Acórdão Nº 5000602-57.2022.8.24.0076 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 30-05-2023

Número do processo5000602-57.2022.8.24.0076
Data30 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000602-57.2022.8.24.0076/SC



RELATORA: Desembargadora JANICE GOULART GARCIA UBIALLI


APELANTE: GENOR JARME MANENTI (EMBARGANTE) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (EMBARGADO) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


BANCO DO BRASIL S.A. e GENOR JARME MANENTI interpuseram recursos de apelação da sentença proferida nos autos dos Embargos à Execução n. 5000602-57.2022.8.24.0076. O decisório recorrido, integrado pela decisão de evento 35, contou com a seguinte parte dispositiva (evento 16):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os presentes Embargos à Execução, o que faço com força no art.487, I, do Código de Processo Civil, nos termos da fundamentação.
Considerando a sucumbência reciproca, condeno as partes ao pagamento das custas e honorários os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, rateados em 50% cada.
P.R.I.
Com o trânsito em julgado junte-se cópia da presente sentença nos autos principais, e arquivem-se.
O banco apelante sustenta, em síntese, que a) é "incabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, porque a relação estabelecia entre as partes se deu no formato de impulso à atividade empresarial, produtiva e comercial da embargante, e não no formato consumerista"; b) "a mera existência de contrato de adesão pactuado entre as partes, não implica, necessariamente, na existência de cláusulas leoninas, tampouco conduz à presunção absoluta de onerosidade excessiva para o devedor"; c) "a capitalização dos juros no caso em tela é totalmente possível no formato contratado, porquanto existe previsão legal para tal e, primordialmente, houve efetiva contratação entre as partes no referido contrato"; d) "é permitida a cobrança da capitalização de juros anual, independente da pactuação expressa"; e) "apesar de previsto no contrato a cláusula de comissão de permanência, nos cálculos não foram cumulados como quer fazer crer os embargantes" e apenas "em caso de inadimplemento haverá a incidência de comissão de permanência"; f) "não há nenhuma ilegalidade nos valores contratados, especialmente nos juros remuneratórios, desta forma, não resta configurado o direito de repetição de indébito, seja ele na forma simples ou em dobro"; g) "não há que se falar em condenação da parte apelante ao pagamento de custas e honorários, isso porque sucumbiu em parte mínima" (evento 29).
O embargante recorrente, por sua vez, aduz que: a) o apelo deve ser recebido em ambos os efeitos; b) "a jurisprudência mais atenta vem decidindo ser inexigível a configuração do [...] adimplemento substancial da dívida ou consignação dos valores incontroversos - para a desconfiguração da mora"; c) "seja a mora descaracterizada determinando-se, como consequência lógica, a vedação de inscrição em róis de inadimplentes até que decorrido o prazo para pagamento após o recálculo bem assim que a incidência dos encargos moratórios ocorra apenas após liquidado o contrato"; d) o banco apelado deve ser condenado, com exclusividade, ao pagamento dos honorários advocatícios, a serem majorados (evento 51).
Com as contrarrazões (eventos 53 e 57), ascenderam os autos a esta Corte

VOTO


Recurso do banco
Inicialmente, não conheço do apelo manejado pela casa bancária em 28-2-2023 (evento 46), após o acolhimento dos aclaratórios opostos pelo autor. Isso porque aquele decisório (evento 35) determinou unicamente a correção de erro material constante no dispositivo da sentença anterior (evento 16) para fazer constar "parcial procedência" no lugar de "improcedência", como reconhecido pelo próprio banco no bojo do primeiro recurso interposto (evento 29):
"Pelo exposto, requer-se o conhecimento e provimento do recurso ora interposto, para que seja reformada a sentença a quo, no que tange aos argumentos trazidos nos tópicos acima, bem como, que seja alterado a parte dispositiva da sentença, posto que não corresponde ao julgamento da ação, uma vez que houve julgamento parcial, requer também que seja redistribuídos os honorários em favor da instituição financeira".
Assim, como não houve modificação no mérito do decisum, aplicável à hipótese o § 5º do art. 1.024 do CPC: "Se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração será processado e julgado independentemente de ratificação".
Por conseguinte, tal recurso não pode ser conhecido em face da preclusão consumativa operada no ato de interposição da primeira apelação em 27-9-2022 (evento 29), bem como em razão do princípio da unirrecorribilidade que, segundo os ensinamentos de Bernardo Pimentel Souza "está consubstanciado na exigência de que cada decisão seja atacada por apenas um recurso, qual seja, o previsto na legislação como adequado à impugnação do decisum causador do inconformismo" (in Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória, 8ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 68).
Dito isso, e presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço apenas da insurgência do banco disposta no evento 29.
Código de Defesa do Consumidor
A instituição financeira argumenta ser "incabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, porque a relação estabelecida entre as partes se deu no formato de impulso à atividade empresarial, produtiva e comercial da embargante, e não no formato consumerista", bem como que "a mera existência de contrato de adesão pactuado entre as partes, não implica, necessariamente, na existência de cláusulas leoninas, tampouco conduz à presunção absoluta de onerosidade excessiva para o devedor".
De acordo com o entendimento da Corte Superior de Justiça, não incide o CDC, por ausência da figura do consumidor (art. 2º do CDC), nos casos de financiamento bancário ou de aplicação financeira com o propósito de ampliar capital de giro e atividade profissional, se não, vejamos:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO. PESSOA JURÍDICA. MÚTUO PARA FOMENTO DE ATIVIDADE EMPRESARIAL. CONTRATO DE CAPITAL DE GIRO. EMPRESA NÃO DESTINATÁRIA FINAL DO SERVIÇO. RELAÇÃO DE CONSUMO. INEXISTÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. TEORIA FINALISTA MITIGADA. VULNERABILIDADE NÃO PRESUMIDA. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.1. Ação revisional de contrato bancário ajuizada em 24/08/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 23/02/2022 e concluso ao gabinete em 01/06/2022.2. O propósito recursal consiste em dizer se o Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica firmada entre as litigantes, oriunda de contratação de empréstimo para fomento de atividade empresarial.3. Nos termos da jurisprudência do STJ, é inaplicável o diploma consumerista na contratação de negócios jurídicos e empréstimos para fomento da atividade empresarial, uma vez que a contratante não é considerada destinatária final do serviço. Precedentes. Não há que se falar, portanto, em aplicação do CDC ao contrato bancário celebrado por pessoa jurídica para fins de obtenção de capital de giro.4. Dessa maneira, inexistindo relação de consumo entre as partes, mas sim, relação de insumo, afasta-se a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e seus regramentos protetivos decorrentes, como a inversão do ônus da prova ope judicis (art. 6º, inc. VIII, do CDC).5. A aplicação da Teoria Finalista Mitigada exige a comprovação de vulnerabilidade técnica, jurídica, fática e/ou informacional, a qual não pode ser meramente presumida. Nesta sede, porém, não se pode realizar referida análise, porquanto exigiria o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos (Súmula 7/STJ).6. Afasta-se a aplicação de multa, uma vez que não configura intuito protelatório ou litigância de má-fé a mera interposição de recurso legalmente previsto.7. Recurso especial conhecido e provido.(REsp n. 2.001.086/MT, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27-9-2022, DJe de 30-9-2022).
Na hipótese, o crédito foi concedido com recursos originários de repasses da Agência Especial de Financiamento Industrial - Finame e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico - Bndes, com previsão de utilização para aquisição de caminhão para utilização na atividade profissional do adquirente, conforme consta na cédula de crédito bancário n. 40/00189-X (docs 4-7 dos autos da execução n. 0300122-38.2015.8.24.0076).
Portanto, nítido que o ajuste foi pactuado por pessoa física com o propósito de fomentar sua atividade profissional, razão pela qual, nos termos da jurisprudência do STJ, não há como reconhecer a aplicação da legislação consumerista.
Nesse sentido, colho do acervo jurisprudencial desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL E AGRAVO RETIDO. AÇÃO INDENIZATÓRIA DECORRENTE DE PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CONDENAÇÃO DA DEMANDANTE ÀS PENAS DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. [...] PLEITO DE APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INSUBSISTÊNCIA. DEMANDANTE QUE ADQUIRIU O PRODUTO (CARRETA) COM O INTUITO DE FOMENTAR SUA ATIVIDADE EMPRESARIAL (TRANSPORTES). IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA FINALISTA MITIGADA ANTE A AUSÊNCIA DE VULNERABILIDADE, EM ESPECIAL A TÉCNICA. APELO DA DEMANDANTE. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO (CAMINHÃO) POR MEIO DE FINANCIAMENTO DO BNDES (FINAME). ENTREGA REALIZADA APÓS A APROVAÇÃO DO EMPRÉSTIMO PELO BANCO, MAS ANTES DA LIBERAÇÃO DO PAGAMENTO. POSTERIOR CANCELAMENTO DA OPERAÇÃO. INADIMPLEMENTO QUE ACARRETOU A EMISSÃO DO TÍTULO E SEU APONTAMENTO A PROTESTO PELA APELADA. TESE DE ILICITUDE. NÃO ACOLHIMENTO. DÍVIDA EXISTENTE AO TEMPO DO APONTAMENTO. RECORRENTE QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR A ALEGAÇÃO DE QUE A NÃO LIBERAÇÃO DO PAGAMENTO OCORREU POR CULPA DA RECORRIDA. ÔNUS QUE LHE INCUMBIA, A TEOR DO ART. 333, I, DO CPC/1973. DÉBITO QUE, INCLUSIVE, FOI ADIMPLIDO POSTERIORMENTE EM EXECUÇÃO. PROTESTO REALIZADO EM EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. AUSÊNCIA...

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