Acórdão Nº 4030375-09.2019.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 24-11-2021
Número do processo | 4030375-09.2019.8.24.0000 |
Data | 24 Novembro 2021 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Grupo de Câmaras de Direito Público |
Classe processual | Ação Rescisória (Grupo Público) |
Tipo de documento | Acórdão |
Ação Rescisória (Grupo Público) Nº 4030375-09.2019.8.24.0000/SC
RELATORA: Desembargadora BETTINA MARIA MARESCH DE MOURA
AUTOR: RENATA DA SILVA MENEZES RÉU: MUNICÍPIO DE BOMBINHAS-SC
RELATÓRIO
Renata da Silva Menezes propôs Ação Rescisória contra o Município de Bombinhas, objetivando desconstituir parcialmente o acórdão proferido na Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 0003483-20.2010.8.24.0139, no tocante à possibilidade de acumulação de cargos de técnico em radiologia.
Aduziu, em síntese, que "a decisão violou manifestamente o disposto constitucional que permite o acúmulo de cargos por profissionais da saúde".
Defendeu que, "nos termos do artigo 37, XVI, "c", da Constituição Federal, é possível a acumulação de dois empregos de técnico em radiologia quando inexistente a incompatibilidade de horários, como efetivamente demonstrado no presente caso".
Sustentou, por fim, que "a limitação de 24 horas semanais prevista no artigo 14 da Lei nº 7.394/85, a qual regulamenta a profissão do técnico em radiologia, deve ser observada em relação a cada um dos contratos de trabalho mantidos pelo empregado", inexistindo qualquer proibição ao trabalho em jornada extraordinária.
O eminente Des. Rodolfo Tridapalli indeferiu a liminar. (evento 16)
Em contestação, o Ente Público asseverou que "por força do art. 14 da Lei Federal nº 7.394/85, a jornada de trabalho dos Técnicos em Radiologia não pode ultrapassar 24 (vinte e quatro) horas semanais, norma esta que visa justamente resguardar a integridade física do profissional submetido à radiação, que não pode ser acima do permissível, sob pena de acarretar danos à saúde". (evento 34)
A Douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela improcedência dos pedidos. (evento 48)
Esse é o relatório.
VOTO
Trata-se de Ação Rescisória movida por Renata da Silva Menezes em face do Município de Bombinhas objetivando, com fulcro no art. 966, V, do CPC, rescindir o acórdão da lavra do eminente Des. Jorge Luiz de Borba, julgado pela Primeira Câmara de Direito Público em 01.08.2017, assim ementado:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA TÉCNICO EM RADIOLOGIA. CUMULAÇÃO DE CARGOS. POSSIBILIDADE PREVISTA NO ART. 37, XVI, C, DA CF/1988. JORNADA DE TRABALHO, TODAVIA, QUE NÃO PODE SER SUPERIOR A 24 HORAS SEMANAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DA LEI N. 7.394/1985. SITUAÇÃO DA IMPETRANTE QUE ULTRAPASSA TAL LIMITE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO VIOLADO. DENEGAÇÃO DA ORDEM. SENTENÇA MANTIDA. APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
O dispositivo que fundamenta a presente demanda prevê que "a decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando [...] violar manifestamente norma jurídica".
A propósito, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam que a decisão é rescindível quando a violação apontada pela parte autora "seja visível, evidente - ou, como certa vez se manifestou o STJ a respeito, pressupõe-se que 'é a decisão de tal modo teratológica que consubstancia o desprezo do sistema de normas pelo julgado rescindendo" (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2016, p. 2055).
Dito isso, retira-se dos autos que a Autora fora aprovada na 4a colocação para o cargo de técnico em radiologia do Município de Bombinhas, concurso regido pelo edital n. 001/2009 (evento 1, inf12, fl. 11), cuja nomeação fora negada, com base nos seguintes argumentos:
Certificamos que Renata da Silva Menezes, classificado no Concurso Público n. 001/2009 no cargo de Técnico em Radiologia, não poderá assumir referido cargo por ser vedada a acumulação, sendo que a candidata declarou ocupar outro cargo, e uma vez que a jornada de trabalho ultrapassa a estabelecida pela Lei 7.394/85 que é de 24 (vinte e quatro) horas semanais. (evento 1, info12, fl. 9).
Com efeito, sustenta a Autora a viabilidade de acumulação de 2 (dois) cargos de técnico em radiologia com fulcro no art. 37, XVI, alínea "c", da Constituição Federal, segundo o qual "é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: [...] c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas".
Para tanto, defende que o art. 14 da Lei n. 7.394/85, que estipula que "a jornada de trabalho dos profissionais abrangidos por esta Lei será de 24 (vinte e quatro) horas semanais", encontra-se vetado.
De pronto, consigna-se que o veto refere-se, tão somente, ao período então previsto de 40 (quarenta) dias para férias, a saber:
Art. 14, na expressão, in fine: " com direito a 40 (quarenta) dias de férias anuais, divididas em 2 (dois) períodos". De fato, o período de 40 dias de férias constituiria privilégio, em face da sistemática vigorante para os assalariados em geral, além de seccionar o lapso de tempo normalmente considerado como indispensável à recuperação física e psíquica do trabalhador (30 dias).
Embora alguns especialistas do direito do trabalho reconheçam, como de bom alvitre, a fixação de maior período de repouso anual para os trabalhadores sujeitos a condições de insalubridade ou periculosidade, tal medida, a ser adotada, deveria abranger, de forma indiscriminada, todas as categorias que se encontrassem sob análogas condições laborativas. Adotá-la, contudo, apenas para Técnico de Radiologia não se nos afigura recomendável, do ponto de vista do interesse público. (Mensagem de veto n. 546/1985 da Presidência da República)
Da leitura dos dispositivos supramencionados conclui-se que, apesar de, em tese, possível a acumulação de cargos em face da carga horária, a legislação de regência veda-a, com base em fundamentos outros, tais quais o direito constitucional à saúde e a integridade física.
Sobre o tema, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TÉCNICO EM RADIOLOGIA. JORNADA DE TRABALHO. ART. 14 DA...
RELATORA: Desembargadora BETTINA MARIA MARESCH DE MOURA
AUTOR: RENATA DA SILVA MENEZES RÉU: MUNICÍPIO DE BOMBINHAS-SC
RELATÓRIO
Renata da Silva Menezes propôs Ação Rescisória contra o Município de Bombinhas, objetivando desconstituir parcialmente o acórdão proferido na Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 0003483-20.2010.8.24.0139, no tocante à possibilidade de acumulação de cargos de técnico em radiologia.
Aduziu, em síntese, que "a decisão violou manifestamente o disposto constitucional que permite o acúmulo de cargos por profissionais da saúde".
Defendeu que, "nos termos do artigo 37, XVI, "c", da Constituição Federal, é possível a acumulação de dois empregos de técnico em radiologia quando inexistente a incompatibilidade de horários, como efetivamente demonstrado no presente caso".
Sustentou, por fim, que "a limitação de 24 horas semanais prevista no artigo 14 da Lei nº 7.394/85, a qual regulamenta a profissão do técnico em radiologia, deve ser observada em relação a cada um dos contratos de trabalho mantidos pelo empregado", inexistindo qualquer proibição ao trabalho em jornada extraordinária.
O eminente Des. Rodolfo Tridapalli indeferiu a liminar. (evento 16)
Em contestação, o Ente Público asseverou que "por força do art. 14 da Lei Federal nº 7.394/85, a jornada de trabalho dos Técnicos em Radiologia não pode ultrapassar 24 (vinte e quatro) horas semanais, norma esta que visa justamente resguardar a integridade física do profissional submetido à radiação, que não pode ser acima do permissível, sob pena de acarretar danos à saúde". (evento 34)
A Douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela improcedência dos pedidos. (evento 48)
Esse é o relatório.
VOTO
Trata-se de Ação Rescisória movida por Renata da Silva Menezes em face do Município de Bombinhas objetivando, com fulcro no art. 966, V, do CPC, rescindir o acórdão da lavra do eminente Des. Jorge Luiz de Borba, julgado pela Primeira Câmara de Direito Público em 01.08.2017, assim ementado:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA TÉCNICO EM RADIOLOGIA. CUMULAÇÃO DE CARGOS. POSSIBILIDADE PREVISTA NO ART. 37, XVI, C, DA CF/1988. JORNADA DE TRABALHO, TODAVIA, QUE NÃO PODE SER SUPERIOR A 24 HORAS SEMANAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DA LEI N. 7.394/1985. SITUAÇÃO DA IMPETRANTE QUE ULTRAPASSA TAL LIMITE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO VIOLADO. DENEGAÇÃO DA ORDEM. SENTENÇA MANTIDA. APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
O dispositivo que fundamenta a presente demanda prevê que "a decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando [...] violar manifestamente norma jurídica".
A propósito, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam que a decisão é rescindível quando a violação apontada pela parte autora "seja visível, evidente - ou, como certa vez se manifestou o STJ a respeito, pressupõe-se que 'é a decisão de tal modo teratológica que consubstancia o desprezo do sistema de normas pelo julgado rescindendo" (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2016, p. 2055).
Dito isso, retira-se dos autos que a Autora fora aprovada na 4a colocação para o cargo de técnico em radiologia do Município de Bombinhas, concurso regido pelo edital n. 001/2009 (evento 1, inf12, fl. 11), cuja nomeação fora negada, com base nos seguintes argumentos:
Certificamos que Renata da Silva Menezes, classificado no Concurso Público n. 001/2009 no cargo de Técnico em Radiologia, não poderá assumir referido cargo por ser vedada a acumulação, sendo que a candidata declarou ocupar outro cargo, e uma vez que a jornada de trabalho ultrapassa a estabelecida pela Lei 7.394/85 que é de 24 (vinte e quatro) horas semanais. (evento 1, info12, fl. 9).
Com efeito, sustenta a Autora a viabilidade de acumulação de 2 (dois) cargos de técnico em radiologia com fulcro no art. 37, XVI, alínea "c", da Constituição Federal, segundo o qual "é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: [...] c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas".
Para tanto, defende que o art. 14 da Lei n. 7.394/85, que estipula que "a jornada de trabalho dos profissionais abrangidos por esta Lei será de 24 (vinte e quatro) horas semanais", encontra-se vetado.
De pronto, consigna-se que o veto refere-se, tão somente, ao período então previsto de 40 (quarenta) dias para férias, a saber:
Art. 14, na expressão, in fine: " com direito a 40 (quarenta) dias de férias anuais, divididas em 2 (dois) períodos". De fato, o período de 40 dias de férias constituiria privilégio, em face da sistemática vigorante para os assalariados em geral, além de seccionar o lapso de tempo normalmente considerado como indispensável à recuperação física e psíquica do trabalhador (30 dias).
Embora alguns especialistas do direito do trabalho reconheçam, como de bom alvitre, a fixação de maior período de repouso anual para os trabalhadores sujeitos a condições de insalubridade ou periculosidade, tal medida, a ser adotada, deveria abranger, de forma indiscriminada, todas as categorias que se encontrassem sob análogas condições laborativas. Adotá-la, contudo, apenas para Técnico de Radiologia não se nos afigura recomendável, do ponto de vista do interesse público. (Mensagem de veto n. 546/1985 da Presidência da República)
Da leitura dos dispositivos supramencionados conclui-se que, apesar de, em tese, possível a acumulação de cargos em face da carga horária, a legislação de regência veda-a, com base em fundamentos outros, tais quais o direito constitucional à saúde e a integridade física.
Sobre o tema, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TÉCNICO EM RADIOLOGIA. JORNADA DE TRABALHO. ART. 14 DA...
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