Acórdão Nº 5000451-22.2021.8.24.0078 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 29-09-2022

Número do processo5000451-22.2021.8.24.0078
Data29 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000451-22.2021.8.24.0078/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: ALBERTINA DE JESUS CESCA (AUTOR) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 22), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

ALBERTINA DE JESUS CESCA ajuizou ação contra BANCO BMG S.A, ambos já qualificados, na qual sustentou, em suma, que: i) firmou contrato de empréstimo consignado com a parte ré, sendo-lhe informado que o pagamento seria feito por meio de descontos mensais diretamente em seu benefício previdenciário do INSS; ii) percebeu, posteriormente, que a avença não se tratava de um empréstimo consignado "normal", mas, sim, de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC); iii) desde então a parte ré tem retido 5% de seu benefício a título de margem consignável para pagamento do cartão; iv) não contratou os serviços e não recebeu o cartão para uso.

Requereu: i) a declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito RMC; ii) a condenação da restituição em dobro dos descontos realizados; iii) incidência do Código de Defesa do Consumidor; iv) a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 15.000,00; v) deferimento da justiça gratuita à parte.

A parte autora foi intimada a comprovar a sua hipossuficiência.

A parte ré compareceu espontaneamente aos autos, apresentando resposta na forma de contestação, na qual sustentou: i) a regularidade da contratação do cartão de crédito, e a ausência de vício de consentimento da parte autora; ii) a ausência de danos morais; iii) o descabimento da repetição de indébito.

Houve réplica.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. SABRINA MENEGATTI PITSICA, da Unidade Regional de Direito Bancário da Comarca de Florianópolis, julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 22):

Ante o exposto, com resolução de mérito, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para:

I - Declarar a nulidade da modalidade contratual apresentada (contrato de cartão de crédito consignado) e, por consequência, determinar que as partes voltem ao status quo ante, devendo, os valores depositados na conta bancária da parte autora, atualizados monetariamente pelo INPC, ser compensados com a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente pela parte ré a título de RMC, atualizados monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desembolso;

II - Condenar a parte ré a efetuar o pagamento em favor da parte autora, a título de danos morais, da quantia de R$ 5.000,00, acrescida de correção monetária pelo INPC a partir desta sentença e de juros de mora de 1% ao mês, a contar da data da inclusão dos descontos no benefício previdenciário da parte autora, qual seja, 01/01/2016.

Diante da comprovação da hipossuficiência da parte autora, DEFIRO-LHE o benefício da justiça gratuita.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios de sucumbência, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, com fundamento no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Da Apelação da Instituição Financeira

Inconformado com a prestação jurisdicional, o BANCO BMG S.A, ora Apelante, interpôs recurso de Apelação (Evento 31).

Alega, em suma, a legalidade do contrato celebrado. Aduz que o contrato de cartão de crédito consignado com possibilidade de saque é suficientemente claro e preciso ao identificar a modalidade que está se contratando, os mecanismos de pagamento e a cobrança dos débitos correspondentes.

Acrescenta que os documentos anexados aos autos demonstram que o contrato não dá margem a interpretação equivocada, pois existe autorização expressa da Autora para o desconto em folha de pagamento.

Assevera que inexistente a prática de ato ilícito, sendo indevida a condenação por dano moral. Ainda, sustenta que a situação fática descrita não caracteriza abalo moral indenizável, uma vez que o dano alegado sequer foi comprovado.

Argumenta que a restituição dos valores descontados somente é possível quando há cobrança de quantia indevida, o que não é o caso dos autos.

Ainda, disse que os juros de mora na indenização do dano moral devem incidir a partir da citação.

Ao final, requer o provimento do Apelo, para reconhecer a validade da contratação, e a inexistência dos danos morais e materiais. Subsidiariamente, pugna pela minoração da indenização por abalo moral.

Da Apelação da Autora

Também inconformado, a Autora ALBERTINA DE JESUS CESCA, interpôs recurso de Apelação (Evento 27), aduzindo, em síntese, que ao ser ludibriada com a forma de contração proposta pelo Banco, faz jus a majoração do quantum da indenização do dano moral.

Das contrarrazões

Devidamente intimadas, tão somente a Autora apresentou contrarrazões (Evento 38).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Com a distribuição, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merecem conhecimento.

II - Do julgamento conjunto dos recursos

Tratam-se de Apelações Cíveis interpostas por BANCO BMG S.A e pela Autora ALBERTINA DE JESUS CESCA, ambos contra a sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na "Ação Declaratória de Inexistência de Contratação de Empréstimo via Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) c/c Reparação por Danos Morais".

a) Da nulidade contratual

Inicialmente, imperioso destacar que a relação existente entre as partes está sob o albergue do Código de Defesa do Consumidor, subsumindo-se Apelante e Apelada aos conceitos de fornecedor e consumidor prescritos nos artigos 2° e 3°, ambos do Diploma Protetivo.

Ademais, quanto à aplicabilidade das normas consumeristas às Instituições Financeiras, incide na espécie a Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça: "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Superada a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em comento, passo à análise da discussão vertida nos autos.

No caso em comento, a Instituição Financeira, ora Apelante, defende a regularidade da contratação, a legalidade na reserva de margem consignável, bem como a inexistência de dano moral.

Por outro lado, a Apelada alegou que tinha pretensão de firmar contrato de empréstimo consignado, com desconto direto em seu benefício previdenciário, porém, foi surpreendida com a liberação de um cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), com juros claramente mais onerosos.

Pois bem.

Da análise da documentação constante nos autos, verifico que a Apelada firmou com o Banco Apelante, na data de 27/01/2016, "Termo de Adesão de Cartão de Crédito Consignado Banco BMG e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento" (Evento 8 - CONTR 2) sob n. 41159074, acreditando, segundo alega, ter contratado empréstimo consignado com descontos mensais em seu benefício previdenciário.

Do extrato de pagamentos apresentado pela Apelada denoto que, além de outros empréstimos consignados, consta em "Contratos - RMC - BANCO BMG" o pacto entabulado com o Banco Apelante (Evento 1 - FINANC 4).

Em que pese o Banco Apelante tenha apresentado o contrato firmado entre as partes, bem como haja cláusula expressa de reserva consignável, tal fato, por si só, não comprova a sua validade. É inconteste o defeito na prestação de serviço, pois, decorre da análise detida dos autos, que não foram prestadas informações claras e suficientes pela Instituição Financeira acerca da modalidade de tomada de crédito que estava sendo pactuada e as suas consequências, o que fez com que a parte Apelada contratasse operação mais onerosa e diversa daquela que pretendia.

Aliás, a controvérsia "cinge-se à falta de informação da operação bancária ao adquirente do crédito: se este detinha, ou não, conhecimento acerca da modalidade contratada e de suas consequências contratuais" (TJSC, Apelação Cível n.0308281-70.2017.8.24.0020, de Meleiro, rel. Des. MONTEIRO ROCHA, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21/02/2019).

Em caso análogo, este Órgão Julgador entendeu que:

Em que pese tal documentação conferir substrato à celebração de negócio jurídico entre as partes, as circunstâncias do caso evidenciam a existência de vício de consentimento do consumidor...

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