Acórdão Nº 5000538-18.2021.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 04-02-2021

Número do processo5000538-18.2021.8.24.0000
Data04 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Habeas Corpus Criminal Nº 5000538-18.2021.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER


PACIENTE/IMPETRANTE: RAMON CARLOS FERNANDES (Paciente do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: ALTAMIR FRANÇA (Impetrante do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Criminal da Comarca de Itapema


RELATÓRIO


Trata-se de habeas corpus impetrado pelo advogado Altamir França em favor de Ramon Carlos Fernandes, denunciado e preso pela apontada prática dos crimes tipificados nos arts. 157, § 2º, II e V, e 288, caput, ambos do Código Penal.
Em síntese, sustentou o impetrante que o paciente vem sofrendo constrangimento ilegal por parte do Juízo de Direito da Vara Criminal da comarca de Itapema, que decretou a sua prisão preventiva, pois inexistem fatos novos e contemporâneos para justificar a manutenção da custódia cautelar e há excesso de prazo tanto para a formação da culpa quanto para revisão da sua segregação preventiva.
Asseverou que "[...] os fatos utilizados para justificar a medida cautelar, tanto os processos referidos quanto o próprio delito, ocorreram no ano de 2019, isto é, mais de 1 ano atrás" (sic, fls. 3 da impetração), além do que foi absolvido em uma das ações penais, bem assim "[...] que a necessidade de contemporaneidade não se aplica somente à decisão que decreta, mas também àquela que revisa a necessidade de manutenção da prisão" (sic, fls. 4 da petição inicial).
Afirmou que aguarda recluso o processamento do feito desde abril de 2020 - há quase um ano - sem que sequer tenha sido iniciada a instrução processual, não havendo justificativa para tanto, uma vez que não se trata de causa complexa e, "[...] a despeito da ocorrência de conflito negativo de jurisdição, a toda evidência não se pode atribuir a culpa da demora em sua resolução ao Paciente, mas tão somente ao Poder Judiciário" (sic, fls. 5 da exordial).
Ponderou também não houve a reanálise do decreto constritivo no prazo de noventa dias previsto no art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal.
Pugnou, pois, pela concessão da ordem, para que seja fosse colocado em liberdade.
Recebida a pretensão por este magistrado e ausente pedido liminar, após a prestação das informações solicitadas à autoridade acoimada de coatora, remeteu-se o feito à douta Procuradoria-Geral de Justiça, a qual, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Lio Marcos Marin, opinou pela denegação da ordem.
É o relatório

VOTO


De início, importa consignar que o habeas corpus constitui-se em remédio constitucional destinado exclusivamente à aferição da legalidade ou não do ato tido por coator, permanecendo fora do raio de seu objeto qualquer discussão a respeito do mérito da causa.
Outrossim, sabe-se que deverá ser concedida a respectiva ordem sempre que alguém sofrer, ou se achar ameaçado de sofrer, violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (Constituição Federal, art. 5º, LXVIII).
Consoante relatado, o objetivo do writ é a concessão do direito de responder ao processo em liberdade, ao argumento, a priori, de que inexistem fatos novos e contemporâneos para justificar a manutenção da custódia cautelar, porquanto "[...] os fatos utilizados para justificar a medida cautelar, tanto os processos referidos quanto o próprio delito, ocorreram no ano de 2019, isto é, mais de 1 ano atrás" (sic, fls. 3 da impetração), além do que o paciente foi absolvido em uma das ações penais, bem assim "[...] que a necessidade de contemporaneidade não se aplica somente à decisão que decreta, mas também àquela que revisa a necessidade de manutenção da prisão" (sic, fls. 4 da petição inicial).
Em que pese a argumentação tecida pelo impetrante, razão não lhe assiste.
Inicialmente, cumpre mencionar que, não obstante o paciente tenha sido denunciado - juntamente com Carlos Alberto Fernandes e Ronilson Gercke - pela apontada prática dos crimes tipificados nos arts. 157, § 2º, II e V, e 288, caput, ambos do Código Penal, remanesceu na ação penal n. 5001461-91.2020.8.24.0125 somente a análise da primeira infração penal indicada, nos termos da decisão do correspondente evento 83 (juntada a fls. 213 do evento 1.2 desta actio), porquanto o delito de associação criminosa ficou sob a competência da comarca de Porto Belo e foi julgado no âmbito da ação penal n. 5003312-60.2019.8.24.0139. O roubo circunstanciado pelo concurso de agentes e restrição à liberdade da vítima retornou para a Vara Criminal da comarca de Itapema (Conflito Negativo de Jurisdição n. 5038644-83.2020.8.24.0000).
Além disso, sabe-se que a contemporaneidade do art. 312, § 2°, do CPP refere-se à proximidade do lapso temporal transcorrido entre o delito cometido e a ordem para prisão e não quanto a outras ocorrências que, no presente caso, foram utilizadas pelo Togado singular com outra finalidade, qual seja, a de justificar o receio de reiteração da ação ilícita cometida e a necessidade de acautelar a ordem pública (análise do periculum libertatis).
Posto isso, é certo que, apesar de haver decorrido cinco meses e dezoito dias entre a ação perpetrada (30-10-2019 - fls. 5 do evento 1.2) e a decretação da prisão preventiva (em 17-4-2020 - fls. 16 do evento 1.2), assim somente se deu porque foi necessário identificar os autores do crime patrimonial, aguardar o exame do Ministério Público do Estado de Santa Catarina delimitando a situação para posterior oferecimento da exordial acusatória e a manifestação acerca da representação policial para a adoção da medida extrema, bem assim o estudo dos autos pelo Magistrado singular.
Os processados, ao que consta da investigação, montaram um grande esquema criminoso, associando-se para o cometimento de roubo de cargas, especialmente de cigarros, e tinham a facilidade de se esquivar da atuação estatal, o que dificultou tanto a demarcação da conjuntura pela equipe de investigação como a análise posterior em juízo. Tamanha foi a complexidade dada à causa, inclusive observada pelo próprio impetrante, que a demanda posteriormente chegou nesta Corte de Justiça com questionamentos até mesmo pela competência (Conflito Negativo de Jurisdição n. 5038644-83.2020.8.24.0000). Todo esse cenário justifica o lapso decorrido que, ademais, sequer foi exacerbado ao ponto de se entender que não havia contemporaneidade no momento da decisão que determinou a prisão preventiva dos denunciados.
Em situação similar decidiu esta Corte:
HABEAS CORPUS. PACIENTES DENUNCIADOS POR, SUPOSTAMENTE, TEREM PRATICADO OS CRIMES DE FURTO QUALIFICADO MEDIANTE FRAUDE, TENTADO E CONSUMADO, FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS PÚBLICO E PARTICULAR E LAVAGEM DE CAPITAL (ART. 155, §4º, INCISO II, C/C ART. 14, INCISO II, POR DUAS VEZES E ART. 155, §4º, INCISO II, POR SEIS VEZES, ART. 297 E ART. 298, §1º, NA FORMA DO ART. 69, TODOS DO CÓDIGO PENAL E ART. 1º, §4º, DA LEI N. 9.613/1998). INSURGÊNCIA QUANTO À DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA DOS PACIENTES [...] AVENTADO A INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CONTEMPORANEIDADE ENTRE OS FATOS E A DECISÃO COMBATIDA. TESE RECHAÇADA. COMPLEXIDADE DOS CRIMES EM COMENTO. REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS IMPRESCINDÍVEIS PARA ELUCIDAÇÃO DOS FATOS QUE DEMANDAM TEMPO [...] WRIT CONHECIDO. ORDEM DENEGADA (Habeas Corpus n. 5041640-54.2020.8.24.0000, de Navegantes, rel. Des. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, j. 15-12-2020).
Além disso, imperioso consignar que "Não há falar em ausência de contemporaneidade ou fato novo para a manutenção da prisão preventiva, isso porque, a legislação é clara ao afirmar que tais requisitos são exigidos apenas no momento da decretação da prisão cautelar, conforme disposto no artigo 315, §1°, do CPP, e não no momento de sua revisão" (TJSC, Habeas Corpus n. 5032874-12.2020.8.24.0000, de Sombrio, rel. Des. Júlio César Machado Ferreira de Melo, j. 6-10-2020).
Na sequência, citando redação comumente referida por este relator em seus votos, afirmou o impetrante que o paciente aguarda o processamento do feito desde abril de 2020 - há quase um ano - sem que sequer tenha sido iniciada a instrução processual, não havendo justificativa para tanto, uma vez que, entende, não se trata de causa complexa e, "[...] a despeito da ocorrência de conflito negativo de jurisdição, a toda evidência não se pode atribuir a culpa da demora em sua resolução ao Paciente, mas tão somente ao Poder Judiciário" (sic, fls. 5 da exordial).
Ressalta-se, dessa maneira, a afirmação de que, por não se confundir com a exatidão e a insensibilidade inerentes ao cômputo matemático, possível excesso de tempo para a formação da culpa deve ser aferido além da mera adição dos atos processuais relativos ao procedimento adotado, sendo necessária a morosidade do órgão acusatório ou do Poder Judiciário para a detecção da aventada demasia.
Isso porque, explica-se, garantida a celeridade do andamento processual a todos de maneira indistinta (CF, art. 5º, LXXVIII), especialmente aos réus custodiados preteritamente ao trânsito em julgado, devem os sujeitos processuais zelar pela regular tramitação, porquanto inviável que a persecução penal se estenda indefinidamente, causando transtornos de variadas medidas ao acusado, sob pena de remeter-se a espécie a casos emblemáticos. Sobre a matéria, extrai-se do escólio de Renato Brasileiro de Lima:
Segundo notícia divulgada pelo site da Folha de São Paulo em 26 de julho de 2009, o Conselho Nacional...

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