Acórdão Nº 5000382-92.2020.8.24.0023 do Quarta Câmara de Direito Público, 19-11-2020

Número do processo5000382-92.2020.8.24.0023
Data19 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000382-92.2020.8.24.0023/SC

RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI

APELANTE: RICARDO ALEXANDRE PEREIRA LIMA (IMPETRANTE) ADVOGADO: JANQUIEL DOS SANTOS (OAB RS104298) APELADO: Presidente da Comissão de Concursos - FUNDAÇÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS SÓCIO ECONÔMICAS - FEPESE - Florianópolis (IMPETRADO) APELADO: FUNDAÇÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS SÓCIO ECONÔMICAS - FEPESE (INTERESSADO) APELADO: PROCURADORIA JURIDICA DA FEPESE (INTERESSADO) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP)

RELATÓRIO

Ricardo Alexandre Pereira Lima impetrou mandado de segurança, que tramitou na 3ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Florianópolis, em face de ato tido como ilegal e atribuído ao Presidente da Comissão de Concursos da Fundação de Estudos e Pesquisa Sócio-econômicos (FEPESE), o qual não anulou as questões de n. 5, 7, 31, 33, 36, 66, 68, 82, 87 e 91, da prova objetiva do concurso público para provimento do cargo de Agente Penitenciário, regido pelo Edital n. 01/2019-SAP/SC.

Na inicial, o impetrante sustenta, em resumo, que participou do aludido certame e que dez questões da prova objetiva apresentaram conteúdo que extrapola o contido no instrumento editalício. Sobre a questão n. 5, destaca que houve exigência do conhecimento de preposições e conjunções, classes de palavras não especificadas no edital. Quanto à questão n. 7, argumenta que a indicação de parágrafo do texto inexistente gera sua invalidade, pois apresenta informações distorcidas e equivocadas para realização da questão. Aponta que na questão n. 31 foi exigido conhecimento de Súmula Vinculante, matéria não prevista no instrumento convocatório. Já a questão n. 36, da mesma forma, cobrou conteúdo da Convenção Interamericana de Direitos Humanos e do Pacto dos Direitos Civis e Políticos, que não estavam previstos no edital.

Seguindo, sobre a questão n. 68, refere que o art. 306, § 2º, não determina que a nota de culpa seja assinada pela autoridade policial. Já questão n. 91 seria dúbia, pois há divergência doutrinária acerca do surgimento da pena restritiva de liberdade. Aponta, ainda, que as questões n. 66, 68, 82 e 87 tiveram seus gabaritos reformulados pela banca examinadora mas, mesmo assim, permanecem com irregularidades em suas alternativas e devem ser anuladas.

Requereu, liminarmente, a anulação das questões de n. 5, 7, 31, 33, 36, 66, 68, 82, 87 e 91 e sua reclassificação no certame, e ao final, postulou a concessão da segurança para confirmação da medida.

Por decisão interlocutória, o juízo singular deferiu parcialmente o pleito liminar para anular a questão n. 33, apenas (Evento 3).

A autoridade coatora prestou informações (Evento 14) alegando que as questões não apresentam conteúdo incompatível com o edital regulador do certame, estando inseridas no conteúdo programático previsto no Anexo III do edital. Quanto à questão n. 5, assinala que foi cobrado dos candidatos interpretação textual e não classe de palavras específicas. Na questão n. 7 informa que o erro material na indicação de parágrafo do texto não é suficiente para gerar a nulidade da questão. Em relação às questões n. 31 e n. 36, defende que as matérias exigidas têm relação com os temas Direito Constitucional e Direitos Humanos, previstos no edital. Sobre as questões n. 66, 68, 82 e 87, sustenta que o impetrante pretende rediscutir os critérios interpretativos de avaliação da banca e que as questões tiveram seus gabaritos modificados para resguardo da legalidade. Finalmente, na questão n. 91 destaca que o demandante apenas discorda da interpretação da banca examinadora sobre a matéria, situação que não gera direito à anulação. Pugnou, então, pela denegação da ordem.

O Ministério Público declinou de seu interesse na lide (Evento 21).

Na sentença (Evento 24), o magistrado denegou a segurança impetrada e o dispositivo encontra-se assim redigido:

Ante o exposto:

a) JULGO EXTINTO ESTE PROCESSO, sem resolução do mérito, quanto ao pedido inicial referente à anulação da questão nº 33, em face da perda superveniente do objeto e da consequente ausência de interesse processual, o que faço com fundamento no art. 485, VI, do CPC.

b) No mais, DENEGO o mandado de segurança impetrado por RICARDO ALEXANDRE PEREIRA LIMA contra ato administrativo atribuído ao Presidente da Comissão de Concursos - FUNDAÇÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS SÓCIO ECONÔMICAS - FEPESE - Florianópolis, resolvendo o mérito do processo, forte no art. 487, I, do CPC.

CONDENO a parte impetrante somente ao pagamento da taxa de serviços judiciais (CPC, art. 82, caput). A exigibilidade do ônus sucumbencial, todavia, fica sobrestada pelo prazo de 5 anos (CPC, art. 98, § 3º).

Sem honorários advocatícios (Lei nº 12.016/2009, art. 25).

Dispensado o reexame necessário (Lei nº 12.016/2009, art. 14, § 1º).

Irresignado, o impetrante interpôs recurso de apelação (Evento 28), reforçando os argumentos lançados na peça inicial. Acrescentou que a questão n. 87 deve ser anulada pois não há na legislação de execução penal um "direito a horário de lazer" ao preso.

A FEPESE apresentou contrarrazões (Evento 35).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. João Fernando Quagliarelli Borrelli, que entendeu não ser hipótese a justificar intervenção ministerial (Evento 6).

Este é o relatório.

VOTO

Cuida-se de recurso de apelação, interposto por candidato de concurso público, em face da sentença que denegou a segurança por ele pleiteada por considerar regulares questões da prova objetiva do certame para provimento do cargo de Agente Penitenciário, regido pelo Edital n. 01/2019-SAP/SC.

Quanto ao juízo de admissibilidade, verifico que o recurso preenche os pressupostos processuais intrínsecos e extrínsecos, razão pela qual deve ser conhecido.

O impetrante, nas razões, defende anulação das questões n. 5, 7, 31, 36, 66, 68, 82, 87 e 91 por sua incompatibilidade com o instrumento editalício. Conforme anotado em sentença, a questão n. 33 foi anulada pela banca examinadora no decorrer da lide, ocorrendo a perda do objeto superveniente quanto ao seu exame.

Adianto que não lhe assiste razão.

Cumpre observar, inicialmente, que não cabe ao Poder Judiciário, em regra, substituir os critérios de correção da banca examinadora, de modo que, somente em casos excepcionais, como questões manifestamente ilegais ou não previstas no edital, é viável a apreciação judicial do gabarito indicado pela banca examinadora.

Assim decidiu o Supremo Tribunal Federal, em sede de julgamento em recurso representativo da controvérsia, no Recurso Extraordinário n. 632.853 (Tema n. 485), no qual se firmou a seguinte tese jurídica: "Não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade".

Firmadas essas premissas, passo ao exame das questões de n. 5, 7, 31, 36, 66, 68, 82, 87 e 91 da prova objetiva, as quais tratavam dos temas de Língua Portuguesa, Direito Constitucional, Direitos Humanos, Lei dos Crimes de Tortura, Direito Processual Penal, Lei de Execução Penal e Sociologia aplicada, respectivamente. O Anexo 1 do Edital n. 01/2019-SAP/SC, que definiu o conteúdo programático desta etapa do certame, estabeleceu os seguintes pontos de estudo para essas disciplinas:

LÍNGUA PORTUGUESA

Compreensão e interpretação de texto (s). Ortografia oficial. Acentuação gráfica. Flexão nominal e verbal. Pronomes: emprego, forma de tratamento e colocação. Emprego de tempos e modos verbais. Vozes do verbo. Concordância nominal e verbal. Emprego da crase. Pontuação. Classes gramaticais variáveis: substantivo, adjetivo, artigo, numeral, pronome, verbo. Termos integrantes da oração: objeto direto e indireto, agente da passiva e complemento nominal. Redação Oficial: formas de tratamento, tipos de discursos, correspondência oficial.

[...]

SOCIOLOGIA APLICADA

História da instituição prisional. Encarceramento em massa. Encarceramento e pobreza. Instituições totalizantes. Ressocialização do apenado. Papel do agente penitenciário na ressocialização do preso. Políticas públicas para ressocialização.

DIREITOS HUMANOS

Teoria geral dos direitos humanos. Conceito, terminologia, estrutura normativa, fundamentação. Afirmação histórica dos direitos humanos. Direitos humanos e responsabilidade do Estado. Direitos humanos na Constituição Federal. Política Nacional de Direitos Humanos. A Constituição brasileira e os tratados internacionais de direitos humanos. Regras mínimas da ONU para o tratamento de pessoas presas. Programa Nacional de Direitos Humanos (PNHD-3), Decreto º 7.037/2009 e alterações.

DIREITO CONSTITUCIONAL

Direitos e garantias fundamentais: direitos e garantias individuais e coletivos; direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade; direitos sociais; nacionalidade; cidadania e direitos políticos. (Arts. 5 a 11). Defesa do Estado e das instituições democráticas: segurança pública; organização da segurança pública. (Arts. 136 a 144). Ordem social: base e objetivos da ordem social; seguridade social; educação, cultura e desporto; ciência e tecnologia; comunicação social; meio ambiente; família, criança, adolescente e idoso. (Arts. 193 a 230).

[...]

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Ação penal; espécies. (arts. 24 a 62). Prova (artigos 155 a 184 do Código de Processo Penal). Prisão em flagrante, Prisão, Medidas Cautelares e Liberdade Provisória (arts. 8, 26 e 282 a 310). Processos. dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos. (arts. 513 a 518). Preservação do Estado das coisas (art. 169). Nota de culpa (arts 306 a 309).

[...]

LEGISLAÇÃO ESPECIAL

Lei de Abuso de autoridade (Lei nº 4.898 de 9 de...

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