Acórdão Nº 5000629-32.2019.8.24.0242 do Quinta Câmara Criminal, 30-03-2023

Número do processo5000629-32.2019.8.24.0242
Data30 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5000629-32.2019.8.24.0242/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER


APELANTE: TEREZINHA DE FATIMA CAPELARI (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da Unidade de Divisão Judiciária da comarca de Ipumirim ofereceu denúncia em face de Terezinha de Fátima Capelari, dando-a como incursa nas sanções do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, por doze vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados:
A denunciada Terezinha de Fátima Capelari, ao tempo dos procederes narrados nesta, tratava-se de titular e única administradora da empresa Artefatos de Cimento Alberton EIRELI - ME, inscrita no CNPJ sob o n. 10.590.674/0001-47, estabelecida na Rua 7 de setembro, n° 67, Centro, Município de Lindóia do Sul-SC (Cláusula Quinta da 5ª Alteração do Contrato Social - fl. 10 do procedimento anexo).O objeto social da empresa consiste na "Fabricação de estruturas pré-moldadas de concreto armado, comércio varejista de material de construção e construtora' (Cláusula Segunda da 5ª Alteração do Contrato Social - fl. 10).Com a gestão da empresa citada, a denunciada tinha ciência e controle das transações e negócios realizados, bem como responsabilidade pela apuração e recolhimento do ICMS-Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços devido, sendo, ainda, como titular e única administradora, a principal beneficiária dos lucros e quaisquer vantagens advindas da atividade empresarial.Nessa condição, descumprindo seu dever de praticar os atos determinados em Lei e, também, de fiscalizar e impedir atos de infringência à Lei, deixou de recolher no prazo legal (10° dia do mês seguinte ao mês de apuração, conforme artigo 60 do Regulamento do ICMS/SC, aprovado pelo Decreto n° 2.870/2001) o ICMS referente aos meses de janeiro a dezembro de 2018, apropriando-se indevidamente, dessa forma, de valores que deveriam ser entregues ao Estado de Santa Catarina, destinatário final do tributo. Por efeito, foi lavrado em face da empresa supracitada o Termo de Inscrição em Dívida Ativa-TIDA n° 19045246026 (R$ 322.511,29) (fls. 3/4) datado de 22-7-2019, com a apuração do imposto devido, multa fiscal e juros de mora, montante este que até a presente data não foi pago na integralidade ao Fisco.As apropriações indevidas de imposto realizadas pela denunciada são ilustradas na tabela abaixo, tomando por parâmetro os periodos de apuração e as datas limites para repasse ao Fisco:





A constituição do crédito tributário teve por base as Declarações de ICMS e do Movimento Econômico -- DIMEs -- fornecidas ao Estado por atos de gestão da denunciada, conforme fls. 13/38 (Súmula 436 do STJ¹).O Termo de Inscrição em Dívida Ativa - TIDA objeto desta indica, pelo ICMS declarado pela denunciada, a apropriação do total de R$ 255.538,51 (duzentos e cinquenta e cinco mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinquenta e um centavos) do tributo que deveria ser recolhido aos cofres públicos no período acima mencionado, isso em valor histórico, o qual importava, com os acréscimos legais decorrentes de correção monetária, multa fiscal e juros, ao tempo daquele, R$ 322.511,29 (trezentos e vinte e dois mil, quinhentos e onze reais e vinte e nove centavos).Conforme consulta realizada no SAT - Sistema de Administração Tributária da Secretaria de Estado da Fazenda em 26-11-2019, o montante da dívida era de R$ 327.647,61 (trezentos e vinte e sete mil, seiscentos e quarenta e sete reais e sessenta e um centavos) (fl. 46) (sic, fls. 1-3 do evento 1.1 da ação penal).
Encerrada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial acusatória para condená-la às penas de dez meses de detenção, a ser resgatada em regime inicialmente aberto, porém substituída por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, e pagamento de dezesseis dias-multa, individualmente arbitrados à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao preceito do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, por doze vezes, na forma do art. 71, caput, do Estatuto Repressivo.
Inconformada, interpôs a ré recurso de apelação, postulando, prefacialmente, a declaração da inépcia da denúncia ante a não observância das formalidades previstas no art. 41 da Lei Adjetiva Penal, pois narrou genericamente os fatos que lhe foram atribuídos.
No mérito, clama pela absolvição, alegando para tanto que não há nos autos provas de autoria com a robustez necessária para embasar o édito condenatório, devendo incidir o princípio do in dubio pro reo na espécie. Argui, ainda, a atipicidade das condutas por ausência de materialidade delitiva, dolo de apropriação e contumácia no agir. Sustenta também a ocorrência de erro de tipo, sob o argumento de que "a operação feita pela empresa era de prestação de serviços e não de circulação de mercadorias" (sic, fls. 24 do evento 16), bem assim que não houve lesão ao bem jurídico tutelado pela norma em questão.
Subsidiariamente, pleiteia, de forma genérica, a fixação da reprimenda no mínimo legal.
Em suas contrarrazões, a Promotora de Justiça oficiante pugna pela preservação da decisão vergastada.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Humberto Francisco Scharf Vieira, opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.
É o relatório

VOTO


Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, conhece-se da irresignação e passa-se à análise do seu objeto.
Consoante relatado, em sede preliminar, objetiva a acusada a declaração da inépcia da denúncia, tendo em vista que não teria observado as formalidades previstas no art. 41 do Código de Processo Penal, especialmente porque narrou de forma genérica os fatos, sem descrever de maneira pormenorizada o proceder a si imputado, situação que prejudicou sobremaneira o pleno exercício de sua defesa.
Cumpre mencionar que no exame da validade da exordial acusatória deve-se recorrer às previsões constantes do aludido dispositivo, cujo fundamento é assegurar ao demandado o direito constitucional da ampla defesa, o qual assim dispõe:
Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
Na situação ora examinada, da leitura da peça preambular retratada no relatório do presente acórdão observa-se a menção das elementares do tipo penal e a descrição minuciosa das condutas que foram irrogadas à denunciada, bem assim o seu agir com a adequada classificação do injusto, de forma a permitir-lhe, sem entraves, o exercício do direito à ampla defesa.
Outrossim, conforme solidificada compreensão do Superior Tribunal de Justiça, com a superveniência de sentença condenatória resta preclusa a alegação de inépcia da exordial acusatória. Nesse sentido:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO, ROUBO MAJORADO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. SENTENÇA CONDENATÓRIA CONFIRMADA PELO TRIBUNAL ESTADUAL. TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. PRECLUSÃO [...]2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que, após a prolação da sentença condenatória, torna-se preclusa a alegação de inépcia da denúncia. Isso porque "a prolação de sentença condenatória esvai a análise do pretendido reconhecimento de inépcia da denúncia. Isso porque, se, após toda a análise do conjunto fático-probatório amealhado aos autos ao longo da instrução criminal, já houve um pronunciamento sobre o próprio mérito da persecução penal (denotando, ipso facto, a plena aptidão da inicial acusatória), não há mais sentido em se analisar eventual inépcia da denúncia." (STJ, REsp 1.370.568/DF, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/5/2017, DJe 30/5/2017).[...]18. Habeas corpus não conhecido (HC 283.746/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 22-5-2018).
Ademais, é bastante a descrição da condição de administradora da recorrente durante o período da veiculada sonegação fiscal, uma vez que em tese detinha conhecimento sobre a gestão administrativo-tributária da empresa.
Nessa senda, prescreve o art. 11 da Lei 8.137/1990: "Quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os crimes definidos nesta lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade".
Sobre o assunto, extrai-se da doutrina o ensinamento de Pedro Roberto Decomain:
Usualmente, o sujeito ativo do crime de sonegação será o sujeito passivo da obrigação tributária, isto é, o contribuinte ou o responsável pelo pagamento do tributo, nos termos da lei tributária, ou algum administrador, a qualquer título, da pessoa jurídica que seja contribuinte do tributo ou por ele responsável (Crimes contra a ordem tributária. 5. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 136).
Igualmente, pontuam Rui Stoco e Tatiana de Oliveira Stoco:
Se o crime for praticado visando reduzir ou suprimir tributo em favor de sociedade comercial, instituições financeiras ou empresa de qualquer natureza, serão pessoalmente responsáveis os diretores, administradores, gerentes ou funcionários responsáveis (Crimes contra a ordem tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 85).
Em conjuntura semelhante, este Sodalício decidiu:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. FALTA DE RECOLHIMENTO DE ICMS EM CONTINUIDADE DELITIVA (LEI 8.137/90, ART. 2º, II, C/C O ART. 71, CAPUT, CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO.ALEGADA INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. CONDUTA DELITUOSA DESCRITA COM CLAREZA NA DENÚNCIA E LASTREADA NA APURAÇÃO...

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