Acórdão Nº 5000250-26.2021.8.24.0144 do Quarta Câmara Criminal, 31-03-2022

Número do processo5000250-26.2021.8.24.0144
Data31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5000250-26.2021.8.24.0144/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ EVERALDO SILVA

APELANTE: MARIA ROSA PRIMAK (ACUSADO) APELANTE: RODRIGO SANTOS LIMA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Rio do Oeste/SC, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Maria Rosa Primak e Rodrigo Santos Lima, dando-os como incursos nas sanções dos art. 32, § 1º-A, da Lei n. 9.605/98 c/c art. 29 do Código Penal, conforme descreve a proemial acusatória:

Concluída a instrução criminal, a Autoridade Judiciária julgou procedente em parte a denúncia e condenou J. A. N. e F. dos S. às penas de 1 ano de detenção, em regime aberto, além do pagamento de multa de 1 salário mínimo, por infração ao art. 244 do CP LIMA e MARIA ROSA PRIMAK e, ainda, Liliane de Souza, de forma consciente e voluntária, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, praticaram atos de abuso e maus-tratos contra animal doméstico, cão, ao passo que o deixaram sem água e/ou comida, bem como o acorrentaram de forma sufocante, causando as lesões indicadas nas fotografias constantes no evento 1, do Inquérito Policial relacionado.Destaca-se que o cão era deixado ao relento pelos denunciados, sem que o fornecessem água e comida, bem como estava preso por uma corda a um cabo de aço de forma sufocante, causando lesões no corpo do animal.Assim agindo, os denunciados MARIA ROSA PRIMAK e RODRIGO SANTOS LIMA infringiram o disposto no artigo 32, § 1º-A, da Lei n. 9.605/98 c/c art. 29 do Código Penal [...] (evento 1).

Concluída a instrução criminal, a autoridade judiciária julgou procedentes os pedidos formulados na denúncia e condenou: a) Maria Rosa Primak à pena de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída a reprimenda corporal por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, esta no valor de 1 (um) salário-mínimo (valor à época dos fatos, e 10 (dez) dias-multa, no mínimo valor legal, pelo delito do art. 32, § 1º-A, da Lei n. 9.605/1998; e b) Rodrigo Santos Lima à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 12 (doze) dias-multa, no mínimo valor legal, pelo delito do art. 32, § 1º-A, da Lei n. 9.605/1998. Ademais, fixou o valor mínimo indenizatório a título de danos morais em R$ 1.100,00 (mil e cem reais) para cada um dos réus, consoante art. 387, IV, do CPP (evento 60).

Irresignados com a prestação jurisdicional entregue, Maria Rosa Primak e Rodrigo Santos Lima interpuseram recurso de apelação. Em síntese, postularam a absolvição por insuficiência probatória. Sucessivamente, na hipótese de manutenção do édito condenatório, que seja a pena do apelante Rodrigo diminuída ao mínimo legal, e o regime inicial de cumprimento de pena seja o aberto. Alfim, postularam redução da pena de multa imposta aos acusados e a fixação de honorários recursais (evento 60).

Houve contrarrazões (evento 18).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Jayne Abdala Bandeira, que opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 22).

Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor.

Documento eletrônico assinado por JOSÉ EVERALDO SILVA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1924147v6 e do código CRC 74fa65cb.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): JOSÉ EVERALDO SILVAData e Hora: 11/3/2022, às 18:24:24





Apelação Criminal Nº 5000250-26.2021.8.24.0144/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ EVERALDO SILVA

APELANTE: MARIA ROSA PRIMAK (ACUSADO) APELANTE: RODRIGO SANTOS LIMA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria Rosa Primak e Rodrigo Santos Lima contra a decisão da autoridade judiciária que julgou procedentes os pedidos formulados na denúncia e os condenou, respectivamente, à pena de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída a reprimenda corporal por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, esta no valor de 1 (um) salário-mínimo (valor à época dos fatos, e 10 (dez) dias-multa, no mínimo valor legal, pelo delito do art. 32, § 1º-A, da Lei n. 9.605/1998; e à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 12 (doze) dias-multa, no mínimo valor legal, pelo delito do art. 32, § 1º-A, da Lei n. 9.605/1998. Ademais, fixou o valor mínimo indenizatório a título de danos morais em R$ 1.100,00 (mil e cem reais) para cada um dos réus, consoante art. 387, IV, do CPP.

As razões de inconformismo estão assentadas, em síntese, na insuficiência probatória. Sucessivamente, na hipótese de manutenção do édito condenatório, que seja a pena do apelante Rodrigo diminuída ao mínimo legal, e o regime inicial de cumprimento de pena seja o aberto. Alfim, postularam redução da pena de multa imposta aos acusados e a fixação de honorários recursais.

Todavia, o conjunto de provas demonstram que as alegações não devem prosperar.

Com efeito, a Constituição Federal de 1988, no seu art. 225, § 1º, VII e § 3º, dispõe que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público [...] proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade". E, "as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas".

Após, a Lei n. 9.605, de 13.02.1998, que disciplina os Crimes Ambientais, passou a considerar crime, punido com detenção de três meses a um ano, e multa, "praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos" (art. 32).

Fora isso, a citada lei destina um capítulo inteiro à fauna, facilitando a tipificação dos crimes cometidos contra os animais e sua proteção jurídica.

Além da legislação ordinária, a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, celebrada em 1978, na Bélgica, e subscrita pelo Brasil, elenca, entre os direitos dos animais, o de "não ser humilhado para simples diversão ou ganhos comerciais", bem como "não ser submetido a sofrimentos físicos ou comportamentos antinaturais". Também, o art. 14 da Carta da Terra, criada na RIO+5, em 1997, preceitua que devemos tratar todas as criaturas decentemente e protegê-las da crueldade, sofrimento e matança desnecessária.

E, sobre o tipo específico do art. 32, da Lei n. 9.605/98, a doutrina ensina:

A conduta objeto do presente artigo é a de praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Praticar ato de abuso significa exagerar nas atividades impostas ao animal, exigindo mais do que o nível suportável pelo espécime. Exemplo de abuso é a utilização de animal de tração, impondo-lhe peso excessivo para arranque e carregamento.

Maus tratos podem ser definidos a partir da regra do art. 136, do CP, que os define em relação à pessoa humana, 'expor a perigo a vida ou a saúde da pessoa sob autoridade, guarda ou vigilância. Para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho, excessivo ou inadequada, quer abusando de meio de correção ou disciplina".

Tendo em mente essa concepção, cumpre perceber que maus tratos em animais podem ser definidos como exposição a perigo de vida ou à saúde, através da sujeição ao trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando dos meios de correção, quer privando-o de alimentação ou cuidados.

Maus tratos, dessa forma, diferenciam-se do abuso, porque aqueles se caracterizam pelo exagero nos meios utilizados, e este caracteriza-se pela privação da assistência, da alimentação, e pela imposição de perigo à vida e à saúde.

Quaisquer destas atitudes são consideradas criminosas a partir do fato de virem a ser praticadas contra animais da fauna silvestre, doméstica ou domesticável, seja exótica ou nativa. (...) O objeto material da conduta é o animal, e a norma protege o ambiente como um todo, que é bem de uso comum do povo. Trata-se de crime comissivo de ação múltipla. Consuma-se delito no momento em que ocorre o ato. A doutrina não tem admitido tentativa em delito de maus-tratos contra pessoa (CP, art. 136) e não há razão para admiti-la quando é praticado contra animais. A consumação ocorre no exato momento em que se realiza" (NICOLAO DINO DE CASTRO E COSTA NETO, NEY DE BARROS BELLO FILHO, FLÁVIO DINO DE CATRO E COSTA,Crimes e Infrações Administrativa Ambientais - Comentários à Lei n. 9.605/98, 2ª ed., Brasília: Brasília Jurídica, 2001, p. 208/209).

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