Acórdão Nº 5000576-34.2022.8.24.0052 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 18-04-2023

Número do processo5000576-34.2022.8.24.0052
Data18 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000576-34.2022.8.24.0052/SC



RELATOR: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO(A): FELIPE BARRETO TOLENTINO (OAB SC057388A) APELADO: JOSE DE FREITAS (AUTOR) ADVOGADO(A): JULIANO SOUZA (OAB SC019456)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação cível interposto por BANCO BMG S/A contra sentença de parcial procedência (evento 27) da denominada ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com restituição de indébito e indenização por danos morais, a qual foi prolatada nos seguintes termos:
Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, nos termos da fundamentação, para os fins de:
a) DECLARAR a inexigibilidade do valor descontado na folha de pagamento da parte autora a título de RMC estabelecido pelo banco réu.
b) CONDENAR a parte ré à restituição simples dos valores retidos indevidamente, os quais devem ser apurados mediante cálculo aritmético, corrigidos monetariamente pelo INPC desde cada desconto e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação;
c) RESOLVER o contrato entabulado entre as partes e DETERMINAR a devolução, pela parte autora, dos valores creditados em sua conta bancária referente ao contrato discutido nos autos, acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês, ambos a contar da data de cada disponibilização na conta do autor;
d) CONDENAR a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula n. 362 do STJ) e juros legais desde a citação.
e) DETERMINAR a compensação do valor a ser devolvido pela parte autora (item "c"), com as verbas que tem direito a receber (itens "b" e "d").
Face à sucumbência recíproca, condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais na proporção de 70%; arcando, a parte autora, com os 30% remanescentes.
Fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, considerando o valor e a simplicidade da causa, o seu rápido deslinde e o julgamento antecipado do mérito, distribuídos na proporção da sucumbência, vedada a compensação (art. 85, §14, CPC).
A exigibilidade da obrigação sucumbencial resta suspensa em favor da parte autora, em virtude dos benefícios da justiça gratuita concedidos.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Em suas razões recursais (evento 35), a casa bancária sustenta, em síntese, a legalidade do negócio jurídico celebrado entre as partes, ressaltando a inexistência de prova de que o apelado teria sido levado a erro, não se vislumbrando, assim, irregularidade que dê causa à anulação do instrumento. Assevera que, à época da pactuação, o recorrido já não tinha margem consignável em seus rendimentos, inviabilizando a contratação de empréstimo consignado, restando apenas a obtenção de crédito consignado através da adesão ao contrato de cartão de crédito com margem consignável. Aduz a inexistência de termo final a caracterizar dívida impagável, porquanto o débito é extinto com pagamento do débito, na data do vencimento da fatura, constitui liberalidade do autor. Defende que o uso cartão fica constituído e provado pelo saque de valores, razão pela qual não há falar em nulidade. Também, afirma inexistir danos indenizáveis, requerendo, subsidiariamente, a minoração do "quantum". Ainda, discorre acerca do descabimento da restituição de valores, vislumbrando, em caso de manutenção do "decisum", que eventual importância disponibilizada à parte adversa sejam devolvidos ou compensados, e devidamente corrigidos monetariamente, sob pena de enriquecimento ilícito.
Foram apresentadas contrarrazões (evento 43).
Este é o relatório

VOTO


Insurge-se a instituição financeira contra sentença de parcial procedência da ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais.
Os pontos atacados no apelo serão analisados separadamente com o objetivo de facilitar a compreensão.
Observância ao art. 926 do Código de Processo Civil
A casa bancária pretende, "ab initio", o reconhecimento da legalidade do contrato ajustado entre os litigantes, suscitando a aplicação do art. 926 do Código Fux, sob argumento de que esta Corte de Justiça teria uniformizado a jurisprudência acerca da matéria quando do entendimento exarado pela Turma de Uniformização dos Juizados Especiais.
Nada obstante, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial deste Tribunal, no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0000507-54.2019.8.24.0000, decidiu que a questão em debate ("Validade ou não da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável") não seria unicamente de direito, "necessitando de exame fático para reconhecer, caso a caso, a invalidade do negócio", impedindo, assim, "a fixação de tese uniforme e vinculativa sobre todo o Estado".
Eis o teor da ementa:
DIREITO COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL - INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO VIA CARTÃO DE CRÉDITO E RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE - COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR LITIGANTE - ELEMENTO FÁTICO DECISIVO NO JULGAMENTO DA LIDE - QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO INOCORRENTE - REQUISITO INDISPENSÁVEL À ADMISSÃO DO IRDR INEXISTENTE - INCIDENTE INADMITIDO Demandando a questão controvertida juízo de valor sobre o comportamento do consumidor litigante, a matéria não envolve questão unicamente de direito, mas também de fato, a afastar a admissibilidade do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de um de seus indispensáveis requisitos de coexistência obrigatória. (TJSC, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0000507-54.2019.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Monteiro Rocha, Grupo de Câmaras de Direito Comercial, j. em 12/6/2019).
Sob esse prisma, percebe-se que restou inadmitido referido Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, razão pela qual não há amparo no pretenso pedido da apelante.
A esse respeito, já se manifestou este Órgão Fracionário:
APELAÇÕES CÍVEIS. "AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO". CONTRATO DE EMPRÉSTIMO VIA CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. PRELIMINARES SUSCITADAS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. [...] PLEITO PARA UTILIZAÇÃO DE JULGAMENTO PARADIGMA DA TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. INVIABILIDADE. GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL DESTA CORTE QUE INADMITIU O INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS N. 0000507-54.2019.8.24.0000 SOBRE O MESMO TEMA TRATADO NESTE AUTOS EM VIRTUDE DA NECESSIDADE DE JUÍZO DE VALOR SOBRE O COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR LITIGANTE, NÃO SENDO POSSÍVEL GENERALIZAR A VALIDADE OU INVALIDADE DOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO VIA CARTÃO DE CRÉDITO E RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. PROEMIAL REJEITADA. [...] RECURSO DA CASA BANCÁRIA CONHECIDO E DESPROVIDO. APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0310842-67.2017.8.24.0020, rel. Des. José Maurício Lisboa, j. em 27/8/2019) (sem grifos no original)
Logo, o requerimento merece inacolhimento.
Contratação via cartão de crédito consignado
Relativamente ao tema, importa esclarecer que, durante o curso do processado, a parte autora defendeu a nulidade da contratação ajustada com a ré, sustentando ter sido vítima de fraude por esta ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), operação diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado, o qual acreditou efetivamente ter celebrado.
No pronunciamento judicial atacado, o Magistrado de Primeiro Grau concluiu pela nulidade do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável, determinando que os valores depositados na conta bancária do autor, atualizados monetariamente pelo INPC, sejam compensados, na forma simples, com os valores descontados indevidamente pelo banco a título de RMC, corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desembolso.
Em seu reclamo, pretende a apelante a reforma do referido "decisum", a fim de que seja julgada improcedente a demanda, no que assevera, para tanto, a validade do contrato de cartão de...

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