Acórdão Nº 4028124-18.2019.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Público, 21-01-2020

Número do processo4028124-18.2019.8.24.0000
Data21 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemConcórdia
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Instrumento n. 4028124-18.2019.8.24.0000, de Concórdia

Relator: Desembargador Jaime Ramos

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO VISANDO A COMPELIR O ENTE ESTATAL A ADOTAR MEDIDAS NECESSÁRIAS PARA REGULARIZAR A SITUAÇÃO DE RISCO DE DESLIZAMENTO DE SOLO OCORRIDO NA FAIXA DE DOMÍNIO DA RODOVIA ESTADUAL SC-461 LOCALIZADA NO DISTRITO DE TAMANDUÁ. FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA NA HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO PELO SEQUESTRO DE VERBAS PÚBLICAS. MODALIDADE ASSECURATÓRIA MAIS EFICAZ. INTELIGÊNCIA DO ART. 536 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4028124-18.2019.8.24.0000, da comarca de Concórdia 2ª Vara Cível em que é Agravante Estado de Santa Catarina e Agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso. Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores Jaime Ramos (Presidente), Ronei Danielli e Ricardo Roesler.

Florianópolis, 21 de janeiro de 2020.



Desembargador Jaime Ramos

Relator





RELATÓRIO

O Estado de Santa Catarina interpôs agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, contra decisão que, nos autos da Ação Civil Pública n. 0900083-66.2015.8.24.0019, da Comarca de Concórdia, movida pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra o Departamento Estadual de Infraestrutura – DEINFRA (sucedido pelo ora agravante), deferiu o pedido de tutela antecipada para determinar que o agravante tome as medidas técnicas necessárias para eliminar os riscos de desmoronamento, arbitrando multa diária de R$ 2.000,00 até o limite de R$ 100.000,00 para o caso de descumprimento.

Posteriormente o Juízo de Primeiro Grau majorou a multa para R$ 4.000,00 diários até o limite de R$ 200.000,00, nos termos do art. 537, § 1º, do CPC.

Alega que a majoração da multa diária foi precipitada e não observou os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, uma vez que fixada em valor exorbitante.

Por fim, postula a reforma da decisão atacada, afastando a possibilidade de imposição de multa diária ou a redução do valor arbitrado, além da substituição do astreinte pelo sequestro dos valores necessários para o atendimento da decisão de primeiro grau, a qual determinou a adoção das medidas técnicas necessárias para eliminar os riscos de desmoronamento.

O agravado apresentou contraminuta.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Sandro José Neis, manifestou-se pelo provimento do recurso.

VOTO

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto pelo Estado de Santa Catarina contra decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública n. 0900083-66.2015.8.24.0019, movida pelo Ministério Público de Santa Catarina contra o Departamento Estadual de Infraestrutura – DEINFRA (sucedido pelo ora agravante), que majorou a multa anteriormente fixada em liminar, "para a ordem diária de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), até o limite de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), nos termos do artigo 537, § 1º, do Código de Processo Civil".

O agravante sustenta que a majoração da multa diária foi precipitada e não observou os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, uma vez que fixada em valor exorbitante, razão pela qual postula a reforma da decisão atacada, afastando a possibilidade de imposição de multa diária ou a redução do valor arbitrado, além da substituição do astreinte pelo sequestro dos valores necessários para o atendimento da decisão de primeiro grau, a qual determinou a adoção das medidas técnicas necessárias para eliminar os riscos de desmoronamento.

Como consabido, a via processual recursal do agravo de instrumento serve para o combate de decisões proferidas nos juízos originários, de forma que o exercício da instância recursal cinge-se a apreciar o acerto ou o desacerto da decisão recorrida, estando obstruído o exame de questões não tratadas pelo Juízo de origem, sob pena de caracterizar supressão de instância e ofensa ao duplo grau de jurisdição.

A propósito:

O agravo de instrumento constitui recurso que se presta tão só a apreciar o acerto ou desacerto da decisão vergastada, no momento em que foi proferida, razão pela qual é vedado ao juízo ad quem examinar elementos que não foram ainda apreciados pelo juízo de origem, sob pena de indevida supressão de instância e ofensa ao duplo grau de jurisdição. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0011014-79.2016.8.24.0000, de Blumenau, Rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 10-05-2018).


O agravo de instrumento segue direcionado à análise do acerto ou desacerto da decisão agravada, de modo que apenas os tópicos submetidos ao crivo do juízo de origem poderão ser conhecidos. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4005669-64.2016.8.24.0000, de Joinville, Rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 22-03-2018).

Pois bem.

A demanda originária versa sobre ação civil pública em razão de possíveis irregularidades ambientais referentes a desmoronamento de terras ocorrido no distrito de Tamanduá (SC 461) e o presente agravo foi interposto contra a decisão que fixou multa diária com a finalidade de compelir o agravante "a tomar medidas técnicas necessárias para eliminar os riscos de desmoronamentos na faixa de domínio na SC 461, Distrito de Tamanduá, próximo ao Centro Comunitário, neste Município, no prazo de 30 dias".

O reclamo, ao menos em uma análise perfunctória, merece prosperar em parte.

A astreinte fixada pelo juízo de origem sem qualquer dúvida é cabível e durante muito tempo mostrou-se suficiente a coagir o ente público ao cumprimento da obrigação.

Não se desconhece também a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n. 1.474.665/RS, sob a sistemática de recursos repetitivos, de ser cabível a imposição de multa cominatória ao ente público (Tema 98), até porque prevista nos arts. 536 e 537 e seus parágrafos, do Código de Processo Civil.

Contudo, observa-se que, de tempo para cá, tal fixação tornou-se inócua, na medida em que nem a multa está sendo suficiente para o cumprimento, sobretudo porque geralmente atinge um valor astronômico, face ao longo período de descumprimento, o que faz com que o Judiciário, não raras vezes, quando a parte vai executar a astreinte, reduza significativamente o valor.

Logo, tornou-se mais interessante realmente não cumprir e deixar o tempo passar.

Feitas tais considerações, e levando em conta que a matéria possui amparo no poder geral de efetivação das decisões judiciais, inserido pelo Código de Processual Civil como dever do julgador (art. 139, IV, CPC/2015), e no poder geral de cautela (art. 297, CPC/2015), já existente na codificação anterior (art. 798, CPC/1973), deve ser substituída a multa cominatória fixada pela medida de sequestro dos valores necessários ao cumprimento da ordem judicial, por ser a medida mais efetiva para a hipótese de descumprimento, mostrando-se suficiente que a parte autora informe nos autos o não-cumprimento e que sejam obtidos orçamentos para comparação e verificação do menor preço para realização do serviço.

A propósito, é a jurisprudência desta Corte:

"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO À MATRÍCULA EM CRECHE MUNICIPAL CHANCELADO PELA CARTA MAGNA. PRECEDENTES. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO A DEMONSTRAR A NECESSIDADE DA CRIANÇA E A POSSIBILIDADE DE ENTREGA DE VAGA EM CRECHE EM PERÍODO PARCIAL. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA RESERVA DE PLENÁRIO. DECISÃO NÃO FUNDAMENTADA EM INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI OU DE ATO NORMATIVO. EXEGESE DOS ARTS. 948 E SEGUINTES DO CPC/2015. COMINAÇÃO DE MULTA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DA MEDIDA. INVIABILIDADE. IMPOSIÇÃO DO SEQUESTRO DE VERBAS PÚBLICAS. REMESSA ACOLHIDA APENAS PARA AFASTAR A MULTA COMINATÓRIA" (TJSC, RN n. 0900151-57.2016.8.24.0091, Rel. Des. Jorge Luiz de Borba, Primeira Câmara de Direito Público, j. em 3/10/2017 - grifou-se).


O Estado ainda alega que não há justificativa para o aumento do "quantum" fixado a título de multa para compelir o agravante ao cumprimento da tutela antecipada. No entanto, a majoração se deu em razão da relutância em cumprir a obrigação, conforme consignado na decisão agravada:


"Segundo noticiado pela parte autora, até a presente data, não efetivada pelo réu a liminar proferida na longínqua data de 11-05-2015, situação corroborada pelo Laudo Geológico-Geotécnico elaborado pela Defesa Civil de Santa Catarina (folhas 320-336).

Considerando, pois, a reiterada renitência do réu, já instado a promover a correta prestação de serviços em diversas oportunidades, como alhures asseverado (folha 115, item "g"), mormente no que pertine ao descumprimento da medida judicial oriunda do presente feito, determino a majoração da multa inicialmente fixada (folhas 114-117) para a ordem diária de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), até o limite de R$ 200.000 (duzentos mil reais), nos...

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