Acórdão Nº 4034413-64.2019.8.24.0000 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 23-04-2020

Número do processo4034413-64.2019.8.24.0000
Data23 Abril 2020
Tribunal de OrigemBlumenau
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Instrumento n. 4034413-64.2019.8.24.0000

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INVERTEU O ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DA AUTORA.

RECURSO DO BANCO RÉU

INSURGÊNCIA CONTRA A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PARTE DEMANDANTE ENQUADRADA COMO DESTINATÁRIA FINAL DO SERVIÇO PRESTADO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. TEORIA FINALISTA APROFUNDADA. RELAÇÃO DE CONSUMO EVIDENCIADA PELO ENQUADRAMENTO AOS CONCEITOS JURÍDICOS PREVISTOS NOS ARTIGOS E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO COMO DIREITO BÁSICO E INSTRUMENTO FACILITADOR DO ACESSO À JUSTIÇA. DECISÃO MANTIDA NO PONTO.

"Reza o art. 6º, VIII, do CDC que é direito básico do consumidor a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências. Note-se que a partícula 'ou' bem esclarece que, a favor do consumidor, pode o juiz inverter o ônus da prova quando apenas um das duas hipóteses está presente no caso. Não há qualquer outra exigência no CDC" (MARQUES, Cláudia Lima et al. Código de Defesa do Consumidor Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012).

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4034413-64.2019.8.24.0000, da comarca de Blumenau Vara de Direito Bancário em que é Agravante Itaú Unibanco S/A e Agravada Kleis Color Comércio de Tintas Ltda.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Carlos Adilson Silva e Mariano do Nascimento.

Florianópolis, 23 de abril de 2020.



Desembargador Luiz Zanelato

Relator



RELATÓRIO

Itaú Unibanco S/A interpôs agravo de instrumento de decisão de fl. 212, proferida nos autos da ação ordinária n. 0018860-70.2009.8.24.0008, movida por Kleis Color Comércio de Tintas Ltda, em curso no Juízo da Vara de Direito Bancário da comarca de Blumenau, nos seguintes termos:

Na presente demanda, a parte autora alega ter celebrado contrato de empréstimo e/ou conta corrente com a parte ré.

Dessa forma, atentando ao disposto no art. 6, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, inverto o ônus da prova e determino seja a parte ré intimada para que no prazo de 30 dias traga aos autos os contratos especificados à fl. 169 dos autos digitais, sob as penas do art. 400 do CPC.

Apresentado o contrato, intime-se a parte autora para que, no prazo de 15 (quinze) dias, manifeste-se acerca os documentos apresentados especificando os contratos e as cláusulas que pretende revisar.

Intime-se. Cumpra-se.

Nas razões recursais, sustenta, em síntese, que: (a) é evidente a grave lesão e o manifesto tumulto processual que serão ocasionados na relação processual; (b) as regras que dispõem sobre o ônus da prova orientam a conduta das partes durante todo o processo, não se tratando de meras regras de julgamento; (c) não estão presentes os requisitos para a inversão do ônus da prova prevista do Código de Defesa do Consumidor; (d) não podem ser aplicadas as regras do CDC em benefício à empresa agravada, pois o contrato visava à implementação das atividades negociais da recorrida.

Requereu a concessão da de efeito suspensivo, e, ao final, o provimento do agravo de instrumento (fls. 1-9).

O recurso aportou no Tribunal de Justiça e foi distribuído por sorteio a esta relatoria (fls. 224-226).

Na decisão interlocutória de fls. 227-231, o pedido liminar recursal foi indeferido.

Contrarrazões apresentadas às fls. 234-243.

Após, os autos retornaram conclusos (fl. 244).

É o relatório.

VOTO

1. Juízo de admissibilidade

Porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso, e passo ao exame das teses recursais.

2. Fundamentação

Insurge-se o banco agravante contra a decisão que inverteu o ônus da prova e determinou ao banco réu que, no prazo de trinta dias, juntasse aos autos os contratos especificados à fl. 169 do processo da origem, sob as penas do art. 400 do CPC.

Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor define os sujeitos e o objeto de uma relação de consumo nos artigos 2º, caput, e 3º, § 2º, incluindo-se as atividades prestadas pelas instituições financeiras para pessoas naturais ou jurídicos. Senão, vejamos:

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

[...]


Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (grifou-se)

A relação de consumo decorre também da interpretação que segue a teoria finalista aprofundada do conceito de destinatário final, consolidada após a vigência do Código Civil de 2002, a qual analisa a vulnerabilidade econômica ou técnica como aspecto de identificação do consumidor.

Ademais, pelo enunciado da Súmula 297, o Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento de que incide o Código de Defesa do Consumidor na revisão de contratos bancários.

Por conseguinte, no caso em apreço, em que foi pactuado contrato de abertura de crédito e seu respectivo aditamento, o que revela nítido o caráter consumerista na relação jurídica estabelecida entre casa bancária agravante e a agravada, sendo flagrante a hipossuficiência técnica e informacional desta em relação àquela.

Dessa forma, segundo a interpretação que segue a teoria finalista aprofundada, consolidada após a vigência do Código Civil de 2002, para a definição de destinatário final, analisa-se a vulnerabilidade econômica, jurídica ou técnica como aspecto de identificação do consumidor, admitindo, assim, excepcionalmente, que pessoas físicas ou jurídicas que utilizem produto ou serviço indiretamente para a consecução de sua finalidade produtiva sejam também protegidas por este código consumerista.

Logo, é evidente a vulnerabilidade da recorrida em relação à instituição financeira...

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