Acórdão Nº 5000434-20.2019.8.24.0057 do Terceira Câmara de Direito Público, 25-01-2022

Número do processo5000434-20.2019.8.24.0057
Data25 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000434-20.2019.8.24.0057/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: DORIS CRISTINA DA SILVA (AUTOR) APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na Comarca de Santo Amaro da Imperatriz, Doris Cristina da Silva ajuizou ação acidentária contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, sustentando que, em virtude de acidente de trajeto ocorrido em 07.04.2009, sofreu "fratura do joelho esquerdo, levando a fortes dores, dificuldade de deambulação e para permanecer grandes períodos em pé, bem como para realizar atividades que recrutem grande força física, típicas da atividade de promotora de vendas"; que, em face da lesão, o INSS implantou o benefício de auxílio-doença por certo período; que, todavia, em decorrência da lesão suportada, está incapacitada para o exercício de suas funções, razão pela qual requereu a concessão do benefício de auxílio-acidente.

Citado, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contestou arguindo, preliminarmente, a ausência de interesse processual de agir, frente à inexistência de requerimento do benefício na esfera administrativa, e a ocorrência da prescrição. No mérito, disse que não é devido qualquer benefício porque, de acordo com a perícia técnica, a autora não está incapacitada temporária ou definitivamente para o trabalho; que o benefício acidentário somente será devido se a perícia médica constatar a redução da capacidade laborativa da segurada; e que não há prova da ocorrência de acidente de trabalho.

Os argumentos expendidos na contestação foram impugnados.

Saneando o feito, o digno Magistrado afastou as preliminares aventadas pelo INSS, deferiu a realização de prova pericial e nomeou o perito.

O laudo foi juntado e as partes sobre ele se manifestaram.

Julgado procedente o pedido formulado na inicial em sentença proferida nos seguintes termos:

III- Dispositivo.

ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE o pedido, com fulcro no art. 487, inc. I, do CPC, e, em consequência, DETERMINO que o réu conceda em favor da parte autora o benefício auxílio-acidente acidentário no percentual de 50% do salário-de-beneficio.

Fixo o termo inicial do benefício na data desta sentença, pois, nada obstante a recente determinação do STJ no Tema 862 (suspensão dos processos que versem sobre termo inicial de auxílio-acidente decorrente da cessação do auxílio-doença), o caráter alimentar da verba pleiteada e as diretrizes firmadas pelo TJSC em casos similares (Apelação Cível n. 0001882-09.2014.8.24.0019, de Concórdia, rel. Des. Ricardo Roesler, j. 27-08-2019; Apelação Cível n. 0305301-59.2017.8.24.0018, de Chapecó, rel. Des. Júlio César Knoll, j. 11-02-2020) autorizam e recomendam o pagamento desde logo das parcelas incontroversas, sem prejuízo do pagamento posterior das diferenças remanescentes, na fase de cumprimento de sentença, conforme venha a decidir o STJ.

CONDENO, desde já, o INSS, ao pagamento das eventuais parcelas em atraso, decorrentes do julgamento do Tema 862, sobre as quais incidirão correção monetária pelo INPC desde o vencimento de cada uma, e juros de mora desde a citação, nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei n. 11.960/2009, e conforme decidido pelo STF n RE 870.947 e pelo STJ no REsp 1.495.146.

Fica revogado o item "1" da decisão de Evento 11, considerando o caráter acidentário do benefício.

CONDENO o requerido ao pagamento das custas processuais pela metade (repristinação do art. 33, §1º da LC 156/1997, na redação dada pela LC 524/2010), e dos honorários advocatícios, estes que arbitro em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até esta data (Súmula 111 do STJ).

Honorários pericial já requisitados no Evento 52.

Autora e réu apelaram.

A autora apelou sustentando que o termo inicial do auxílio-acidente deve ser o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, de acordo com o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 862. Disse, ainda, que os honorários sucumbenciais "devem ser contados até a data da efetiva definição dos efeitos financeiros da sentença, vez que o juízo não entregou a integralidade da prestação jurisdicional".

Já INSS apelou arguindo, inicialmente, a ausência de interesse processual de agir, frente à inexistência de requerimento do benefício na esfera administrativa, em face do transcurso do prazo de mais de 5 anos entre o cancelamento do benefício e o ajuizamento da ação. No mérito, disse que ficou demonstrado nos autos que a autora não apresenta redução da capacidade laborativa e tampouco necessita despender maior esforço físico para o exercício das atividades habituais, motivos pelos quais não é devido o benefício auxílio-acidente; que no caso de manutenção da decisão, o benefício deve ser concedido a partir da data da citação válida.

Após o oferecimento das contrarrazões pela autora, os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Os recursos serão analisados em conjunto.

Da preliminar de ausência de interesse de agir

Alega a autarquia previdenciária que a autora não conta com o necessário interesse de agir, uma vez que não formulou prévio requerimento administrativo para obtenção do auxílio-acidente que pleiteia nesta ação.

Por muito tempo o Judiciário adotou a orientação do Superior Tribunal de Justiça, contida na Súmula 89, segundo a qual "a ação acidentária prescinde do exaurimento da via administrativa".

Não obstante, o INSS continuava debatendo, até que a questão atinente à necessidade de prévio requerimento administrativo para obviar a propositura da ação acidentária foi submetida a repercussão geral, pelo Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário n. 631240, da relatoria do Ministro Roberto Barroso, em que foi firmada a seguinte tese jurídica (Tema 350):

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir." (STF, RE 631240, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014 RTJ VOL-00234-01 PP-00220).

Extrai-se desse julgamento, dentre outras compreensões, que: (i) para que o segurado conte com o necessário interesse de agir para a propositura de ação previdenciária ou acidentária, em geral é necessário o prévio requerimento administrativo do benefício perante o INSS; (ii) não é necessário aguardar o exaurimento da via administrativa; (iii) qualquer conduta do INSS, que tem a obrigação de conceder o benefício mais favorável, que implique...

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