Acórdão Nº 4025488-79.2019.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Civil, 24-11-2020

Número do processo4025488-79.2019.8.24.0000
Data24 Novembro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão




Agravo de Instrumento n. 4025488-79.2019.8.24.0000, de Balneário Camboriú

Relator: Desembargador Saul Steil

EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DECISÃO QUE ACOLHEU EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE E RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DE IMÓVEL COM BASE NA LEI N. 8.009/90. IRRESIGNAÇÃO DA EXEQUENTE. ALEGAÇÃO DE INAPLICABILIDADE DA IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA AO CASO POR SUBVERSÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA, EM RAZÃO DE OFERECIMENTO DO BEM À PENHORA PELA EXECUTADA EM DIVERSAS OPORTUNIDADES. ALEGAÇÃO DA AGRAVADA DE MÁ-FÉ DE SEUS ANTIGOS PROCURADORES, OS QUAIS NÃO DETINHAM AUTORIZAÇÃO EXPRESSA PARA INDICAR SEU IMÓVEL RESIDENCIAL À PENHORA. CONSTRIÇÃO REALIZADA DIRETAMENTE POR OFICIAL DE JUSTIÇA, SEM INDICAÇÃO PRÉVIA POR NENHUMA DAS PARTES. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA PENHORA E AVALIAÇÃO PELA EXECUTADA, INTIMADA PESSOALMENTE. DECURSO DE ONZE ANOS DE TRAMITAÇÃO DO PROCESSO SEM ALEGAÇÃO DA IMPENHORABILIDADE, TANTO PELO ANTIGOS PROCURADORES COMO PELO ATUAL ADVOGADO. ATUAÇÃO DE MÁ-FÉ E DESVIRTUAMENTO DA IMPENHORABILIDADE PARA ATRASAR OU IMPOSSIBILITAR A QUITAÇÃO DA DÍVIDA. MITIGAÇÃO DA IMPENHORABILIDADE TAMBÉM BASEADA EM RECONHECIDA FRAUDE À EXECUÇÃO ANTERIOR PERPETRADA PELA EXECUTADA EM CONLUIO COM SEUS ANTIGOS ADVOGADOS. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO PARA AFASTAR A IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4025488-79.2019.8.24.0000, da comarca de Balneário Camboriú 4ª Vara Cível em que é/são Agravante(s) Ângela Maria Rocha Me e Agravado(s) Rita de Cássia Carneiro e outros.

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso para reformar a decisão recorrida e, confirmando a antecipação da tutela recursal concedida às fls. 25-35, afastar a impenhorabilidade do bem de família, prevista no art. 1º da Lei n. 8.009/90, do imóvel matriculado sob o n. 2.169 no 2º Ofício do Registro de Imóveis da comarca de Balneário Camboriú e restabelecer a penhora realizada sobre o referido imóvel. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Marcus Tulio Sartorato, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Gerson Cherem II.

Florianópolis, 24 de novembro de 2020.

Desembargador Saul Steil

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Ângela Maria Rocha ME contra a decisão interlocutória proferida pelo MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Cível da comarca de Balneário Camboriú que, nos autos da execução n. 0012891-54.2007.8.24.0005, acolheu exceção de pré-executividade para reconhecer a impenhorabilidade (escorada na Lei n. 8.009/90) do imóvel de matrícula n. 2.169 do 2º Ofício do Registro de Imóveis da comarca de Balneário Camboriú e, em consequência, tornou sem efeito a penhora realizada à fl. 29 daqueles autos em relação a esse bem (fls. 626-630 dos autos de origem).

Em suas razões, alega a agravante que sobre o imóvel supramencionado não pode incidir a impenhorabilidade do bem de família reconhecida pelo Juízo a quo. De acordo com a tese recursal apresentada, admitir a aplicação desta hipótese de impenhorabilidade ao caso dos autos subverteria o princípio da boa-fé objetiva: legitimar-se-ia comportamento processual desleal da agravada, segundo o qual, tendo oferecido diversas vezes o imóvel sub judice à penhora nesta demanda executiva (vide fls. 43, 84 e 401, AO), que perdura mais de 12 anos, sem nunca relacioná-lo com o fito de residência familiar, e após dilapidar patrimônio adicional no intuito de frustrar expropriação (vide fraude à execução reconhecida no julgamento do Agravo de Instrumento n. 2013.029234-2), somente agora, furtivamente, vem invocar o indigitado obstáculo à execução.

Requereu, assim, a atribuição de efeito suspensivo ao recurso para obstar a baixa cartorial da penhora efetuada sobre o imóvel em voga, realizada em 26/11/2007. Em caráter definitivo, postulou a ratificação do provimento liminar, com o restabelecimento da penhora, reconhecendo-se sua higidez, e o prosseguimento da execução em seus ulteriores termos (fls. 1-18).

O pedido de efeito suspensivo foi deferido (fls. 25-35) para afastar a impenhorabilidade do bem de família, prevista no art. 1º da Lei n. 8.009/90, do imóvel matriculado sob o n. 2.169 no 2º Ofício do Registro de Imóveis da comarca de Balneário Camboriú, bem como determinar que o referido Cartório se abstenha de retirar a penhora efetuada na data de 26/11/2007 (Registro "R-5", datado de 20 de fevereiro de 2008) sobre o imóvel em voga, ou, já tendo sido baixada a penhora, que se restabeleça o registro dessa constrição.

Em sede de contrarrazões (fls. 44-60), sustentou a agravada que a oferta de seu imóvel residencial à penhora foi praticada por seus antigos procuradores, sem qualquer concordância da agravada, e que no instrumento de procuração que outorgou poderes àqueles advogados consta apenas autorização para apresentação de embargos à execução e não para atuar na execução e ofertar seu único imóvel residencial. Afirmou que não houve antes a alegação de impenhorabilidade em razão de atitude sorrateira praticada pelos antigos procuradores, que nomearam o imóvel residencial da agravada à penhora com o fito de desembaraçar o imóvel de matrícula nº 23823 recebido por eles como dação em pagamento para quitação de débitos de honorários advocatícios. Ainda, estabeleceu diferenciação entre o caso da Apelação Cível n. 0000206-67.2011.8.24.0007 e outros precedentes do Superior Tribunal de Justiça invocados pelo agravante em suas razões recursais e o presente caso.

Após, retornaram os autos conclusos.

É o relatório necessário.


VOTO

A fim de melhor compreender e solucionar o caso sob enfoque, necessário realizar histórico do trâmite processual da demanda de origem, assim como ocorreu na decisão monocrática de fls. 25-35. Vejamos.

A agravante Angela Maria Rocha ME, em setembro do ano de 2007, ajuizou execução em desfavor de Mini Mercado 5ª Avenida Ltda EPP, Rita de Cássia Carneiro e Vitalino Schimitt buscando cobrar a quantia de R$ 59.531,00 - referente à inadimplência de valores expressos em instrumento de confissão de dívida assinado em 21.05.2007 -, acrescida de multa no importe correspondente a 30% do valor originário dessa dívida, que era de R$ 70.000,00 (fls. 8-15, AO).

Após citação e falta de pagamento do débito (fl. 22, AO), em novembro de 2007, procedeu-se à penhora de dois imóveis em nome da agravada Rita de Cássia, matrículas n. 2.169 e 23.823, ambos registrados no 2º Ofício de Registro de Imóveis de Balneário Camboriú, avaliados, respectivamente, no importe de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) e R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) - (fls. 29-30).

Certificou o Oficial de Justiça que a executada, após receber o auto de penhora, não quis assinar, e não assinou, o laudo de avaliação, bem como que também foi coagido, via telefone, ao não cumprimento do ato constritivo (fl. 32, AO).

Nos autos, em manifestação à penhora, os executados apresentaram a versão de que, no supracitado ato constritivo, ofereceram bens móveis (balcões refrigerados e câmaras frias) em substituição aos imóveis, mas aqueles bens não teriam sido aceitos, equivocadamente, pelo Oficial de Justiça. Suscitando excesso de penhora e avaliação errônea, sustentaram também que ambos os imóveis teriam sido penhorados em valores inferiores aos de mercado, e, mesmo que se considerasse válida a avaliação feita, o imóvel de matrícula n. 2.169 seria suficiente para garantir o débito exequendo. Além disso, comunicaram que o outro imóvel, de matrícula n. 23.823, não poderia ser objeto de penhora, pois já havia sido adquirido por terceiros - no caso, justamente o escritório de advogados que defende a executada nesta causa, em pagamento de honorários advocatícios.

Nesses termos é que a executada requereu a substituição da penhora pelos bens móveis acima citados e, subsidiariamente, caso negada, a diminuição da penhora, excluindo-se a constrição sobre o imóvel n. 23.823, alheio ao seu patrimônio, e preservando-se a penhora somente quanto àquele de n. 2.169 (fls. 37-43; 48-60; 80-87; 88-94).

Em relação à alienação do imóvel de matrícula 23.823, remete-se à averbação "R-4" do registro cartorial, datada de 4 de janeiro de 2008, na qual se publiciza dação em pagamento em favor do escritório de advocacia Schiessl e Garcez Advogados, realizada por meio de escritura pública lavrada naquele Ofício em 4/12/2007 (fl. 502).

Em decisão acerca da 'manifestação à penhora' dos executados, o Juízo a quo indeferiu o pedido de substituição e postergou a análise sobre o pedido de redução para depois de nova avaliação dos imóveis (fls. 97-99, AO).

Nova avaliação foi procedida somente quanto ao imóvel n. 23.823, apurando-se o valor de R$ 120.000,00, o dobro do apurado na primeira avaliação. Em equívoco, não se reavaliou o de matrícula 2.169 (fl. 107, AO).

Embargos à execução foram manejados pelos executados (n. 005.07.019101-2), sendo proferida sentença, nesse interregno, para acolher o pedido dos embargantes no sentido de afastar a incidência da cláusula penal fixada no montante de 30% sobre a totalidade da dívida (R$ 70.000,00) e restringir a aplicação desse percentual aos valores inadimplidos (fls. 111-119, AO). A solução foi confirmada neste Tribunal (AC n. 2010.018311-6), seguindo a execução.

Após pedido da exequente de suspensão da avaliação pendente sobre o imóvel n. 2.169 por conta do concomitante pedido de adjudicação do imóvel n. 23.823, munido de cálculo atualizado da dívida à fl. 137 (fls. 135/136, AO), o Juízo a quo deferiu a adjudicação requerida, determinando ainda reserva de parte desse patrimônio para pagamento de crédito trabalhista indicado à fl. 140 (AO) - (fls. 141/142, AO).

Ato contínuo, em vista da manifestação das partes acerca da alienação do imóvel de matrícula n. 23.823...

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