Acórdão Nº 5000066-79.2019.8.24.0002 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 15-12-2022

Número do processo5000066-79.2019.8.24.0002
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000066-79.2019.8.24.0002/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000066-79.2019.8.24.0002/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: JANICE THEREZINHA NAUE (AUTOR) ADVOGADO: VITOR LEONARDO SCHMITT BERNARDONI (OAB SC049331) APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU) ADVOGADO: EDUARDO CHALFIN (OAB SC042233) APELADO: MASSA FALIDA DO BANCO CRUZEIRO DO SUL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interpostos pelo demandado, Banco Pan S.A., e de recurso adesivo interposto pela demandante, Janice Therezinha Naue, contra sentença de lavra do Juízo de Direito da Unidade Regional de Direito Bancário da Comarca de Florianópolis (Dr. Luiz Eduardo Ribeiro Freyesleben), proferida nos autos da ação declaratória de nulidade de contrato, repetição de indébito e indenização por danos morais (cartão de crédito com reserva de margem consignável), a qual julgou procedentes os pedidos formulados na inicial nos seguintes termos:

Ante o exposto, julga-se procedente o pedido para confirmar os efeitos da tutela provisória de urgência e declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes no que tange ao contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), determinando-se o retorno das partes ao status quo anterior, de acordo com os seguintes termos: a) a parte autora deve restituir a quantia sacada, com incidência de correção monetária, pelo INPC, a partir da transferência, ao passo que ao réu cumpre a devolução simples dos valores descontados indevidamente do beneficio previdenciário do mutuário, corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data de cada desconto, admitida a compensação (art. 368, do CC/2002) com eventuais débitos; b) condena-se o réu ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais, acrescido de juros de mora de 1% ao mês do evento danoso (data do primeiro desconto efetuado pelo banco), nos termos da Súmula 54 do STJ, e correção monetária pelo INPC a contar da sentença (Súmula 362, STJ).

Condena-se o réu, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atualizado da condenação, na forma do art. 85, § 2º, do CPC, observados os critérios do grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da lide.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.

O banco-apelante defende, preliminarmente, a ocorrência de prescrição do direito da autora, pois passados mais de três anos entre a data da assinatura do contrato e o ajuizamento da ação.

No mais expõe que a parte autora tinha plena ciência de que o contrato firmado entre as partes se tratava da modalidade de cartão de crédito consignado com descontos em seu benefício previdenciário, referente à reserva de margem consignável (RMC), em razão do que defende a validade e legalidade do contrato discutido. Outrossim, defende o descabimento da repetição de indébito, bem como a inexistência de abalo moral indenizável ou, se assim não for entendido, a redução do quantum.

Pautou-se pelo provimento do recurso.

Contrarrazões.

Já a autora, em seu recurso adesivo, busca a majoração do quantum fixado a título de danos morais, bem como a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente. Pede, ademais, pela majoração dos honorários de sucumbência.

Pautou-se, igualmente, pelo provimento do recurso.

Apresentadas as contrarrazões.

Este é o relatório

VOTO

I. Tempestividade e preparo recursal

De início, anota-se que ambos recursos são tempestivos a parte autora deixou de efetuar o pagamento do respectivo preparo recursal porque beneficiada com a gratuidade da justiça.

II. Breve síntese da demanda

Trata-se de ação declaratória de nulidade de contrato e indenização por danos morais (cartão de crédito com reserva de margem consignável) ajuizada por Janice Therezinha Naue em face de Banco Pan S.A.

Colhe-se da inicial que a parte autora, servidora pública estadual, pactuou contrato de empréstimo pessoal consignado, cujo pagamento seria descontado, mês a mês, diretamente da sua remuneração.

Ocorre que, após a contratação, foi surpreendida com um desconto diferenciado, referente ao pagamento de cartão de crédito, o qual ensejou um abatimento mensal no percentual de 5% sobre o valor recebido.

Assim, tendo em vista que tal modalidade contratual (empréstimo consignado via cartão de crédito) jamais foi solicitada ou contratada pela autora, ajuizou a presente demanda pela qual pleiteou a declaração de nulidade da contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC); a restituição dos descontos realizados mensalmente a título de RMC e a condenação do banco demandado ao pagamento de indenização por danos morais.

O feito se desenvolveu regularmente e sobreveio sentença de parcial procedência dos pedidos iniciais, contra a qual ambas as partes recorreram.

III. Apelo do demandado

(a) prescrição

Preliminarmente, o banco demandado/apelante aponta a ocorrência de prescrição do direito da autora, pois passados mais de três anos entre a data da assinatura do contrato e o ajuizamento da ação.

Sem razão, porém.

Sobre o tema, colhe-se a fundamentação lançada em acórdão de lavra do Eminente Desembargador Túlio Pinheiro, proferido em julgamento de caso análogo pela Terceira Câmara de Direito Comercial desta Corte, do qual participou este Julgador:

Arrima-se o intento no transcurso do prazo prescricional trienal entre a data da pactuação e o aforamento da actio, e na disposição inserta no art. 206, § 3º, incs. IV e V, do Código Civil, in verbis: "Art. 206. Prescreve: (...) § 3º. Em três anos: (...) IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa; a pretensão de reparação civil; (...)".

Nada obstante, '"a pretensão da demandante tem natureza dúplice, qual seja, declaratória, que visa a nulidade do contrato em razão de abusividades e condenatória, que almeja o ressarcimento pelos descontos indevidos, bem como a indenização por danos morais. Contudo, sob qualquer ótica, seja quanto a pretensão declaratória ou, ainda, a condenatória, não há falar em prescrição" (Apelação Cível n. 0302134-35.2019.8.24.0092, rel. Des. Rejane Andersen, j. em 24/9/2019), porquanto em se tratando de relação de trato sucessivo, no qual, a cada desconto indevido, surge uma nova lesão, o prazo prescricional começa a fluir a partir da data do última dedução realizada no benefício previdenciário da autora." (Apelação Cível n. 0301812-15.2019.8.24.0092, rel. Des. Robson Luz Varella, j. em 15.10.2019).

Tal entendimento encontra esteio no Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes. 3. O entendimento adotado pelo acórdão recorrido coincide com a jurisprudência assente desta Corte Superior, circunstância que atrai a incidência da Súmula 83/STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.412.088/MS, rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. em 27.8.2019).

Nesta mesma linha:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com o entendimento desta Corte, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de

contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. No tocante ao termo inicial do prazo prescricional, o Tribunal de origem entendeu sendo a data do último desconto realizado no benefício previdenciário da agravante, o que está em harmonia com o posicionamento do STJ sobre o tema: nas hipóteses de ação de repetição de indébito, "o termo inicial para o cômputo do prazo prescricional corresponde à data em que ocorreu a lesão, ou seja, a data do pagamento" (AgInt no AREsp n. 1056534/MS, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2017, DJe 3/5/2017). Incidência, no ponto, da Súmula 83/STJ. 3. Ademais, para alterar a conclusão do acórdão hostilizado acerca da ocorrência da prescrição seria imprescindível o reexame do acervo fático-probatório, vedado nesta instância, nos termos da Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp n. 1.372.834/MS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 26.3.2019).

[...]

(Apelação Cível n. 0303852-80.2019.8.24.0023, da Capital. Rel. Des. Túlio Pinheiro, j. em 23.01.2020).

No presente caso, os documentos juntados aos autos...

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