Acórdão Nº 5000616-61.2020.8.24.0092 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 15-06-2021

Número do processo5000616-61.2020.8.24.0092
Data15 Junho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000616-61.2020.8.24.0092/SC



RELATOR: Desembargador ALTAMIRO DE OLIVEIRA


APELANTE: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU) APELADO: RICARDINA CORREIA DOS SANTOS (AUTOR)


RELATÓRIO


Ricardina Correia dos Santos propôs ação declaratória de nulidade contratual e inexistência de relação jurídica cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais em face de Banco Bradesco S.A., na qual requereu a declaração de nulidade da contratação pactuada mediante reserva de margem consignável (RMC), bem como a restituição dos descontos realizados e a condenação da instituição financeira ré ao pagamento de compensação por danos morais.
Deferido o benefício da justiça gratuita à autora (evento 4) e efetuada a emenda da inicial (evento 7), o Juízo a quo prolatou decisão interlocutória (evento 9), na qual deferiu a antecipação dos efeitos da tutela e determinou a inversão do ônus da prova e a exibição do contrato objeto do feito e das faturas de cartão de crédito.
Após contestação (evento 17) e réplica (evento 22), o Magistrado de primeiro grau proferiu sentença (evento 27), na qual aplicou a presunção de veracidade decorrente do não cumprimento da ordem de exibição e, com isso, considerou ilegal o negócio jurídico. À luz desses fundamentos, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para anular o contrato de cartão de crédito, determinou a restituição de valores na forma simples e condenou a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00, bem como das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixou em 10% sobre o valor da condenação.
O réu interpôs recurso de apelação (evento 35). Arguiu, preliminarmente, cerceamento de defesa, à míngua de apreciação do pedido de dilação do prazo para exibição documental, e requereu a apreciação das faturas de cartão de crédito instruídas no procedimento recursal. No mérito, postulou a reforma da sentença com base na legalidade do contrato e ciência da apelada quanto à espécie negocial; ausência de valores passíveis de restituição; e não configuração de dano moral. Alternativamente, postulou a redução do quantum compensatório.
Em contrarrazões (evento 43), a apelada impugnou as teses deduzidas nas razões recursais.
É o relato

VOTO


Trata-se de recurso de apelação cível interposto pelo Banco Bradesco S.A. contra a sentença que, na ação declaratória de nulidade contratual e inexistência de relação jurídica cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais proposta por Ricardina Correia dos Santos, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais e, com isso, anulou contrato, determinou a restituição de valores na forma simples, autorizada a compensação, e condenou o réu ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00, bem como das custas processuais e honorários advocatícios.
Inicialmente, o apelante arguiu a preliminar de cerceamento de defesa, ante a aplicação da presunção de veracidade derivada do não cumprimento da ordem de exibição. Alegou que não houve prévia apreciação do pedido formulado na contestação para dilação do prazo à instrução do processo com os documentos indicado, e atribuiu à sentença insuficiência da fundamentação neste aspecto. Outrossim, postulou a admissão das faturas de cartão de crédito, apresentadas em conjunto com a interposição do recurso de apelação, para a apreciação do mérito da causa.
Ao analisar o processo, observa-se que, ao receber a inicial, em 11-3-2020, o Magistrado singular prolatou decisão interlocutória (evento 9) em que determinou:
[...] a inversão do ônus da prova, devendo a instituição financeira acostar aos autos, no prazo da contestação, o contrato havido entre as partes que gerou o desconto atualmente existente em seu benefício previdenciário, bem como as faturas do cartão de crédito de todo o período da relação contratual, sob pena de aplicação da sanção prevista no artigo 400 do Código de Processo Civil.
E, efetuada a citação, em 15-4-2020 (evento 15), o réu apresentou contestação (evento 17), em 18-5-2020, na qual requereu:
[...] a concessão de prazo de 15 (quinze) dias para apresentação dos documentos oriundos da contratação ou ainda a respectiva justificativa de sua não localização, sendo este o único tempo hábil, já que este encontra-se microfilmado na matriz do banco, em Osasco - SP, que atende às solicitações de todo território nacional.
Com a réplica (evento 22), o Togado de primeiro grau proferiu sentença (evento 27), subscrita em 13-7-2020, e se manifestou a respeito da não exibição e da possibilidade de prorrogação do prazo:
Antes de adentrar a quaestio em si, importante mencionar que, conquanto intimada para instruir os autos com o contrato firmado pelas partes, objeto da presente demanda, a instituição financeira deixou de cumprir a determinação judicial. Como depreende-se da leitura da peça inicial, o autor indicou a existência de um contrato averbado no seu benefício previdenciário (evento 1, extrato 6).
Contudo, na petição contestatória, apesar de indicar a existência de pactuação e de autorização expressa do autor quanto ao desconto a título de RMC, o banco réu deixou de apresentar o contrato indicado na exordial.
As instituições bancárias, como parte mais forte da relação de consumo, têm obrigação de apresentar, sempre que solicitadas, todas as informações relativas aos documentos ou contratos firmados com seus clientes, por ser direito básico do consumidor. O não cumprimento da obrigação dá ensejo à aplicação da penalidade disposta no art. 400, inciso I, do Código de Processo Civil.
Nesse sentido, o Tribunal de Justiça deste Estado já se posicionou:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO. DECISÃO AGRAVADA QUE DETERMINOU A JUNTADA DOS CONTRATOS PACTUADOS ENTRE AS PARTES E DOCUMENTOS RELACIONADOS, NO PRAZO DE 20 DIAS, SOB AS PENAS DO ART. 359 DO CPC. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ALEGAÇÃO DE INAPLICABILIDADE DA PRESUNÇÃO PREVISTA NO ART. 359 DO CPC. DISPOSITIVO QUE NÃO É APLICÁVEL NO CASO DE AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO. CASO CONCRETO EM QUE SE TRATA DE EXIBIÇÃO INCIDENTAL DE DOCUMENTOS, CUJA CONSEQUÊNCIA LEGAL PELO SEU DESCUMPRIMENTO É JUSTAMENTE A PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DOS FATOS QUE SE PRETENDIA PROVAR POR MEIO DELES (ART. 359, CPC). TESE RECHAÇADA. PRETENSÃO DE DILAÇÃO DO PRAZO. DESCABIMENTO. PRAZO QUE SE MOSTRA RAZOÁVEL E SUFICIENTE PARA QUE A PARTE, IMPORTANTE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, COM GRANDE ESTRUTURA TÉCNICA, POSSA CUMPRIR A ORDEM. EXIBIÇÃO, ADEMAIS, QUE JÁ HAVIA SIDO DETERMINADA EM DECISÃO ANTERIOR. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1
Na hipótese, determinara-se a exibição do contrato objeto da lide, mediante decisão que inverteu o ônus probatório e exarou ordem de exibição específica com advertência expressa quanto à possibilidade de aplicação da penalidade comentada.
Todavia, na oferta da contestação, a respectiva petição não restou acompanhada do contrato.
Consabido, ainda, que "incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações" (art. 434, CPC). Assim, não há que se falar em concessão de novo prazo para que a parte ré traga aos autos documentos que estão em sua posse.
Portanto, vez que a instituição financeira falhou em instruir o feito com os documentos requisitados no prazo que lhe foi concedido, sem apresentar justificativa razoável, imperiosa a aplicação da pena prevista no inciso I do art. 400 do Código de Processo Civil, acarretando a incidência da presunção da veracidade dos fatos que por meio deste a parte autora pretendia provar.
À luz desse panorama, observa-se que, embora de forma concisa, houve fundamentação clara sobre as razões de convencimento do Magistrado singular para admitir a aplicação da consequência prevista no artigo 400 do Código de Processo Civil, afastada a possibilidade de concessão de novo prazo para a exibição dos documentos concernentes à relação negocial.
A propósito, explicam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero que:
O Código de Processo Civil permite ao juiz prolatar sentenças terminativas (que extinguem o processo sem resolução de mérito, art. 459, caput, in fine, CPC) e decisões interlocutórias fundamentando-as de maneira concisa. Com a alusão ao modo conciso, nosso legislador permite que as decisões que podem ser facilmente explicadas possam ser objetivas e brevemente fundamentadas. Como é óbvio fundamentação concisa não significa fundamentação defeituosa (Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 196-197).
Do mesmo modo, não se vislumbra o elemento surpresa atribuído ao julgado, pois a decisão interlocutória que inverteu o ônus da prova e determinou a exibição do contrato e das faturas de cartão de crédito contém menção expressa a respeito dos efeitos decorrentes da não observância à ordem judicial. Logo, o réu estava ciente de o decurso do prazo estabelecido importaria em presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial.
Nessa toada, ao não instruir a contestação com a documentação indicada, sob justificativa genérica e desprovida de comprovação acerca da insuficiência do tempo fixado a este fim, assumiu o risco da concretização de julgamento desfavorável, independentemente de dilação.
Necessário salientar, outrossim, que, entre o pedido de dilação do prazo e a prolação de sentença, decorreram dois meses, lapso temporal deveras superior ao de quinze dias postulado na peça de defesa, durante o qual a instituição financeira poderia ter providenciado os documentos necessários à instrução do processo.
Portanto, os argumentos aventados nas razões recursais, quanto à nulidade da sentença por cerceamento de defesa, não comportam acolhimento. No mesmo sentido, destacam-se julgados desta Câmara, mutatis mutandis:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - INDEFERIMENTO...

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