Acórdão Nº 5000245-73.2019.8.24.0079 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 15-10-2020

Número do processo5000245-73.2019.8.24.0079
Data15 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000245-73.2019.8.24.0079/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: ELENIR THIBES DE CAMPOS BRUGNAGO (AUTOR) ADVOGADO: IVANIR ALVES DIAS PARIZOTTO (OAB SC023705) APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU) ADVOGADO: RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA (OAB SC047610A) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


ELENIR THIBES DE CAMPOS BRUGNAGO e BANCO PAN S.A. interpuseram recursos de apelação cível (eventos 27 e 32) em face da sentença (evento 23), que, proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Videira, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora na ação de obrigação de fazer com pedido de restituição de valores e de indenização por dano moral para converter a operação de saque em cartão de crédito em operação de empréstimo pessoal consignado e condenar a instituição financeira demandada, ainda, ao pagamento de danos morais à parte contrária.
Cuida-se, na origem, de ação de obrigação de fazer com pedido de restituição de valores e de indenização por dano moral aforada em 30-07-2019 aforada por ELENIR THIBES DE CAMPOS BRUGNAGO contra BANCO PAN S.A., na qual pede o reconhecimento da inexistência de contratação de empréstimo consignado na modalidade de cartão de crédito, bem como a condenação da instituição financeira ao ressarcimento dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, e a condenação ao pagamento de danos morais, em razão da inexistência de contratação de reserva de margem consignada em seu benefício previdenciário, para contratação de cartão de crédito não solicitado.
No evento 3, foi concedida a gratuidade da justiça requerida pela demandante e deferida a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar a suspensão dos descontos referentes ao contrato em questão.
Devidamente citado, o BANCO PAN S.A. apresentou contestação (evento 12), na qual defendeu, em suma, que houve a expressa contratação pela autora, do contrato para utilização de cartão de crédito mediante consignação em pagamento, razão pela qual não são indevidos os descontos a título de reserva de margem consignável lançados em seu benefício previdenciário. Logo, por não serem indevidos os descontos, argumenta que não deve restituir valores à autora, e tampouco indenizar-lhe pelo ocorrido. Pugnou pela improcedência da demanda.
Manifestação à contestação no evento 17, na qual a autora, rebatendo os argumentos da parte adversa, reitera os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.
Sobreveio sentença de mérito prolatada em 20-11-2019 pelo magistrado Rafael Goulart Sarda, da 1ª Vara Cível da Comarca de Videira, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora, o que se deu nos seguintes termos (evento 23):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para:
I- Declarar a ineficácia da relação jurídica unicamente quanto ao contrato de cartão de crédito com "Reserva de Margem Consignável" (RMC), com o cancelamento do cartão de crédito, preservando-se a relação contratual na modalidade de empréstimo consignado, com o recálculo do saldo devedor pelo agente financeiro, observados os seguintes parâmetros: (a) os juros remuneratórios deverão ser limitados conforme a tabela da taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil no mês da contratação; (b) os valores adimplidos até a presente data deverão ser abatidos do saldo devedor do contrato; (c) o valor da parcela deverá limitar-se ao montante descontado mensalmente do benefício previdenciário da parte autora;
II - Condenar a parte ré à repetição de indébito na forma simples, somente se, observados os parâmetros estabelecidos no item II, for constatada a existência de saldo em favor da parte autora; o valor deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do desconto de cada parcela e com a incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data da citação;
III - Condenar a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, do valor de R$ 3.000,00 a título de danos morais, incidindo juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso (data da inclusão da reserva de margem para cartão de crédito) e correção monetária pelo INPC a partir da presente data (enunciados das Súmulas n. 54 e 362 do Superior Tribunal de Justiça), autorizada a aplicação do valor no abatimento do saldo devedor do empréstimo consignado contratado, acaso existente, observados os parâmetros estabelecidos no item II.
Confirmo a tutela de urgência anteriormente concedida.
Considerando que a parte autora decaiu em parte mínima de seus pedidos, condeno a parte ré ao pagamento da integralidade das despesas processuais pendentes, além daquelas adiantadas no curso do processo pelo vencedor.
Fixo os honorários sucumbenciais devidos pela parte ré ao advogado da parte autora, no percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, em atenção aos critérios previstos no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se.
Inconformadas, ambas as partes interpuseram recursos de apelação (eventos 27 e 32).
A autora (evento 28) pugna pela majoração do quanto da indenização por dano moral e dos honorários advocatícios de sucumbência, pela condenação da ré à restituir em dobro os valores indevidamente descontados e pelo afastamento da compensação do saldo devedor do empréstimo consignado.
A instituição financeira demandada (evento 32), por sua vez, alega, em síntese, que: (1) a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito a única operação viável para a concessão do valor perseguido; (2) inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável, de sorte que deve ser afastada a indenização fixada pelo juízo singular. Pugna pelo provimento do recurso com a reforma da decisão objurgada, sendo julgada totalmente improcedente a demanda de origem, com a inversão a responsabilidade pelo pagamento dos ônus sucumbenciais.
Contrarrazões apresentadas pela autora no evento 41.
Os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça, vindo-me às mãos por sorteio.
Foi determinada a expedição de ofício para a(o) Sr(a). Superintendente Regional do INSS, requisitando o envio de cópias de extratos de pagamento e de consignações referentes ao benefício da autora (evento 8), os quais aportaram aos autos no evento 11.
Vieram-me os autos conclusos.
Este é o relatório

VOTO


1. Juízo de admissibilidade
Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise dos presentes recursos, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).
Dito isto, tem-se que os recursos devem ser conhecidos porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.
2. Da regularidade da operação contratada entre as partes
Sustenta a instituição financeira recorrente, inicialmente em seu recurso, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de maneira clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito a única operação viável para a concessão do valor perseguido.
Analisados os autos, verifica-se que razão possui mesmo o banco recorrente.
A princípio, necessário destacar que a própria autora, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).
As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):
Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação...

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