Acórdão Nº 5000094-81.2019.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Público, 12-07-2022

Número do processo5000094-81.2019.8.24.0023
Data12 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000094-81.2019.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: CIA CENTER ARMAZÉM DA MODA LTDA (AUTOR) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

RELATÓRIO

Na Comarca da Capital, Cia Center Armazém da Moda Ltda. ajuizou "ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c repetição de indébito" em face do Estado de Santa Catarina, objetivando a desconstituição de débito tributário referente a ICMS consubstanciado na notificação fiscal n. 1760300070607.

Sustenta, em síntese, que atua no ramo de comércio varejista de calçados há 59 (cinquenta e nove) anos; que a notificação fiscal lavrada discorre sobre fatos geradores realizados nos meses de janeiro de 2012 a fevereiro de 2013, por suposta apropriação de créditos de ICMS "decorrentes de devoluções de mercadorias promovidas por pessoas físicas, não obrigadas à emissão de documento fiscal"; que do ato fiscalizatório restou apurado que o procedimento de emissão de notas fiscais de devolução de mercadorias era realizado um única vez englobando vários cupons fiscais, sem identificar a pessoa responsável pela devolução da mercadoria; que "o desafio da autora foi adequar as exigências fiscais à dinâmica do mercado, razão pela qual, do período fiscalizado pela Fazenda Pública (01/2012 a 12/2016), apenas apresentou o problema em um pequeno lapso de tempo entre 01/2012 a 02/2013"; que o cumprimento das referidas exigências implicaria no "dever de, toda vez que ocorrer a devolução de mercadorias, abrir um cadastro do cliente que está devolvendo, colhendo informações e assinatura na nota fiscal de entrada"; que "nas vendas à vista, onde não era indicado o cliente no cupom fiscal de entrada do produto, [...] não tinha os dados para consignar na Nota Fiscal de Entrada", e por isso, "emitia nota globalizada diariamente das devoluções"; que diante da obtenção de resultado negativo na via administrativa, optou por efetivar o pagamento do débito, a fim de evitar a constituição do crédito tributário e posterior inscrição em dívida ativa; que o valor pago indevidamente deve ser restituído; que "se alguma penalidade devesse ser aplicada à autora, esta deveria, então, ser a multa por não cumprimento de obrigação acessória"; que a tomada de crédito teria sido indevida pela autora "se esta tivesse simulado operações de devoluções com o objetivo de gerar crédito e, assim, reduzir o ICMS a pagar por conta da apuração débitos e créditos".

Citado, o Estado contestou o feito pugnando, inicialmente, pela extinção do processo sem análise do mérito, porquanto "a adesão ao parcelamento do débito serve como confissão de dívida". No mais, rebateu os argumentos expostos na exordial enfatizando a legalidade do procedimento fiscalizatório efetivado. Asseverou que é fato incontroverso e confesso o desrespeito e descumprimento da norma regulatória estadual do ICMS (RICMS/SC - 01).

Impugnados os argumentos da contestação, após manifestação do Ministério Público, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva restou assim fundamentada:

"[...]

"6. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, dando solução de mérito à causa nos termos do art. 490 do CPC

"Custas e despesas processuais pela parte autora, a quem condeno ainda ao pagamento de honorários ao réu no montante de R$ 500,00.

"Intimem-se." (Evento n. 22, autos principais).

Inconformada, a empresa autora apelou repisando os argumentos insertos na inicial ao asseverar que a sentença guerreada "ignorou o fato de que no ramo varejista de calçados, roupas e acessórios é comum a prática de devolução de mercadorias, peculiaridade na qual se emite nota fiscal de entrada da mercadoria devolvida para troca e nova emissão de cupom fiscal de venda de um novo produto, sem se descurar das operações conhecidas como consignadas"; que a irregularidade constatada se deu por "um pequeno lapso de tempo entre 01/2012 a 02/2013, tendo em vista que após grande esforço a apelante conseguiu solucionar essa questão, tanto em termos de procedimento "de balcão/atendimento ao cliente", quanto de sistema de emissão de notas e coleta de informações"; que "o fato de a apelante não ter cumprido com a orientação relativa a procedimentos prevista nos incisos III e IV do mencionado art. 74 do Anexo 6 do RICMS-SC, não lhe retira o direito ao crédito do imposto uma vez provado de forma irrefutável a ocorrência das correspondentes devoluções de mercadorias objeto do lançamento". Por fim, requereu "o provimento do presente apelo para o fim de reformar a sentença 'a quo', a fim de declarar a inexistência de relação jurídica da autora perante o réu em relação ao ICMS incidente sobre a venda de mercadoria devolvidas pelo consumidor final para troca do período objeto da Notificação Fiscal nº 176030070607, e, em consequência, condená-la a restituir à autora o valor recolhido indevidamente a tal título, constante da DARE inclusa, devidamente acrescidos de correção monetária plena e juros na forma da fundamentação, com a inversão do ônus de sucumbência, condenando a apelada à honorários advocatícios de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação e custas processuais."

Com as contrarrazões, em que o apelado arguiu preliminar de não conhecimento da apelação por falta de dialeticidade, os autos subiram a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Cia Center Armazém da Moda Ltda., contra a sentença que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição de Indébito n. 5000094-81.2019.8.24.0023, ajuizada contra o Estado de Santa Catarina, julgou improcedentes os pedidos exordiais e condenou a recorrente ao pagamento de custas e honorários advocatícios.

Primeiramente, destaca-se que não se sustenta a tese perfilada em contrarrazões acerca da violação ao "princípio da dialeticidade" por ter a empresa autora repetido argumentos de sua inicial nas razões de apelação.

Além do fato de a autora ter refutado adequadamente os termos da sentença, em suas razões de apelação, o que por si só já afastaria a alegação da parte apelada, nada obsta à demandante repetir os termos de sua inicial, a título de fundamentação do recurso, até porque com base nela pleiteou a reforma da sentença apelada.

Aliás, a repetição das alegações da inicial não é motivo hábil para que não se conheça do recurso por falta de dialeticidade quando é possível verificar que a parte recorrente pretende a reforma da decisão recorrida e expõe razões nesse sentido.

A respeito da possibilidade de repetição dos fundamentos da inicial ou da contestação, a título de razões recursais, o Superior Tribunal de Justiça também decidiu que:

"RECURSO ESPECIAL. TRANSCRIÇÃO DAS RAZÕES DA PEÇA INICIAL OU DA RESPOSTA, QUANDO DO MANEJO DA APELAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. RESPEITADO, DIANTE DA DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DE INCONFORMIDADE COM A SENTENÇA.

"1. O simples fato de a parte transcrever as razões de sua peça inicial (seja petição inicial, seja contestação) não implica desrespeito ao princípio da dialeticidade.

"2. Necessidade apenas de apuração se as razões ali constantes confrontam a tese adotada na sentença recorrida, demonstrando o real interesse na reforma do julgado (...)" (STJ, Recurso Especial n. 1.267.353/PR, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 18.12.2012 - grifou-se).

Portanto, afasta-se a preliminar suscitada e se conhece da apelação interposta pela autora, que satisfaz os requisitos do art. 1.010 do Código de Processo Civil.

Quanto ao mérito, a questão a ser dirimida refere-se à possibilidade de a empresa apelante aproveitar créditos de ICMS, os quais seriam oriundos de...

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