Acórdão Nº 5000397-64.2022.8.24.0064 do Segunda Câmara Criminal, 30-08-2022

Número do processo5000397-64.2022.8.24.0064
Data30 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5000397-64.2022.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

APELANTE: NILSSON HALEMBECK MACHADO DIAS (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de São José, o Ministério Público ofereceu denúncia contra Nilsson Halembeck Machado Dias, dando-o como incurso nas sanções do art. 155, §§ 1º e 4º, inciso I, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, em razão dos fatos assim descritos (evento 1):

No dia 25 de dezembro de 2021, por volta das 23h24min, durante o repouso noturno, o denunciado, Nilsson Halembeck Machado Dias, previamente determinado a cometer crime contra o patrimônio, deslocou-se até a residência localizada na Rua Sete de Setembro, s/n, bairro Kobrasol, São José/SC, e tentou subtrair para si: 1 (um) calçado, marca Grendene; 1 (um) umidificador; 3 (três) panelas, marca Tramontina; 1 (uma) chaleira, marca Tramontina; 1 (uma) frigideira, marca Fratelli; 49 (quarenta e nove) itens alimentícios; 2 (dois) produtos de limpeza; 1 (uma) faca de cozinha, marca Tramontina; 1 (uma) ferramenta, marca Cromo Vanádio; 1 (um) televisor, marca Samsumg, 52 polegadas; 5 (cinco) garrafas de cachaça; 11 (onze) peças de joias/bijuterias, bens no valor total avaliado de R$ 8.119,00 (oito mil cento e dezenove reais)1 , de propriedade da vítima Rodrigo Ramos. Para lograr êxito em seu intento criminoso, o denunciado arrombou a porta do imóvel.

Registra-se que a prática delituosa somente não se consumou por circunstâncias alheias a sua vontade, eis que a Polícia Militar o flagrou descendo as escadas da residência com os produtos do crime dentro de um saco de lixo, e a televisão já do lado de fora do imóvel.

Encerrada a instrução, foi julgada procedente a Exordial para condenar Nilsson Halembeck Machado Dias ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 03 (três) anos, 01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, no valor mínimo legal, por infração ao art. 155, §1º e §4º, I, c/c o art. 14, II, todos do Código Penal (evento 50).

Irresignada, a Defesa interpôs Recurso de Apelação (evento 52), em cujas Razões pugna pela absolvição por atipicidade da conduta, com incidência do princípio da insignificância.

Subsidiariamente requer a majoração da fração de 1/3 para 2/3 pelo reconhecimento da tentativa; afastamento da qualificadora do § 4º, inciso I, por ausência de laudo pericial; e alteração de regime para o semiaberto.

Apresentadas as Contrarrazões (evento 57), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Exmo. Sr. Dr. Lio Marcos Marin, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 8).

VOTO

O recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.

Pugna, a Defesa, em síntese, pela absolvição em razão da atipicidade da conduta com o reconhecimento do princípio da insignificância.

Contudo, razão não lhe assiste.

Inicialmente, faz-se necessário destacar que o Supremo Tribunal Federal, no HC n. 84.412/SP, pacificou entendimento no sentido de que são quatro os fatores a serem analisados para incidência do princípio da bagatela.

Tais vetores consistem na ausência de periculosidade social, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, mínima ofensividade da conduta e inexpressividade da lesão jurídica.

Os vetores acima transcritos, em uma palavra, servem para um melhor equacionamento da necessidade de responsabilização penal do Agente incurso (formalmente) em algum tipo incriminador, notadamente para que ela, a responsabilidade, não seja afastada sob uma perspectiva monocular, de simples operação matemática, em crimes contra o patrimônio, o que poderia denotar - de certa forma e em alguns casos - postura leniente do Poder Judiciário para com delinquentes contumazes.

No presente caso, verifica-se que os objetos subtraídos foram avaliados em R$ 8.119,00 (oito mil cento e dezenove reais), conforme Auto de Avaliação Indireta anexado ao Evento 1, P_FLAGRANTE1, Página 21, dos autos do inquérito, o que ultrapassa, em muito, o próprio valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, utilizado como parâmetro para o reconhecimento da bagatela, não havendo, portanto, falar em insignificância da conduta.

Sobre o tema, já decidiu este Colegiado na Apelação Criminal n. 5047515-51.2021.8.24.0038, de Relatoria da Desembargadora Salete Silva Sommariva, j. 22-03-2022:

APELAÇÃO CRIMINAL - FURTO QUALIFICADO PRATICADO NO PERÍODO NOTURNO E RECEPTAÇÃO SIMPLES (CP, ART. 155, §§ 1º E 4º, I E 180, CAPUT) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO DA DEFESA - FURTO - PRETENSA ABSOLVIÇÃO PELO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - INVIABILIDADE - RÉU PORTADOR DE MAUS ANTECEDENTES E MULTIRREINCIDENTE EM CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO - VALOR DOS BENS SUBTRAÍDOS ACIMA DE 10% DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE AO TEMPO DOS FATOS - CONDUTA QUE NÃO PODE SER CONSIDERADA UM INSIGNIFICANTE PENAL - FURTO PRIVILEGIADO - REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS - CONDENAÇÃO MANTIDA - DOSIMETRIA - PENA-BASE - PLEITO DE AFASTAMENTO DOS MAUS ANTECEDENTES - ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM - INOCORRÊNCIA - CONDENAÇÕES DIVERSAS - PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - SEGUNDA FASE - ALMEJADA COMPENSAÇÃO ENTRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA - INVIABILIDADE - RÉU MULTIRREINCIDENTE - COMPENSAÇÃO PARCIAL - PLEITO DE RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE OS CRIMES DE FURTO E DE RECEPTAÇÃO - IMPROCEDÊNCIA - DELITOS QUE NÃO SÃO DA MESMA ESPÉCIE - REQUISITOS DO ART. 71 DO CÓDIGO PENAL NÃO PRESENTES - REGIME INICIAL - MANUTENÇÃO DO REGIME FECHADO EM RAZÃO DOS ANTECEDENTES E DA REINCIDÊNCIA - RECURSO DESPROVIDO. (grifou-se)

Ainda que assim não fosse, inviável o reconhecimento da insignificância, também, em razão do histórico infracional do Apelante.

Observa-se das certidões de antecedentes criminais (Evento 3 dos autos 5024912-03.2021.8.24.0064) que o Apelante é reincidente específico, o que demonstra a periculosidade social da ação e a reprovabilidade da conduta. Quer-se dizer, o fato não foi acontecimento isolado em sua vida.

Acerca do tema é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, como se vê do HC n. 747.651/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 2/8/2022, DJe de 12/8/2022:

HABEAS CORPUS. PENAL. FURTO QUALIFICADO, NA FORMA TENTADA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RES FURTIVAE DE VALOR TOTAL QUE SUPERA 10% DO SALÁRIO MÍNIMO. HIPÓTESE EM QUE NÃO SE MOSTRA SOCIALMENTE RECOMENDÁVEL RECONHECER A ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. REGIME PRISIONAL INICIAL SEMIABERTO, MAIS GRAVOSO QUE O PARADIGMA FUNDADO NO QUANTUM DE PENA ABSTRATA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MULTIRREINCIDÊNCIA. CONDENAÇÃO ANTERIOR POR CRIME COMETIDO COM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. SÚMULA N. 269 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MÉRITO DO PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA ACOLHIDO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA.1. Espécie em que o Paciente foi condenado pelo crime de furto qualificado, na forma tentada, pela subtração, em 2021, de produtos expostos à venda em um supermercado localizado em Campinas - SP, por R$ 295,10 (duzentos e noventa e cinco reais e dez centavos).2. O valor venal das res furtivae supera 10% (dez por cento) do salário mínimo fixado à época - circunstância que, em regra, obsta a aplicação do princípio da insignificância.3. O fato de o produto do furto ter...

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