Acórdão Nº 5000002-16.2019.8.24.0052 do Quinta Câmara de Direito Público, 15-02-2022

Número do processo5000002-16.2019.8.24.0052
Data15 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000002-16.2019.8.24.0052/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

APELANTE: SERGIO MARINO (AUTOR) APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

O pedido de proteção acidentária formulado por Sérgio Marino em relação ao Instituto Nacional do Seguro Social foi julgado procedente, dispensando-se o reexame necessário.

A autarquia apela.

Sustenta a falta de interesse de agir pois decorreram mais de cinco anos entre a cessação do auxílio-doença e o ajuizamento da ação, sem que a parte formulasse novo requerimento administrativo. Além disso, diz que o STJ vem reconhecendo a impossibilidade de restabelecer a mercê indeferida ou cessada há mais de um lustro, que estará sujeita à prescrição do art. 1° do Decreto n. 20.910/32. Caso mantida a sentença, porém, a data da citação deve ser definida como marco inicial do benefício, nos termos da súmula 576 do STJ.

Defende, ainda, a nulidade da perícia ante a falta de resposta aos quesitos formulados na peça defensiva, o que viola o art. 473, IV, do CPC. Diz que o perito "se limitou a preencher um formulário que nada elucida sobre a ausência ou não de redução da capacidade laboral para a atividade exercida ao tempo do acidente".

Requer, por fim, o prequestionamento dos dispositivos.

Houve contrarrazões.

VOTO

1. A autarquia defende a falta de interesse de agir na medida em que, ausente pedido de prorrogação do benefício cessado em 31 de maio de 1995, faltou a prévia postulação administrativa.

A tese, em princípio, está correta, decidiu o STF em repercussão geral:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.

1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.

2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.

3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.

4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.

6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.

7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.

8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.

9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir. (RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014)

(RE 631.240-MG, rel. Min. Roberto Barroso)

Aqui, porém, é caso em que se deve ter a instância extrajudicial como já suficientemente provocada.

O autor comprovou que antes do ajuizamento desta ação acidentária foi beneficiado com auxílio-doença. Ele foi cassado e não veio outra prestação em sucessão (evento 1, DOC9).

O INSS, ao tomar ciência do quadro de saúde do segurado, passou a ter condições de decidir se a prorrogação do benefício ou a sua conversão em outro mais vantajoso era a decisão mais adequada. Optou por não manter, como se viu, a mercê. A partir daí, uma vez que manifesta sua posição denegatória, mostra-se dispensável novo pedido administrativo.

Ali existe um silêncio eloquente: a mera cassação do auxílio-doença representa automaticamente que aos olhos da autarquia o autor estava saudável.

Aliás, na ementa antes transcrita, o Min. Barroso ressalvou que há o interesse de agir sem o prévio requerimento administrativo quando a rejeição do INSS seja "notória" ou "Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão".

Só que na sessão do dia 14 de outubro de 2020, o Grupo de Câmaras de Direito Público de Público revisitou a questão para adotar uma delimitação temporal quanto à configuração do interesse de agir, fixando esta diretriz:

1ª Diretriz: Decorridos cinco anos da cessação do pagamento do auxílio-doença, o pedido judicial de sua conversão em auxílio-acidente depende de prévio requerimento administrativo.

Desde então, vigora entendimento de que o requerimento administrativo (no caso de pleito de auxílio-acidente subsequente a auxílio-doença) é exigível quando haja mais de cinco anos desde a cassação da prestação temporária (por analogia com lapso prescricional). Evitam-se, assim, demandas temporalmente muito distantes dos fatos, o que exige a possibilidade de um novo posicionamento administrativo, haja vista a perspectiva saliente de alteração da situação de saúde.

O mesmo órgão fracionário, aliás, sedimentou a tese neste IAC:

1) INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. ADMISSIBILIDADE. PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA EM AUXÍLIO-ACIDENTE. RELEVANTE QUESTÃO DE DIREITO, COM GRANDE REPERCUSSÃO SOCIAL, SEM HAVER, CONTUDO, REPETIÇÃO DE MÚLTIPLOS PROCESSOS. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE POSITIVO PELO GRUPO DE CÂMARAS NESTA SESSÃO.

2) QUESTÃO JURÍDICA. EXTRAPOLAÇÃO DOS 5 ANOS DA CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA EM QUE NÃO HOUVE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E SUA CONSEQUÊNCIA PARA A RESOLUÇÃO DOS PROCESSOS EM CURSO.

3) TESE FIRMADA: NA HIPÓTESE DE EXTRAPOLAÇÃO DOS 5 ANOS DA CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA EM QUE NÃO HOUVE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO, DEVE-SE OBSERVAR O SEGUINTE: NO PRIMEIRO GRAU:

A) ATÉ 3-9-2014, AS AÇÕES EM CURSO COM CONTESTAÇÃO DE MÉRITO CONTINUAM A TRAMITAR, FICANDO PREJUDICADO O EXAME DO INTERESSE DE AGIR.

B) A PARTIR DE ENTÃO, CONTESTADO OU NÃO O MÉRITO, A AUSÊNCIA DO PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO CONDUZ À EXTINÇÃO DO PROCESSO POR FALTA DE INTERESSE.

B.1) AÇÃO JUDICIAL PROPOSTA. VERIFICAÇÃO DA FALTA DO PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO, ANTES MESMO DA CITAÇÃO DO INSS. SOLUÇÃO: EXTINGUIR O PROCESSO POR FALTA DE INTERESSE.

B.2) AÇÃO JUDICIAL PROPOSTA. AUSÊNCIA DO FILTRO PROCESSUAL, PELO JUIZ, ACERCA DA EXISTÊNCIA OU NÃO DO PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INSS CITADO. CONTESTAÇÃO ALEGANDO FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL E DEFESA DE MÉRITO. SOLUÇÃO: EXTINÇÃO DO PROCESSO POR FALTA DE INTERESSE.

B.3) AÇÃO JUDICIAL PROPOSTA. AUSÊNCIA DO FILTRO PROCESSUAL, PELO JUIZ, ACERCA DA EXISTÊNCIA OU NÃO DO PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INSS CITADO. CONTESTAÇÃO ALEGANDO FALTA DE INTERESSE E TAMBÉM DEFESA DE MÉRITO. PRELIMINAR NÃO ANALISADA NO CURSO DO PROCESSO. INSTRUÇÃO REALIZADA. SENTENÇA EM QUE SE DEVE ANALISAR O MÉRITO.

NO SEGUNDO GRAU:

C) NAS HIPÓTESES "B.1." E "B.2", HAVENDO APELAÇÃO DO AUTOR, O CASO É DE DESPROVIMENTO.

D) AÇÃO JUDICIAL PROPOSTA. AUSÊNCIA DO FILTRO PROCESSUAL, PELO JUIZ, ACERCA DA EXISTÊNCIA OU NÃO DO PRÉVIO REQUERIMENTO...

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