Acórdão Nº 5000448-30.2021.8.24.0058 do Sétima Câmara de Direito Civil, 20-04-2023

Número do processo5000448-30.2021.8.24.0058
Data20 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000448-30.2021.8.24.0058/SC



RELATOR: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIOR


APELANTE: JOSTINA MOURA (AUTOR) APELANTE: SABEMI SEGURADORA SA (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Trato de apelações cíveis interpostas respectivamente por Sabemi Seguradora S.A. (ré) e Jostina Moura (autora) contra sentença proferida nos autos da ação de conhecimento, movida pela segunda recorrente em desfavor da primeira.
O dispositivo da decisão objurgada restou assim redigido (ev. 38):
Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados e resolvo o mérito, na forma do artigo 487, inciso I, do CPC.
Em consequência, declaro a nulidade da relação jurídica entre as partes a ensejar o desconto de eventual contribuição da conta bancária da autora, vinculado ao benefício previdenciário nº 162.997.710-9, devendo a ré restituir em dobro os valores indevidamente exigidos, além de eventuais parcelas posteriormente descontadas no curso da demanda.
Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados e resolvo o mérito, na forma do artigo 487, inciso I, do CPC.
Em consequência, declaro a nulidade da relação jurídica entre as partes a ensejar o desconto de eventual contribuição da conta bancária da autora, vinculado ao benefício previdenciário nº 162.997.710-9, devendo a ré restituir em dobro os valores indevidamente exigidos, além de eventuais parcelas posteriormente descontadas no curso da demanda.
Condeno a ré ao pagamento de R$ 7.000,00, a título de compensação por danos morais, com incidência de juros legais no percentual de 1% ao mês desde a data do primeiro desconto indevido (evento danoso) e correção monetária contada da data desta sentença (ementa n. 362 do STJ).
Os valores serão atualizados e sofrerão a incidência de juros legais de 1% ao mês a contar de cada desconto. O índice de correção é o INPC, como definido pelo eg. TJSC.
Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais no importe de 50% para cada uma.
Em relação aos honorários advocatícios, condeno a ré ao pagamento de 10% sobre o valor da condenação e condeno a autora ao pagamento de 10% sobre o valor que decaiu dos danos morais, ambos com fulcro no art. 85, § 2.º, do Código de Processo Civil.
Todavia, fica suspensa, por ora, a cobrança das despesas processuais em relação à autora, tendo em vista que deferido o benefício da gratuidade (evento 8).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Cumpridas as formalidades legais, arquivem-se os autos.
Irresignada, a seguradora ré apelou. Aduziu que comprovou a legítima contratação do seguro, de modo que agiu no exercício regular de direito. Nesse cenário, pretende a reforma da sentença, para que seja a regularidade da sua conduta reconhecida, com o consequente afastamento da repetição do indébito e da condenação por danos morais. Subsidiariamente, pleiteia a restituição simples das quantias e a minoração da verba compensatória (ev. 46).
Por sua vez, a autora apresentou apelo tão somente para ver a seguradora ré condenada a integralidade da sucumbência processual (ev. 51).
Intimadas as partes, apenas a autora apresentou contrarrazões (ev. 50).
É o relatório

VOTO


1. ADMISSIBILIDADE
Presentes os requisitos de admissibilidade para ambos os recursos, passo à análise do mérito.
2. DO MÉRITO
3.1 (IR)REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO
A controvérsia inicial cinge-se em verificar a (i)licitude do desconto efetuados pela ré no benefício previdenciário da autora, circunstância inconteste na lide.
A princípio, é importante ressaltar que se aplicam ao caso em tela as disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor, conforme acertadamente consignou o togado singular, uma vez que as partes envolvidas na demanda condizem com os conceitos de consumidor e fornecedor apontados, respectivamente, pelos arts. 2º e 3º do referido diploma legal.
Ao contrário do Código Civil, a Lei n. 8.078/90 optou pela responsabilidade objetiva, retirando a necessidade de comprovação do elemento subjetivo, em razão da manifesta vulnerabilidade do consumidor. Dessarte, basta que este comprove o dano e o nexo de causalidade com o serviço oferecido para que o fornecedor responda pelos prejuízos causados, ainda que não tenha incidido em uma das formas de culpa. A responsabilidade somente poderá ser afastada quando comprovada a inexistência de defeito no serviço ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Em análise dos substratos probatórios colacionados aos autos, verifico que a autora alegou não ter realizado a contratação de seguro que ocasionou os descontos em seu benefício previdenciário.
A fim de corroborar suas premissas, apresentou junto à inicial o mínimo que era de sua incumbência, carreando aos autos elementos que comprovam o fato constitutivo do seu direito.
Diante da impossibilidade em produzir prova de fato negativo, incumbia à seguradora ré atestar a regularidade na cobrança da dívida, expondo causa que excluísse a sua responsabilidade (art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor) e apresentando, assim, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do requerente, nos moldes do art. 373, II, do Código de Processo Civil.
Todavia, a demandada não impugnou de forma robusta a afirmação autoral no sentido de que não teria efetuado a contratação, deixando de trazer elemento probatório que pudesse, de forma clara, refutar a tese da autora. Tratou a defesa, portanto, de meras conjecturas postas em controvérsia.
Ademais, fez constar seu desinteresse na produção de prova pericial quando deixou de acostar ao feito o contrato original.
Nessas circunstâncias, o não exercício a contento do ônus previsto no CPC traz como consequência o julgamento desfavorável à parte incumbida da prova (art. 373, II).
Nesse cenário, não há nos autos sequer indício que justifique a cobrança do seguro aqui discutido, não tendo a seguradora ré logrado êxito em desconstituir as premissas de fraude feitas pela autora, motivo pelo qual entendo que deva a sentença ser mantida incólume no ponto.
3.2 DANOS MORAIS
Neste ponto a seguradora se insurge contra a sentença no ponto que reconheceu a existência de abalo anímico sofrido pela requerente em virtude dos descontos indevidos e ou a sua minoração.
Pois bem.
É cediço que, conforme determina o art. 5º, X, da Constituição da República, "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".
O Código Civil, em seu art. 186, preceitua que "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito" e, em razão disso, consoante prevê o art. 927 do mesmo diploma, "fica obrigado a repará-lo".
No mesmo diapasão, o art. 6º, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor, também dispôs acerca do assunto, asseverando que constitui direito básico do consumidor "a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos".
Conforme já previamente fundamentado, as relações norteadas pelo diploma consumerista são disciplinadas pela responsabilidade civil objetiva, bastando que fique comprovado o dano sofrido pelo consumidor e o nexo de causalidade deste com o produto ou serviço oferecido pelo fornecedor para que sobrevenha a obrigação de indenizar.
No presente caso, resta analisar a (in)ocorrência do dano.
Não obstante a existência de entendimento contrário, esta Sétima Câmara de Direito Civil adotou recentemente a tese de que o abalo anímico decorrente de desconto indevido em benefício previdenciário ou reserva de margem consignada não é presumido. Nestes casos, deve-se analisar o conjunto probatório dos autos afim de perquirir a ocorrência do dano.
E assim sendo, registro não ser qualquer melindre que se configura apto a justificar a compensação pecuniária a título de danos morais, sob pena de banalização do referido instituto, uma vez que a ofensa, muitas vezes, pode ser tão insignificante que sequer gere prejuízo imaterial.
O abalo anímico somente restará caracterizado quando houver uma ofensa aos direitos da personalidade do sujeito, em virtude da colocação deste diante de situação vexatória que chegue ao ponto de lhe perturbar o íntimo, intensificando a naturalidade dos fatos cotidianos, provocando fundadas aflições e angústias.
Nesse diapasão, leciona Antônio Jeová Santos:
Diante da possibilidade de um ganho fácil, pessoas se colocam como vítimas de danos morais e tudo fazem par lograr o intento principal, que é a indenização. [...] Ocorrem certas situações em que a primeira indagação do juiz quando tem contato com a demanda é a de saber até que ponto a vítima contribuiu para que o dano (ou suposta lesão) acontecesse? A moda do dano moral é tão rútila que, não raro, em qualquer petição inicial, embute-se pedido de indenização por dano moral, sem que exista a causa de pedir, ou fundamentos jurídicos do pedido. O requerimento é feito apenas para seduzir e impressionar a parte contrária. De outra banda, o suposto dano é tão insignificante, aquilo representou tão pouco no espírito ofendido, que não deveria estar no estrado judicial. De minimis non curat praetor. Já foi afirmado neste trabalho que para o dano moral subsistir é necessário que ele tenha algum substrato, certa magnitude. O simples enfado não configura o dano moral. (Dano moral indenizável. 5. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2015. p. 87-88).
Na espécie, a parte ré realizou desconto indevido no benefício previdenciário da autora a título de seguro não contratado. O valor do desconto totalizava R$ 28,58, enquanto o valor do benefício daquela alcançava a monta de R$ 1.045,00. Isto é, o desconto indevido representou menos de 3% da remuneração do demandante.
Nesse contexto, entendo que o ato ilícito não foi, por si só, suficiente...

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