Acórdão Nº 5000473-21.2019.8.24.0088 do Segunda Câmara de Direito Público, 11-04-2023

Número do processo5000473-21.2019.8.24.0088
Data11 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000473-21.2019.8.24.0088/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ


APELANTE: FISCHER S/A - AGROINDUSTRIA (IMPETRANTE) APELADO: MUNICÍPIO DE LEBON RÉGIS (INTERESSADO) APELADO: SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS - MUNICÍPIO DE LEBON RÉGIS - LEBON RÉGIS


RELATÓRIO


Trata-se de apelação cível interposta por FISCHER S/A - AGROINDUSTRIA contra sentença (evento 23, DOC1) que, no mandado de segurança n. 50004732120198240088 impetrado em face de ato atribuído ao SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS DE LEBON RÉGIS, denegou a segurança postulada.
A parte insurgente sustenta, em síntese, que a transmissão do imóvel matriculado sob o n. 1.539 junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Lebon Régis deve ser isenta de ITBI, porquanto a movimentação decorre da sucessão por incorporação da sociedade empresária proprietária. Defende que sua atividade preponderante é a produção de maçã e suco de maçã, correspondente a aproximadamente 90% (noventa por cento) de sua receita operacional, e não a compra e venda de bens ou direitos, locação de imóveis ou arrendamento mercantil. Alega, ademais, que foi esclarecido nos autos a data da incorporação do aludido imóvel ao seu patrimônio, qual seja, em 28/02/2011. Requer, assim, o conhecimento e provimento do recurso (evento 32, DOC1).
Contrarrazões apresentadas (evento 38, DOC1).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Excelentíssimo Senhor Basílio Elias de Caro, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso "para que seja concedida a ordem, com a ressalva de que a imunidade em relação ao ITBI prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor do bem que exceder o limite do capital social a ser integralizado" (evento 9, DOC1).
Intimadas, as partes manifestaram-se sobre a constitucionalidade do art. 7º, § 3º, I, da Lei n. 1.607/2017 do Município de Lebon Régis (evento 16, DOC1 e evento 17, DOC1).
Na sessão realizada em 15/02/2022 esta Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, "suspender o julgamento e instaurar o incidente de arguição de inconstitucionalidade, nos termos do art. 948 e seguintes do CPC, perante o Órgão Especial" (evento 25, DOC1).
O Órgão Especial, em sessão ocorrida em 06/07/2022, decidiu, por unanimidade, "julgar procedente o incidente para declarar a inconstitucionalidade o art. 7º, § 3º, I, da Lei n. 1.607/2017, do Município de Lebon Régis" (evento 18, DOC1)

VOTO


A pretensão recursal consiste na concessão de segurança a fim de determinar à autora coatora a emissão da certidão de isenção do Imposto de Transmissão de Bens Inter Vivos relativo ao imóvel matriculado sob o n. 1.539 no Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Lebon Régis.
Compulsando os autos, extrai-se que o pleito foi indeferido administrativamente porque consta no contrato social da empresa ora recorrente como objeto social o exercício da atividade de locação de imóveis, o que contraria o disposto no art. 7º da Lei Municipal n. 1.607/2017, a saber:
Art. 7º O ITBI não incide:
[...] VIII - na transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoas jurídicas em realização de capital e na transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda de bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
§ 2º Considera-se preponderante a atividade referida no inciso VIII deste artigo quando mais de cinquenta por cento (50%) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente dos bens ou direitos decorrer das transações mencionadas.
§ 3º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida no inciso VIII deste artigo, quando a pessoa jurídica enquadrar-se em pelo menos um dos incisos deste parágrafo:
I - estiver prevista no objeto social a atividade de compra e venda de bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
II - constar como atividade principal no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ ou;
III - mais de cinquenta por cento (50%) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos dois (02) anos anteriores e nos dois (02) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações, administração ou sucessão dos direitos mencionadas neste artigo.
§ 4º Verificada a preponderância a que se referem os §§ 2º e 3º deste artigo, tornar-se-á devido o ITBI nos termos da Lei vigente a data da aquisição e sobre o valor atualizado do imóvel ou dos direitos sobre ele. (grifou-se)
Ocorre que o Órgão Especial desta Corte reconheceu a inconstitucionalidade do referido art. 7º, § 3º, I, da Lei n. 1.607/2017, do Município de Lebón Régis. Para tanto, assentou-se que o legislador local extrapolou sua competência legislativa ao restringir a hipótese de imunidade tributária prevista no texto constitucional. Confira-se a ementa do julgado:
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRIBUTÁRIO. ART. 7º, § 3º, I, DA LEI N. 1.607/2017 DO MUNICÍPIO DE LEBON RÉGIS. ITBI. IMUNIDADE SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS DECORRENTES DE SUCESSÃO EMPRESARIAL. INVIABILIDADE NO CASO DA ATIVIDADE PREPONDERANTE DA EMPRESA CORRESPONDER À COMPRA E VENDA OU LOCAÇÃO DE IMÓVEIS. ART. 156, § 2º, I, DA CF. CONCEITUAÇÃO DE ATIVIDADE PREPONDERANTE DEFINIDA PELO CTN. REGULAMENTAÇÃO DAS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR RESERVADA À LEI COMPLEMENTAR. ART. 146, II, DA CF. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL QUE EXTRAPOLA A LEGISLAÇÃO FEDERAL E APRESENTA MAIS RESTRIÇÕES À IMUNIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE EVIDENCIADA. ARGUIÇÃO PROCEDENTE (Arguição de Inconstitucionalidade n. 5008304-88.2022.8.24.0000, Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 7/7/2022).
De relevo incorporar os fundamentos do aresto para bem equacionar o ponto aqui debatido:
A partir da leitura do dispositivo transcrito, depreende-se que a legislação municipal prevê que a simples presença no objeto social da empresa da atividade de compra e venda de bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil implica no reconhecimento de sua predominância sobre as demais, de modo a obstar a obtenção da imunidade do Imposto sobre Transmissão "Inter Vivos" de Bens Imóveis - ITBI nas operações decorrentes da incorporação de uma pessoa jurídica por outra.
A aludida imunidade, por sua vez, encontra-se prevista no art. 156, II, § 2º, I, da Constituição Federal, a saber:
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
[...]
II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
[...]
§ 2º - O imposto previsto no inciso II:
I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
II - compete ao Município da situação do bem. (grifou-se)
Como visto, nos contornos constitucionais, o ITBI não incide sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes da incorporação de uma pessoa jurídica por outra, salvo se a atividade preponderante da adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.
Contudo, no texto constitucional não houve definição do que se trata a atividade preponderante de compra e venda de bens imóveis, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, de modo que indispensável lei complementar regulamentando a matéria, consoante disciplina o art. 146, II, da Constituição Federal:
Art. 146. Cabe à lei complementar:
[...]
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
Conforme leciona Roque Antonio Carrazza, o assunto "foi esmiuçado do Código Tributário Nacional, que faz as vezes da lei complementar a que se refere o art. 146, II, da CF." (Curso de direito constitucional tributário. 25. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 841). Assim, a delimitação deu-se com os §§ 1º a 3º do art. 37, do CTN, nestes termos:
Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior:
I - quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito;
II - quando decorrente da incorporação ou da fusão de uma pessoa jurídica por outra ou com outra.
Parágrafo único. O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso I deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa...

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