Acórdão Nº 5000520-25.2019.8.24.0175 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 06-05-2021

Número do processo5000520-25.2019.8.24.0175
Data06 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000520-25.2019.8.24.0175/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA

APELANTE: IRACEMA PACHECO CREPALDI (AUTOR) APELANTE: BANCO BMG SA (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:

IRACEMA PACHECO CREPALDI ajuizou a presente ação em desfavor BANCO BMG SA, ambos qualificados nos autos.

Em linhas gerais, a parte requerente alega que realizou empréstimo consignado junto à instituição financeira requerida. Porém, meses após, foi surpreendida com o desconto "Reserva de Margem de Cartão de Crédito", o que deu origem a constituição da reserva de margem consignável (RMC). Informa que desde então a requerida tem realizado a retenção de margem consignável no percentual 5% sobre o valor do seu benefício previdenciário. O que, no seu entendimento, configura fraude contratual, porquanto tais serviços não foram por si solicitados ou contratados, apenas requereu e autorizou o empréstimo consignado, cujos encargos contratuais são inferiores aqueles. Disse que sequer houve o recebimento ou desbloqueio do cartão e que o desconto compromete a margem consignável do seu benefício (30%), tornando a dívida impagável, ante a onerosidade dos encargos contratuais.

Dentre outros provimentos, requereu: a tutela provisória de urgência antecipada que a parte ré se abstenha de reservar a margem consignável e empréstimo sobre a RMC; a declaração da inexistência da contratação de empréstimo consignado na modalidade RMC (cartão de crédito); a condenação da parte requerida na restituição em dobro dos descontos realizados mensalmente a esse título; indenização por danos morais. Subsidiariamente pugnou pela readequação/conversão do empréstimo de cartão de crédito (RMC) para a modalidade consignada (evento 1).

O pedido de tutela antecipada foi indeferido (evento 9).

Em contestação, a instituição financeira refutou argumentos contidos na inicial. Disse que a modalidade de crédito foi contratada pela parte requerente, que recebeu o valor correspondente em sua conta bancária. Sustentou que devolução de valores pretendida por esta configuraria enriquecimento ilícito. Alegou a inexistência de ato ilícito, tampouco dano moral indenizável. Pugnou pela rejeição integral dos pedidos autorais (evento 12).

Houve réplica (evento 18) e tréplica (evento 22). (grifo no original)

Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (Evento 24), nos seguintes termos:

JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por IRACEMA PACHECO CREPALDI em desfavor de BANCO BMG SA, para, acolhendo o pedido subsidiário e com amparo no artigo 6º, incisos III e V do Código de Defesa do Consumidor, determinar que a instituição financeira requerida proceda, no prazo de 30 (trinta) dias, a readequação dos termos do contrato de "Cartão de Crédito Consignado" conforme parâmetros acima elencados.

Ainda, JULGO EXTINTO o processo com resolução de mérito, na forma do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Frente a sucumbência recíproca, CONDENO as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), a serem partilhados no percentual de 50% (cinquenta por cento) para cada uma, à luz do artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil - sobretudo por se tratar de demanda de pouca complexidade, com reduzido número atos processuais e sem instrução do processo -, corrigidos monetariamente a partir da publicação desta sentença e acrescidos de juros de mora após o trânsito em julgado.

Por ser beneficiária da gratuidade da justiça (evento 9), fica suspensa exigibilidade dos ônus sucumbenciais em relação à parte requerente.

Irresignadas, ambas as partes recorreram (Eventos 28 e 37).

A instituição financeira ré requer, preliminarmente, que a parte autora seja intimada para informar o seu conhecimento quanto ao ajuizamento da ação, ante o reiterado ajuizamento de ações pelo advogado da parte, e caso haja negativa, postula pela condenação do advogado em litigância de má-fé, bem como a expedição de ofícios à OAB/SC, ao Ministério Público e à Autoridade Policial competente, para que apure os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica. Sustenta, ainda, como prejudicial do mérito a ocorrência da prescrição trienal.

No mérito, alega, em síntese, a ausência de violação ao direito de informação ante a legalidade da contratação em voga, pois a autora anuiu em ambos os benefícios previdenciários ao "Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado", mostrando-se válidas as contratações, eis que realizadas mediante expresso requerimento e ciência da demandante para tanto; que a parte autora não tinha margem de crédito disponível à época das contratações, porquanto haviam dois empréstimos consignados vigentes no benefício de aposentadoria por idade, os quais implicavam no comprometimento de aproximadamente 30% da remuneração recebida, bem como haviam cinco empréstimos ativos no benefício de pensão por morte, o que representava também quase 30% da renda mensal recebida, de modo que a única operação viável para ambas as hipóteses, eram as que foram ofertadas; que não ocorreu a violação ao direito de informação ante a legalidade das contratações em voga, inexistindo ato ilícito perpetrado pela casa bancária, não havendo dano moral a ser indenizado e também, valores a serem repetidos, vez que legítimos os descontos e as contratações. Por fim, pugna, pelo provimento do recurso a fim de que seja reformada a sentença objurgada para que sejam julgados improcedentes os pedidos inaugurais, com a redistribuição dos ônus sucumbenciais. Sucessivamente, requer a minoração do quantum indenizatório arbitrado, bem como seja permitida a incidência dos juros remuneratórios e do IOF nas contratações.

A parte autora, por sua vez, defende a nulidade dos contratos, eis que os documentos acostados aos autos demonstram que não houve utilização do cartão de crédito via RMC, tampouco o seu desbloqueio, aduzindo, ademais, que se houveram saques complementares ao valor inicialmente contratado, referida "transferência em favor do consumidor se traduz em "amostra grátis" pois em nenhum momento o consumidor solicitou tal pecúnia" (Evento 37, APELAÇÃO1, p. 5).

Aduz, que o Ministério Público Estadual se manifestou nos autos n. 0303067-59.2019.8.24.0075 reafirmando a ilegalidade do negócio jurídico nos moldes que vem sendo celebrado com os consumidores.

Sustenta, ainda, que o banco réu praticou venda casada e violou o direito de informação, porquanto, em verdade, pretendia a contratação de empréstimo consignado pessoal e não um cartão de crédito com reserva de margem de crédito, de modo que deve ser reconhecida a ilegalidade dos pactos, com a consequente condenação em indenização por danos morais.

Pugna, por fim, pelo provimento do recurso com a reforma do decisum objurgado, a fim de que os pedidos exordiais sejam julgados totalmente procedentes.

Com contrarrazões de ambas as partes (Eventos 39 e 41), a instituição financeira ré repisou as preliminares aventadas no apelo.

Vindo-me, então, conclusos os autos.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de apelações cíveis interpostas, respectivamente, por Banco BMG S.A. e Iracema Pacheco Crepaldi contra a sentença que, nos autos da "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Dano Moral, com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada", julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial.

Inicialmente, insta destacar que a assertiva levantada pela parte autora acerca da manifestação do Ministério Público Estadual nos autos n. 0303067-59.2019.8.24.0075, sobre a suposta ilegalidade das contratações com reserva de margem consignável, tal mostra-se inócua, tendo em vista ser imprescindível o exame fático de cada caso para o reconhecimento ou não da regularidade do pacto, razão em que se mostra impossível a fixação de tese única.

Por outro lado, sustenta a instituição financeira ré, preliminarmente, a ocorrência da prescrição da repetição de indébito e danos morais, pois afirma ter decorrido o lapso trienal para tal desiderato.

Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, pacificou entendimento no sentido da incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual, in verbis:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL...

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