Acórdão Nº 5000027-89.2021.8.24.0074 do Quarta Câmara de Direito Civil, 22-09-2022

Número do processo5000027-89.2021.8.24.0074
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000027-89.2021.8.24.0074/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

APELANTE: ANA PAULA APARECIDA CONSTANTE DA LUZ (AUTOR) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença (evento 38) dos autos de primeiro grau), por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

ANA PAULA APARECIDA CONSTANTE DA LUZ promoveu ação declaratória de inexistência de débito e de compensação por danos morais em relação a BANCO DO BRASIL S.A.

Alega a parte autora ter sido inscrita nos cadastros de inadimplentes em razão de uma dívida, originada por compra em cartão de crédito, que jamais contratou. Conta que esse fato, resultado de culpa da parte ré, repercutiu em sua honra objetiva e gerou dano moral.

Pede, em razão disso, a declaração de inexistência de relação jurídica e a condenação da parte ré a compensar os danos morais sofridos.

O requerimento de tutela provisória de urgência antecipada foi indeferido.

A parte ré contestou os pedidos, quando sustentou a existência da obrigação referida na inicial e argumentou não ter havido dano moral. Requereu, sob estes fundamentos, a improcedência dos pedidos.

Houve réplica.

As partes não manifestaram interesse na produção de outras provas.

O Magistrado de primeiro grau julgou procedentes os pedidos exordiais, nos seguintes termos:

Assim, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo procedentes os pedidos formulados na inicial para declarar a inexistência da dívida que motivou a inscrição aludida na inicial e para condenar a parte ré ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de compensação dos danos morais.

O valor da condenação deverá ser corrigido desde a data da publicação desta decisão pelo INPC e acrescido de juros de 1% ao mês desde 10.9.2020 (data do evento danoso).

Condeno a parte ré, ainda, ao pagamento das despesas, assim como de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, observada eventual gratuidade.

Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a instituição financeira apelada alega a ausência de ato ilícito.

Argumenta que não há culpa da instituição financeira pelo ocorrido, a qual deve ser atribuída ao terceiro fraudador, razão pela qual não houve abalo anímico no caso em comento a ser imputado à ré.

Aponta a inaplicabilidade da Súmula 479 do STJ.

Requer, pois, a improcedência dos pedidos exordiais e a inversão dos encargos sucumbenciais.

Subsidiariamente, pugna pela redução do valor ressarcitório fixado (evento 46).

A autora interpôs recurso no qual almeja, em resumo, a majoração do quantum indenizatório (evento 48).

Contrarrazões da autora no evento 54 e do réu no evento 55.

Foi determinada a redistribuição do feito para uma das Câmaras de Direito Civil deste Tribunal de Justiça em decisão de lavra do Des. Guilherme Nunes Born (evento 10 dos autos de segundo grau).

VOTO

Trata-se de apelações cíveis interpostas contra sentença que, em ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais, julgou procedentes os pedidos exordiais.

Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual devem ser conhecidos.

1 APELO DA RÉ

A instituição financeira apelante assinala o não cometimento de ato ilícito.

Defende que a própria sentença admite que houve fraude, motivo pelo qual a instituição financeira também foi vítima, visto que o ocorrido só aconteceu por culpa exclusiva de terceiro.

Aduz que o § 3º do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor exclui a responsabilidade do fornecedor quando provar a culpa exclusiva de terceiro.

Aponta a inaplicabilidade da Súmula 479 do STJ à hipótese.

Pretende a improcedência dos pedidos exordiais.

Pois bem.

Sobre a questão, importa trazer excerto da fundamentação do Magistrada sentenciante, o qual se adota como razão de decidir (evento 38):

Julgo antecipadamente o mérito porque não há provas a serem produzidas em audiência (CPC, art. 355, I). As questões de fatos aqui postas resolvem-se por documentos, cuja fase de produção foi ultrapassada.

No direito das obrigações, é do devedor o ônus de comprovar o adimplemento de obrigação positiva. Do credor, o de comprovar a existência da obrigação, assim como o inadimplemento de obrigação negativa.

Por isso, uma vez alegada a inexistência de uma obrigação como causa de pedir, ainda que se trate de alegação formulada pelo adversário, são ônus processuais do réu-credor impugná-la, mediante declinação específica da causa da dívida, e provar sua defesa por qualquer meio admitido, observadas as restrições quanto à prova testemunhal.

O autor-devedor, por outro lado, tem o ônus alegar o adimplemento de obrigação positiva e, controvertida a alegação, comprová-la por qualquer meio admitido - normalmente pela exibição da quitação (CC, art. 320) -, observadas as restrições quanto à prova testemunhal.

No caso, a autora havia realizado a abertura de conta bancária e aderido ao cartão de crédito em 2.2.2017 e 4.4.2017 (e. 1-10 e 1-11). Contudo, em 4.12.2017, a autora solicitou o encerramento da conta corrente, sendo que naquele momento foi lhe informado a inexistência de débito e saldo bancário. Passado alguns dias, em 3.1.2018, houve o encerramento de relação contratual (e. 1-12).

Ocorre que, mesmo a autora tendo encerrado a sua conta bancária, em 13.8.2020 e 14.8.2020, houve diversas compras, no valor de R$ 4,49 cada, na "Google Garena" com utilização de um cartão de crédito vinculado ao seu nome (e. 26-2). Referidas transações, que não foram autorizadas pelas autora, geraram débitos e, consequentemente, ensejaram na inscrição no cadastro de inadimplentes (e. 1-10).

Nesse ponto, interesse notar que a maneira como as dívidas foram contraídas indica, por si só, a existência de fraude: a conta corrente havia sido encerrada e, alguns anos depois, um cartão de crédito vinculado ao nome da autora é criado e utilizado, em apenas dois dias, para realizar seguidas compras, de baixo valor e por aplicativo. Não obstante isso, o próprio réu, em contestação, reconheceu que "Após reclamação da cliente, houve estornos das transações e baixa do nome em cadastros restritivos, em 04/02/2021" (e. 26-1).

A partir disso, então, deve ser aplicada a Súmula n. 479 do STJ ("as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos...

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