Acórdão Nº 5000071-21.2021.8.24.0006 do Primeira Câmara Criminal, 15-04-2021

Número do processo5000071-21.2021.8.24.0006
Data15 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5000071-21.2021.8.24.0006/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: ADONIAS VICENTE (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Pronunciamento judicial agravado: o juiz de direito Gustavo Schlupp Winter, da 2ª Vara da comarca de Barra Velha, concedeu ao apenado Adonias Vicente o benefício de prisão domiciliar, nos seguintes termos:

Trata-se de execução penal (art. 1º da Lei 7.210/84), com pedido de cumprimento do regime semiaberto com monitoramento (Ev. 148), remição ficta e saída temporária (Ev. 155).

O Ministério Público manifestou-se nos Eventos 152 e 159.

Vieram os autos conclusos. Decido.

I - Quanto à remição ficta, o entendimento pela impossibilidade da sua concessão foi ratificado, em recente decisão do TJSC, o que dispensa outros comentários.

A propósito:

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR). RISCO DE OFENSA À ISONOMIA E À SEGURANÇA JURÍDICA. REPETIÇÃO DE PROCESSOS NESTA CORTE DEBATENDO A POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DO ALCANCE DA NORMA PREVISTA NO ART. 126, §4º, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL, AOS APENADOS BENEFICIADOS COM A REMIÇÃO POR TRABALHO, ESTUDO OU LEITURA, E TIVERAM AS BENESSES INTERROMPIDAS PELAS MEDIDAS ADMINISTRATIVAS ADOTADAS PARA IMPEDIR A PROPAGAÇÃO DA PANDEMIA OCASIONADA PELO NOVO CORONAVÍRUS. TESE JURÍDICA FIRMADA: "NÃO É POSSÍVEL, EM NENHUMA HIPÓTESE, A CONCESSÃO DE REMIÇÃO FICTA, COM EXTENSÃO DO ALCANCE DA NORMA PREVISTA NO ART. 126, §4º, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL, AOS APENADOS IMPOSSIBILITADOS DE TRABALHAR OU ESTUDAR EM RAZÃO DA PANDEMIA OCASIONADA PELO NOVO CORONAVÍRUS". (TJSC, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção Criminal) n. 5023868-78.2020.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, Seção Criminal, j. 04-12-2020).

Sendo assim, impõe-se o INDEFERIMENTO do pedido de reconhecimento da remição ficta.

II - A defesa do apenado também postulou a aplicação da Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, que modificou a art. 112 da LEP e passou a exigir um percentual de cumprimento da pena em substituição às frações anteriores.

Contudo a nova lei, exigiu-se que a reincidência seja específica para aplicar a porcentagem de 60%, conforme era aplicada a fração de 3/5 da pena para o condenado reincidente.

Não sendo o caso de reincidência específica, deve-se reconhecer a lacuna deixada pelo legislador na inovação, o que implica na interpretação da norma em favor do reeducando.

Sendo assim, com razão o postulante, deve-se aplicar a norma mais benéfica ao analisar os critérios para concessão de benefícios, razão pela qual deve ser aplicada a fração de 2/5 da legislação anterior, atuais 40%, o que tem previsão para as condenações em que seja reconhecida a primariedade do agente na prática crime hediondo ou equiparado.

Nesse sentido:

RECURSO DE AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. APENADO QUE SE INSURGE DE DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE PROGRESSÃO DE REGIME, SOB ARGUMENTO DAS MUDANÇAS TRAZIDAS PELO PACOTE ANTICRIME (LEI 13.946/2019). ALMEJADO A APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DE 2/5, EIS QUE REINCIDENTE GENÉRICO. A INSURGÊNCIA PROSPERA. APLICABILIDADE DA NOVA REGRA INTRODUZIDA PELA LEI N. 13.964/2019, CONHECIDA COMO PACOTE ANTICRIME. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. IN CASU, REINCIDÊNCIA GENÉRICA. DECISÃO QUE MERECE REFORMA. APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DE 2/5 (DOIS QUINTOS) QUE SE IMPÕE. NOVO POSICIONAMENTO ADOTADO COM FUNDAMENTO NA APLICAÇÃO MAIS BENÉFICA AO RÉU. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. A reincidência é circunstância de caráter pessoal, passível de reconhecimento pelo juízo da execução penal mesmo quando não considerada na sentença condenatória, e estende-se a todas as condenações impostas e somadas, ainda que ao tempo de alguma delas o apenado fosse primário. A reincidência exigida pelo art. 112 da Lei de Execução Penal, com a redação dada pela Lei 13.964/19, para o agravamento das frações de progressão de regime, é a específica em crimes da mesma natureza e, inexistente previsão quanto ao reincidente genérico, deve ser adequado à situação positivada ao condenado primário. Não é permitido ao magistrado, diante de conflito de leis no tempo, mesclar as partes benéficas de cada norma, criando uma terceira, não prevista pelo legislador; a avaliação da lex mitior acontece casuisticamente, a fim de que, a depender do resultado da aplicação na íntegra de uma ou outra, se decida pela ultraatividade da lei revogada ou a retroatividade da lei nova. Se, ao calcular as frações que seriam necessárias para a progressão de regime de acordo com o ordenamento antes e depois da vigência da Lei 13.964/19, verifica-se que a incidência integral desta é mais favorável ao apenado que a normativa anterior, aplica-se-a retroativamente. [...].RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 0000128-62.2020.8.24.0038, de Joinville, rel. Sérgio Rizelo, 2 Gabinete Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho Segunda Câmara Criminal, j. 18-08-2020).

No caso sob exame, o reeducando foi condenado a pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão em regime semiaberto.

Considerando que foi condenado por crime de roubo nos autos da ação n. 0007528-94.2010.8.24.0033, infere-se a reincidência genérica.

Nesse passo, para a progressão de regime, considerando o percentual de 40% ou 2/5, deve resgatar 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses da reprimenda no semiaberto.

Iniciado o cumprimento em 22/11/2018, e consideradas as remições de 32 dias homologadas no evento 62, o reeducando preenche o requisito objetivo para progressão em 19/02/2021.

Assim, passo a analisar o a possibilidade do cumprimento da pena em regime domiciliar.

Cabe salientar que a situação decorrente da pandemia ainda é preocupante, contudo, diante das medidas adotadas, a rotina das atividades da unidade prisional está, cautelosamente, retomando à normalidade, sem, entretanto, descuidar das providências ainda necessárias ao enfrentamento da Covid19, inclusive pelo próprio Judiciário.

Dessa forma, analisando a situação do reeducando e atento às medidas adotadas, com intuito de não colocar em risco a população carcerária, considero razoável o deferimento do pedido, a fim de possibilitar o cumprimento da pena remanescente em regime domiciliar e o trabalho do preso fora dos muros da unidade prisional, levando-se em conta, também, que as saídas para o trabalho externo, na UPA, estão suspensas até nova manifestação da Secretária de Administração Prisional - SAP.

Ainda que o apenado não faça parte do grupo de risco (Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça) e sendo inviável a antecipação da progressão ao regime aberto, previsto para ocorrer somente a partir de fevereiro de 2021, tenho que situação favorece o deferimento do cumprimento da pena remanescente em prisão domiciliar, pois além do quantum da pena cumprida, o reeducando possui bom comportamento carcerário e sua progressão está próxima.

Sendo assim, ainda que não seja usual no Estado de Santa Catarina, neste momento, entendo que a providência mais adequada ao presente caso é a colocação do reeducando em prisão domiciliar, com o objetivo de resguardar a saúde pública, em atendimento às orientações das autoridades sanitárias com relação ás medidas adotadas contra a pandemia.

Vale apontar a recomendação do CNJ nesse sentido (art. 5º, III, da Recomendação 62/2020), além da súmula vinculante 56, do STF e da própria Lei de Execução Penal (art. 146-B, IV).

A propósito:

"A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS".

Ponderada a situação, viável AUTORIZAR o apenado ADONIAS VICENTE, excepcionalmente, a cumprir sua pena em PRISÃO DOMICILIAR, mediante monitoração eletrônica, a contar desta data, até que a situação seja normalizada ou eventual progressão de regime, sem, contudo, vedar a reanálise dos fatos e a revogação do benefício, no caso de conduta inadequada ou descumprimento das condições fixadas, nos seguintes termos:

(a) Fornecer endereço atualizado da residência, cientificando previamente o juízo qualquer alteração;

(b) Comprovar a realização de trabalho, no prazo de 90 dias;

(c) Respeitar a área de inclusão;

(d) Recolher-se em tempo integral na sua residência, ressalvado o horário em que esteja trabalhando ou mediante autorização prévia.

(e) Informar previamente o juízo da alteração de endereço mencionado nas alíneas "a" e "b", supra;

Fica o apenado cientificado, ainda, acerca dos seguintes deveres:

(a) O irrestrito cumprimento das orientações e determinações oriundas das autoridades públicas quanto à prevenção, tratamento e controle da pandemia da COVID19 (coronavírus).

(b) Assinar o termo de monitoramento;

(c) Fornecer pelo menos 1 número de telefone ativo;

(d) Responder a contato e cumprir orientação do servidor responsável pelo monitoramento;

(e) Abster-se de remover, violar, modificar ou danificar o dispositivo de monitoramento, nem permitir que outrem o faça;

(f) Recarregar diariamente, de forma correta, o equipamento, informando de imediato qualquer falha;

(g) Manter atualizados o endereço residencial;

(h) No caso de violação de área de inclusão em virtude de caso fortuito ou força maior (doença, inundação, incêndio etc.), entrar em contato, imediatamente, com o Departamento de Administração Prisional; e

(i) Evitar contato com as empresas responsáveis pelo monitoramento.

Por fim, cabe destacar: (a) A data de início do monitoramento será a da colocação da tornozeleira; e (b) A área de inclusão domiciliar é o endereço informado nos autos e o local do trabalho desempenhado. [...]. (evento 160 dos autos originários).

Recurso de Agravo de Execução Penal: o Ministério Público do Estado de Santa Catarina interpôs recurso e argumentou que:

a) "o teor das resoluções e orientações formuladas com o fim de evitar a proliferação do novo coronavírus deve ser analisado e observado em consonância...

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