Acórdão Nº 5000503-90.2021.8.24.0054 do Segunda Turma Recursal - Florianópolis (Capital), 26-10-2021

Número do processo5000503-90.2021.8.24.0054
Data26 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
Classe processualPROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL
Tipo de documentoAcórdão
RECURSO CÍVEL Nº 5000503-90.2021.8.24.0054/SC

RELATOR: Juiz de Direito MARCO AURELIO GHISI MACHADO

RECORRENTE: VALDECI FRANCISCO HASCKEL (AUTOR) RECORRIDO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) E OUTRO

RELATÓRIO

Conforme autorizam o artigo 46 da Lei 9.099/95 e o Enunciado 92 do FONAJE, dispensa-se o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso inominado interposto em face de sentença que julgou improcedente os pedidos, defendendo, em síntese, a desnecessidade de inclusão da União no polo passivo da demanda, e alternativamente, o julgamento do feito sem resolução de mérito.

O reclamo merece provimento parcial, no caso o julgamento de extinção do feito em razão da incompetência absoluta da Justiça Estadual, nos termos da fundamentação que se expõe, sendo incabível o julgamento de improcedência.

Recentes decisões tratam da obrigatoriedade da inclusão da União no polo passivo da demanda, como litisconsorte passivo necessário:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS ENTES FEDERADOS.COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. A responsabilidade dos Entes Federados configura litisconsórcio passivo, podendo a ação em que se postula fornecimento de prestação na área da saúde ser proposta contra a União, Estado ou Município, individualmente ou de forma solidária, podendo a autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Eventual acerto de contas em virtude do rateio estabelecido, deve ser realizado administrativamente ou em ação própria. (Recurso Extraordinário (RE 855.178, Tema 793). 2. Considerando a recente tese fixada pelo STF, é de ser reconhecida a competência para julgamento do feito da Justiça Federal, mantendo-se a União no polo passivo da demanda." (TRF4, AG 5056281-38.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 27/04/2021).

Para dirimir qualquer dúvida, transcreve-se do Supremo Tribunal Federal:

"Agravo regimental na reclamação. 2. Direito Constitucional. 3. Direito à saúde. Responsabilidade solidária. 4. Fornecimento de medicamento não incluído nas políticas públicas. A União necessariamente comporá o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica. Aplicação correta do tema 793. Precedente. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Negado provimento ao agravo regimental." (Rcl 48760 AgR, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 04/10/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-202 DIVULG 08-10-2021 PUBLIC 11-10-2021.)

Diante da obrigatoriedade da formação do litisconsórcio passivo necessário, a União passaria a compor o polo passivo desta lide, o que torna evidente a incompetência absoluta do juízo estadual para processar e julgar demanda em que figura ente público federal em um dos polos da ação, sendo competente para tanto apenas e exclusivamente o Juízo Federal.

De acordo com o art. 27 da Lei nº 12.153/2019, que dispõe sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, aplica-se subsidiariamente o disposto na Lei nº 9.099/1995.

E sobre o tema, infere-se da Lei nº 9.099/1995, que é causa de extinção do processo o reconhecimento da incompetência territorial ou figurar como parte no processo pessoa física ou jurídica indicada no art. 8º da norma, conforme consta no art. 51, incisos III e IV, vejamos:

"Art. 51. Extingue-se o processo, além dos casos previstos em lei:

(...)

III - quando for reconhecida a incompetência territorial;

IV - quando sobrevier qualquer dos impedimentos previstos no art. 8º desta Lei;"

Como resultado lógico, se a simples incompetência territorial leva a extinção da ação submetida ao rito da Lei nº 9.099/95, não há como a afastar que o vício mais grave, incompetência absoluta, não resultasse na mesma consequência processual, consistente na extinção anômala do feito. Nesse sentido:

RECURSO INOMINADO - AÇÃO DE COBRANÇA - PEQUENA EMPREITADA, REALIZADA PESSOALMENTE PELO EMPREITEIRO NA CONDIÇÃO DE OPERÁRIO OU ARTÍFICE - COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA DO TRABALHO (ART. 652, III, DA CLT. C/C ART. 114, I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988) - EXTINÇÃO DO PROCESSO EX OFFICIO (ART. 51 DA LEI N. 9.099/95) RECURSO PREJUDICADO. (TJSC, Recurso Inominado n. 0300076-52.2017.8.24.0020, de Criciúma, rel. Antonio Augusto Baggio e Ubaldo, Terceira Turma Recursal, j. 26-08-2020).

"RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE MANUTENÇÃO/RESTABELECIMENTO DE PLANO DE SAÚDE E ODONTOLÓGICO CUMULADA COM PERDAS E DANOS. MANUTENÇÃO DE PLANO DE SAÚDE E ODONTOLÓGICO DA UNIMED OFERTADO AOS EMPREGADOS DA CASAN, CONFORME PREVISÃO EM ACORDO COLETIVO DE TRABALHO E EM PROGRAMA DE DEMISSÃO VOLUNTÁRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA JULGAR A MATÉRIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA DIRIMIR LITÍGIOS ORIUNDOS DE ACORDO OU CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO FEITO. RECURSO PROVIDO." (TJSC, Recurso Inominado n. 0801602-98.2013.8.24.0064, de São José, rel. Cláudio Eduardo Regis de Figueiredo e Silva, Primeira Turma de Recursos - Capital, j. 16-11-2017).

"RECURSO INOMINADO. SERVIDOR PÚBLICO DO DEPARTAMENTO DE ESTRADAS DE RODAGEM - D.E.R. - Servidor admitido pelo regime celetista. Incompetência absoluta do Juizado Especial da Fazenda Pública para processar e julgar a causa. Competência da Justiça do Trabalho nos termos do artigo 114, I, da Constituição Federal. Matéria relativa a vantagens previstas em Lei Estadual e não na CLT. Irrelevância. Súmula 97 do STJ. Recurso provido para declarar a nulidade da sentença e determinar a extinção do processo sem resolução do mérito." (TJSP; Recurso Inominado Cível 1019614-57.2020.8.26.0071; Relator (a): Daniele Mendes de Melo; Órgão Julgador: 1ª Turma Cível; Foro de Bauru - Anexo do Juizado Especial da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 26/02/2021; Data de Registro: 26/02/2021.)

Não discrepa a doutrina de Luiz Felipe Salomão:

"Tratando-se de incompetência territorial, ela é relativa. Pode ser arguida em preliminar de contestação (artigo 30), ao contrário do que ocorre no processo comum - que exige a exceção - podendo, assim como a incompetência absoluta, ser conhecida de ofício e a qualquer tempo pelo Juiz, atentando-se aos princípios da simplicidade, celeridade e economia processual que norteiam a conduta do aplicador da lei em comento. Reconhecida a incompetência, quer absoluta, quer relativa, a consequência é a extinção do processo (art. 51, inciso III, da Lei do Juizados Especiais)." (In Roteiro dos Juizados Especiais Cíveis: anotações à Lei nº 9.099/95, com modelos, formulários, jurisprudência e legislação aos Juizados Especiais Cíveis. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 42 - grifei).

Assim, neste mesmo sentido, denota-se que a Lei nº 12.153/2009, em seu art. 5º, inciso II, é clara ao vedar a União como parte no Juizado Especial da Fazenda Pública Estadual, o que, aplicando-se subsidiariamente a Lei nº 9.099/1995, caracteriza-se como causa extintiva do feito, in verbis:

"Art. 5º Podem ser partes no Juizado Especial da Fazenda Pública:

I - como autores, as pessoas físicas e as microempresas e empresas de pequeno porte, assim definidas na Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006;

II - como réus, os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e os Municípios, bem como autarquias, fundações e empresas públicas a eles vinculadas."

Nesse sentido o enunciado 8 do FONAJE - Fazenda Pública:

"De acordo com a decisão proferida pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça no Conflito de Competência 35.420, e considerando que o inciso II do art. 5º da Lei 12.153/09 é taxativo e não inclui ente da Administração Federal entre os legitimados passivos, não cabe, no Juizado Especial da Fazenda Pública ou no Juizado Estadual Cível, ação contra a União, suas empresas públicas e autarquias, nem contra o INSS".

Logo, não é possível dar prosseguimento ao presente feito, sendo inevitável a extinção, tendo em vista que a presença da União no polo passivo é condição sine qua non para o processamento e julgamento do presente feito, o que acarreta a incompetência deste...

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