Acórdão Nº 5000279-50.2022.8.24.0012 do Quarta Câmara Criminal, 17-03-2022

Número do processo5000279-50.2022.8.24.0012
Data17 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5000279-50.2022.8.24.0012/SC

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO

RECORRENTE: SEBASTIAO LEODENIR GASPAR (RECORRENTE) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo acusado Sebastiao Leodenir Gaspar, inconformado com a decisão (Eventos 220 e 224) proferida pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de Caçador, que, nos autos da ação penal n. 5009411-05.2020.8.24.0012, julgou admissível a pretensão acusatória materializada pela denúncia e, assim, o pronunciou pela prática dos crimes previstos no art. 121, §2º e §4º, incs. I, III e IV, do Código Penal, e no art. 244-B, §2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (por duas vezes), na forma do art. 69 do Código Penal.

Em suma, o recorrente, por meio da Defensoria Pública, argumentou o seguinte nas razões do presente recurso: [a] "os elementos de convicção que apoiam essa conclusão mostram-se frágeis, incapazes para submeter o recorrente à última fase do procedimento do bifásico do Júri"; [b] "a única ação atribuída a Sebastião Leodenir Gaspar é a mensagem constante no Evento 5, F. 15-17, do Inquérito Policial em apenso"; [c] "tal mensagem exalta o "sucesso" da empreitada criminosa perpetrada pelo adolescente, a qual, por óbvio, foi emitida posteriormente aos fatos em apreço. Conquanto reprovável o conteúdo do texto, ele não se reveste de conteúdo mandamental, porquanto o delito já havia se consumado na data do envio"; [d] "não há provas que atestem que o recorrente Sebastião Leodenir Gaspar seja conhecido como 'turco', pois a investigação sequer certificou a foto - se existente - do contato salvo com essa alcunha"; [e] "embora a Autoridade Policial, ouvida em Juízo, tenha correlacionado o recorrente aos apelidos de "Turco" ou "Tio Coroa" (Evento 188), não há no bojo da investigação preliminar os elementos de informação por ele referido. Assim, seu testemunho se configura como um conjunto de suposições, justificáveis à luz da Teoria da Dissonância Cognitiva, mas destituídas de valor probante"; [f] "a instrução processual demonstrou que essa declaração é fantasiosa, pois os demais envolvidos no evento delitivo não fizeram qualquer menção ao recorrente ou ao seu suposto apelido. O adolescente tido como executor do homicídio asseverou que o ato fora praticado de forma independente, sem qualquer auxílio de terceiro, cuja motivação ressai de uma discussão entre ele e vítima, os quais dividiam a moradia"; [g] "consoante asseverado nas alegações finais e nesta peça recursal, a decisão de pronúncia é manifestamente descabida, na medida em que está fundada em mera suspeita, carente de qualquer elemento concreto para corroborála. Em vista disso, o provimento recursal é medida imperativa"; [h] "os riscos de uma condenação obtida mais pela excelência da performance pessoal do responsável pela acusação que pelo exame sereno e cuidadoso dos fatos não valem a preservação, a qualquer custo, da competência do Tribunal do Júri".

Concluiu requerendo o provimento do recurso, objetivando a reforma da decisão impugnada e, assim, despronunciar o recorrente (Evento 1 - petição inicial 1).

Com as contrarrazões (Evento 2), e mantida a decisão impugnada por seus fundamentos em atenção ao preconizado no art. 589 do Código de Processo Penal (Evento 4), os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Genivaldo da Silva, que se manifestou pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 8 - promoção 1).

VOTO

O recurso em sentido estrito concentra as condições objetivas (cabimento, adequação, tempestividade e inexistência de fatos impeditivos ou extintivos do direito recursal) e as subjetivas (interesse jurídico e legitimidade) de admissibilidade, motivo por que deve ser conhecido.

Como visto dos autos da ação penal, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MPSC) ofereceu denúncia contra EDUARDO TEIXEIRA ("RF", "Rofé" ou "Venom"), SEBASTIÃO LEODENIR GASPAR ("Turco ou Tio Coroa"), ALESSANDRO LEMOS CORRÊA ("LC") e MAXSUEL SCHULTZ DE OLIVEIRA ("Max"), imputando: [i] ao primeiro e ao segundo a prática dos crimes tipificados no art. 121, §§ 2º e 4º, incs. I, III e IV, do Código Penal e no art. 244-B, § 2º, do ECA (por duas vezes), na forma do art. 69 do Código Penal; [ii] ao terceiro a prática dos crimes tipificados no art. 121, §§ 2º e 4º, incs. I, III e IV, e no art. 347, parágrafo único, ambos do Código Penal, no art. 244-B, § 2º (por duas vezes), e no art. 244-B, caput (por duas vezes), ambos do ECA, na forma do art. 69 do Código Penal; e [iii] ao quarto a prática dos crimes tipificados no art. 211, caput, do Código Penal e no art. 244-B do ECA (por duas vezes), na forma do art. 69 do Código Penal, em razão dos seguintes atos ilícitos narrados na peça acusatória (Evento 1):

Fato 1

Entre a noite do dia 25 e a madrugada do dia 26 de junho de 2020, na Rua Leocácia Kerber Pivato, n. 211, loteamento Menegazzo, bairro Santa Catarina, em Caçador/SC, os denunciados Eduardo Teixeira, vulgo "RF, Rofé ou Venom", Sebastião Leodenir Gaspar, vulgo "Turco ou Tio Coroa", e Alessandro Lemos Corrêa, vulgo "LC", cientes das ilicitudes de suas condutas e com vontade orientada à prática delituosa, em comunhão de esforços e unidade desígnios com os adolescentes N.K.M.P1 (16 anos de idade) e J.E.L.M2 (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático", e outros três indivíduos não identificados, imbuídos de manifesto animus necandi, mataram Bruno Bomer, vulgo "Monstrão", em atividade típica da organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC.

Segundo as investigações, o adolescente J.E.L.M (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático" integrava a organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC e ocupava a função de "Rigor" na estrutura do grupo criminoso, cujo encargo era o de matar "desafetos" ou pessoas "decretadas" pela cúpula da organização criminosa.

A sua vez, os denunciados Eduardo Teixeira, vulgo ""RF, Rofé ou Venom" e Sebastião Leodenir Gaspar, vulgo "Turco ou Tio Coroa", são integrantes da cúpula da organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC e responsáveis por coordenar as atividades criminosas, dentre elas a de decretar ou autorizar a morte de desafetos do grupo criminoso, mediante "missões" designadas ao "Rigor", encargo exercido à época do crime pelo adolescente J.E.L.M (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático".

O denunciado Alessandro Lemos Corrêa, vulgo "LC", a sua vez, é integrante da organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense- PGC e locatário da residência em que a vítima foi morta, local em que também residia com ela.

Nesse contexto, embora a vítima Bruno Bomer, vulgo "Monstrão", integrasse a mesma organização criminosa dos denunciados, teve sua morte decretada pelos denunciados Eduardo Teixeira, vulgo ""RF, Rofé ou Venom" e Sebastião Leodenir Gaspar, vulgo "Turco ou Tio Coroa", em razão da suspeita de estar infiltrado na organização criminosa para repassar informações à facção rival Primeiro Comando da Capital - PCC, bem como por dever dinheiro ao adolescente J.E.L.M (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático".

Assim foi que, recebida a "missão" dada por Eduardo Teixeira, vulgo ""RF, Rofé ou Venom" e Sebastião Leodenir Gaspar, vulgo "Turco ou Tio Coroa" para matar a vítima, os adolescentes J.E.L.M (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático" e N.K.M.P (16 anos de idade), juntamente com o denunciado Alessandro Lemos Corrêa, vulgo "LC", e outros três indivíduos não identificados, dirigiram-se à residência da vítima, surpreenderam-na enquanto descansava na cama de um dos cômodos e passaram a desferir contra ela socos e golpes de mata-leão.

Ato contínuo, enquanto a vítima ainda tentava se defender, os denunciados desferiram contra ela pelo menos três golpes de faca na região esquerda do tórax, um golpe na região palmar esquerda, um golpe na região temporo-parietal esquerda, causando fratura ósseo, e diversos golpes de facão em sentido transversal do pescoço, causando ferimento complexo em região antero-Iateral direita do pescoço, que se estendeu da região submandibular média até região occiptal direita do couro cabeludo, causando fratura óssea do corpo mandibular direito, resultando na vítima choque hipovolêmico, o que foi causa de sua morte, conforme Laudo Perícia do Evento 1, INQ1, páginas 9-15.

Ressalta-se que o crime foi praticado por meio cruel, uma vez que os denunciados, mediante o uso de faca e facão, causaram diversos ferimentos no corpo e mão da vítima, bem como em sua cabeça, fraturando seus ossos e depois deixando-a sangrar até a morte, consoante Laudo Pericial do Evento 1, INQ1, páginas 9-15.

O crime também foi praticado por recurso que dificultou a defesa da vítima, uma vez que foi surpreendida de inopino, enquanto descansava em sua cama, por número elevado de agentes (6 pessoas), não permitindo defesa ou fuga.

O delito ainda se deu por motivo torpe, porquanto praticado em razão da suspeita da vítima participar e organização criminosa rival e por possuir divida financeira com o adolescente J.E.L.M (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático".

Além disso, o crime foi praticado mediante dissimulação, pois, cientes da ordem de morte da vítima, mantiveram-na morando com o denunciado Alessandro Lemos Corrêa, vulgo "LC", fazendo-a acreditar que ainda pertencia ao grupo criminosa, de forma a disfarçar a intenção hostil e surpreendê-la desatenta.

Consigna-se que, levada a efeito a morte de Bruno Bomer, vulgo "Monstrão", o adolescente J.E.L.M (16 anos de idade), vulgo "J.E ou Problemático" gravou um vídeo do cadáver da vítima, a fim de demonstrar à cúpula do PGC, composta pelos denunciados Eduardo Teixeira, vulgo ""RF, Rofé ou Venom" e Sebastião Leodenir Gaspar, vulgo "Turco ou Tio Coroa", o cumprimento da "missão", conforme mídias digitais 7 e 8.

Fato 2

Após o homicídio, no dia 27 de junho de 2020, por volta das 3 horas, nas...

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