Acórdão Nº 5000026-17.2022.8.24.0124 do Primeira Câmara Criminal, 15-12-2022

Número do processo5000026-17.2022.8.24.0124
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5000026-17.2022.8.24.0124/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: LUIZ ROBERTO DE QUADROS (ACUSADO)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso Termo Circunstanciado, ofereceu denúncia contra Luis Roberto de Quadros, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do art. 140, § 3º, e art. 147, caput, ambos do Código Penal, pelos fatos assim narrados na peça exordial acusatória, in verbis (Evento 1 dos autos da ação penal):

Ato I - ameaça (art. 147 do CP)

No dia 10 de setembro 2021, por volta das 8h, na Linha São Roque, S/N, interior, na cidade de Itá-SC, o denunciado LUIS ROBERTO DE QUADROS, de modo voluntário, ciente da ilicitude e da reprovabilidade de sua conduta, ameaçou, por meio de palavras, de causar mal injusto e grave a Márcio Garcia da Rocha Campos, dizendo-lhe que "para eu fazer uma merda, não tem problema, eu já fiz muitas, uma a mais ou a menos não faz diferença".

Segundo consta, LUIS ROBERTO DE QUADROS estaria insatisfeito com o andamento da obra da residência de seu filho, que estaria sendo realizada pelo ofendido Márcio e sua equipe, o que teria sido o motivo da conduta do denunciado contra a vítima.

Ato II - injúria racial (art. 140, §3º, do CP)

Também no dia 10 de setembro 2021, por volta das 8h, na Linha São Roque, S/N, interior, na cidade de Itá-SC, o denunciado LUIS ROBERTO DE QUADROS, com manifesto animus injuriandi, consciente e voluntariamente, injuriou a vítima Márcio Garcia da Rocha Campos de modo a lhe ofender a dignidade e o decoro, consistente na utilização de elementos referente a raça, dizendo que "tinha que ser preto, se tivessem pegado outra pessoa, já teria resolvido, mas esses negão não adianta".

Encerrada a instrução processual, o MM. Juiz a quo julgou improcedente a denúncia para absolver o acusado dos delitos que lhe são imputados, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (Evento 94 dos autos da ação penal).

Inconformada, a representante do Ministério Público interpôs recurso de apelação e, em suas razões, pugnou pela condenação do acusado nos termos da denúncia, ao argumento de que comprovada a prática dos crimes, bem como pleiteou a fixação de indenização em favor dos herdeiros da vítima. Além disso, requereu o prequestionamento do art. 147, caput, e do art. 140, § 3.º, ambos do Código Penal (Evento 99 dos autos da ação penal).

Apresentadas as contrarrazões, a defesa do acusado manifestou-se pela manutenção da sentença absolutória, requerendo o conhecimento e o desprovimento do recurso ministerial, além do prequestionamento de dispositivos legais e constitucionais (Evento 106 dos autos da ação penal).

Após, os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Exma. Dra. Rosemary Machado Silva, opinado pelo conhecimento e provimento do recurso interposto pelo Ministério Público (Evento 8).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por PAULO ROBERTO SARTORATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2831143v22 e do código CRC 266f1a59.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): PAULO ROBERTO SARTORATOData e Hora: 25/10/2022, às 11:22:9





Apelação Criminal Nº 5000026-17.2022.8.24.0124/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: LUIZ ROBERTO DE QUADROS (ACUSADO)

VOTO

O presente recurso de apelação volta-se contra a sentença de primeiro grau que, ao julgar improcedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público, absolveu o acusado Luiz Roberto de Quadros da acusação referente à prática dos crimes de ameaça e de injúria racial (art. 140, § 3º, e 147, ambos do Código Penal).

O recurso merece ser conhecido, porquanto presentes seus requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Entretanto, após a análise minuciosa do conjunto probatório acostado aos autos, conclui-se que o pedido condenatório formulado pelo Parquet não merece prosperar. Apesar de existirem suspeitas da prática dos delitos narrados na inicial, a sua ocorrência não restou devidamente demonstrada durante a instrução probatória, não havendo elementos de prova suficientes à decretação de um édito condenatório em desfavor do acusado.

Pretendeu comprovar o Ministério Público, por meio da presente actio, que, no dia 10 de setembro de 2021, por volta das 8h, o acusado proferiu promessa de mal injusto e grave à vítima Márcio Garcia da Rocha Campos, dizendo-lhe que "para eu fazer uma merda, não tem problema, eu já fiz muitas, uma a mais ou a menos não faz diferença" e, ainda, ofendeu-lhe a dignidade e o decoro, utilizando-se de elementos referente a raça, ao dizer que "tinha que ser preto, se tivessem pegado outra pessoa, já teria resolvido, mas esses negão não adianta".

Em que pese o raciocínio empregado pelo órgão de acusação, entende-se que os elementos constantes dos autos não permitem concluir, com a segurança necessária, que o acusado perpetrou os delitos narrados na inicial.

Da atenta leitura do presente processo, bem como da análise dos documentos que instruem os autos, verifica-se que o Magistrado a quo, ao proferir sentença, bem equacionou o mérito da quaestio. Com efeito, em nome da economia e celeridade processuais, convém invocar referida decisão, fazendo-se remissão ao seu teor, a fim de incorporar seus fundamentos de ordem fático-jurídica à presente decisão, evitando-se, de tal forma, a indesejada tautologia.

Frisa-se que tal procedimento possui legitimidade jurídico-constitucional há muito reconhecido pelas Cortes Superiores, quando a transcrição ocorre em complementação às próprias razões de decidir.

Ponderou o Magistrado sentenciante que, "O crime de injúria, previsto no art. 140 do Código Penal, tem como bem jurídico tutelado a honra subjetiva da vítima (aquela que envolve a dignidade e o decoro pessoal; a visão que a própria vítima tem de si). A vítima deve ter o poder de compreender a ofensa contra si proferida. Consuma-se o delito no momento em que o conceito negativo irrogado contra alguém, que lhe ofende a dignidade ou o decoro, chega ao seu conhecimento. Seu elemento subjetivo é o dolo, sendo imprescindível a presença do elemento subjetivo especial do tipo consistente na vontade livre e consciente de injuriar a vítima (animus injuriandi).

A qualificadora que consta da denúncia, prevista no § 3º do art. 140 do Código Penal, é denominada pela doutrina de injúria racial, e consiste na ofensa à dignidade ou ao decoro da vítima envolvendo a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

Por sua vez, o crime de ameaça é tipificado no art. 147 do Código Penal e para que haja a configuração do delito deve ficar constatado de forma indubitável o ato de fazer uma promessa a outra pessoa de lhe causar um mal (seja físico, moral ou econômico). O mal deve ser injusto (contrário ao Direito), grave (possuir relevância, averiguada pelas circunstâncias do caso concreto) e possível de ser realizado. A vítima deve ser determinada e ter a possibilidade de ser intimidada (possuir compreensão do mal que lhe é prometido).

Conforme a narrativa da denúncia, ambos os crimes foram praticados por palavras proferidas de forma verbal, não deixando marcas no mundo dos...

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