condenatório, a defesa interpôs recurso de apelação (2012.018409-7) e a Colenda Quarta Câmara Criminal deste Tribunal, por meio de acórdão da lavra do eminente Des. Jorge Schaefer Martins, por votação unânime, decidiu conhecer do recurso e negar-lhe provimento (fls. 366/374), cuja decisão transitou em julgado para a acusação em 24.09.2013 (fl. 378) e para a defesa em 03.09.2013 (fl. 376).

Pretende o Requerente, em síntese e preliminarmente, o reconhecimento de uma série de nulidades absolutas no decorrer da persecução penal, entre elas: a) falta de citação pessoal do revisionando para resposta à acusação; b) inversão processual do interrogatório do réu; c) não houve a presença do Ministério Público no interrogatório do réu; d) indevida nomeação de defensor dativo para o ato do interrogatório judicial; e) ausência de autorização judicial das interceptações telefônicas; f) não consta nos autos os CD Player das interceptações telefônicas; g) violação do artigo 226, do Código de Processo Penal referente ao reconhecimento fotográfico realizado em sede administrativa; e h) ausência de intimação pessoal do defensor dativo do acórdão confirmatório. No mérito, caso vencidas as nulidades arguidas, pugnou pela absolvição do Requerente, por falta de provas aptas à embasar o édito condenatório, bem como que seja "revisada e alterada a dosimetria da sentença de origem", além da concessão do benefício da justiça gratuita (fls. 1/49).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, manifestando-se pelo "parcial conhecimento e parcial provimento desta revisão, para anular o processo desde a declaração do trânsito em julgado" (fls. 414/426).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de revisão criminal proposta contra a sentença proferida nos autos da ação penal 0001812-51.2004.8.24.0048, que tramitou perante a 2ª Vara Criminal da comarca de Piçarras/SC, na qual Mário Jorge Rodrigues foi condenado à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do delito descrito no artigo 157, §2º, incisos I e II, do Código Penal, com redação anterior à Lei n. 13.654/18.

Preambularmente, consigna-se que a ação revisional tem por finalidade a viabilidade da desconstituição da decisão acobertada pela coisa julgada, não se prestando para rediscutir prova.

A propósito, o art. 621 do Código de Processo Penal preceitua:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

A demanda possui caráter excepcional e tem por finalidade corrigir eventual erro judiciário, sendo provida apenas nas hipóteses taxativas do art. 621 do Código de Processo Penal. Ademais, tendo em vista o seu objetivo de desconstituir a coisa julgada, não se confunde com o recurso de apelação criminal.

O doutrinador Guilherme Nucci aborda o tema:

O objetivo da revisão criminal não é permitir uma "terceira instância" de julgamento, garantindo ao acusado mais uma oportunidade de ser absolvido ou ter reduzida sua pena, mas, sim, assegurar-lhe a correção de um erro judiciário. Ora, este não ocorre quando um juiz dá a uma prova uma interpretação aceitável e ponderada. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 1071).

No caso dos autos, o pedido revisional do Requerente está amparado no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal, por meio do qual postula, preliminarmente, o reconhecimento de nulidades processuais, e no mérito, a absolvição do Revisionando, a redução da reprimenda e a concessão de justiça gratuita.

Compulsando os autos recursais, sobretudo acerca dos pedidos preliminares de reconhecimento de diversas nulidades absolutas, observo que o Douto Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão bem resumiu os pleitos, razão pela qual transcrevo excerto do seu parecer: "Em síntese, com amparo no art. 621, inc. I, do Código de Processo Penal, o requerente sustenta que a sentença condenatória é contrária ao texto expresso da lei, apontando as seguintes nulidades: (a) ausência da sua citação pessoal para...

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