Acórdão Nº 5000690-49.2021.8.24.0038 do Primeira Câmara Criminal, 22-09-2022
Número do processo | 5000690-49.2021.8.24.0038 |
Data | 22 Setembro 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Primeira Câmara Criminal |
Classe processual | Apelação Criminal |
Tipo de documento | Acórdão |
Apelação Criminal Nº 5000690-49.2021.8.24.0038/SC
RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI
APELANTE: CATIA ADRIANE MUELLER (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)
RELATÓRIO
Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia perante o juízo da comarca de JOINVILLE em face de Cátia Adriane Mueller, dando-a como incursa nas sanções do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, por vinte e três vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:
A denunciada, na condição de sócia-administradora de 'BOVARY SNOOKER PUB LTDA. ME.', CNPJ n. 07.805.080/0001-00 e Inscrição Estadual n. 25.624.602-5, estabelecida na Rua Visconde de Taunay, n. 166, Centro, em Joinville, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 21.448,89 (vinte e um mil quatrocentos e quarenta e oito reais e oitenta e nove centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação por meio do PGDAS-D (Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional - Declaratório) quanto aos meses de maio e outubro de 2013, março, maio e agosto de 2014, maio e agosto de 2015, maio, junho, agosto e dezembro de 2016 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2017, documentos geradores da Dívida Ativa n. 19046434829, inscrita em 05/08/2019.
É de se registrar que os débitos referentes aos meses de maio e outubro de 2013 e março, maio e agosto de 2014 foram alvos do Parcelamento n. 001 (extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional até 27/10/2015. Ainda, os débitos referentes aos meses de maio e outubro de 2013, março, maio e agosto de 2014 e maio e agosto de 2015 foram objetos do Parcelamento n. 002 (extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 27/10/2015 a 25/10/2016. Por fim, os débitos referentes aos meses de maio e outubro de 2013, março, maio e agosto de 2014, maio e agosto de 2015 e maio, junho e agosto de 2016 foram sujeitos ao Parcelamento n. 003 (extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 25/10/2016 a 19/06/2017, tudo conforme preceitua o §2º do art. 83 da Lei n. 9.430/96, com nova redação dada pelo art. 6º da Lei n. 12.382/11 (evento 1/PG - em 12-1-2021).
Suspensão do processo: no evento 31/PG, aceita a proposta pela denunciada, foi determinada a suspensão condicional do processo do feito (art. 89 da Lei 9.099/1995), o que perdurou de 29-9-2021 a 6-6-2022, ocasião em que o benefício foi revogado ante o descumprimento das condições previamente estabelecidas (evento 59/PG).
Sentença: o juiz de direito Felippi Ambrósio julgou procedente a denúncia para condenar Catia Adriane Mueller ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime aberto, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal (art. 49, § 1º do CP), por infração ao art. 2º, II da Lei 8137/90, por 23 vezes, na forma do art. 71, caput, do CP, substituída a reprimenda corporal por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, concedendo-lhe o direito de recorrer em liberdade (evento 86/PG - em 26-7-2022).
Trânsito em julgado: foi certificado o trânsito em julgado da sentença para o Ministério Público, ocorrido em 27-7-2022 (evento 91/PG - em 3-8-2022).
Recurso de apelação de Catia Adriane Mueller: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:
a) a conduta da apelante é atípica, pois não houve sonegação de tributos, tendo em vista que o débito foi declarado ao fisco;
b) a criminalização do mero inadimplemento fiscal é inconstitucional e afronta o princípio da não prisão por dívida;
c) a apelante não atuava na administração da empresa Bovary na época dos fatos, pois era sócia minoritária com apenas 1% do capital social;
d) o inadimplemento se deu por estado de necessidade, considerando que a empresa teve dificuldades financeiras no período apurado, de modo que a culpabilidade deve ser afastada;
e) a apelante deve ser absolvida, pois não agiu com dolo específico de se apropriar dos valores não recolhidos ao fisco;
f) as circunstâncias judiciais favoráveis do art. 59 do Código Penal autorizam a fixação da pena no mínimo legal, além de inexistir causas de aumento de pena;
g) a apelante faz jus à suspensão condicional da pena prevista no art. 77 do CP.
Requereu o conhecimento e o provimento do recurso para reformar a sentença, nos termos da fundamentação, sem prejuízo do prequestionamento das matérias previstas no art. 5º, LXVII, da CF, no art. 381 do CPP e no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 (evento 94/PG - em 11-8-2022).
Contrarrazões Do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:
a) autoria delitiva está suficientemente demonstrada, pois a apelante era, à época dos fatos, sócia-administradora da empresa denominada 'BOVARY SNOOKER PUB LTDA. ME';
b) a tese de atipicidade da conduta deve ser afastada, pois ao responsável tributário cabe apenas o repasse dos valores recolhidos dos contribuintes quando da aquisição dos produtos;
c) a constitucionalidade da criminalização da conduta praticada pela apelante já foi assentada pelo Supremo Tribunal Federal, com o julgamento do RHC 163.334;
d) o dolo de apropriação é evidente, na medida em que a recorrente voluntariamente se omitiu em recolher tempestivamente os tributos correspondentes aos períodos de apuração mencionados, declarados pela empresa sob sua gestão, assim agindo com finalidade de apropriação;
e) a omissão da insurgente em procurar corrigir o prejuízo causado ao erário, por si só, demonstra evidente intenção, consciente e deliberada, de ganho ilícito;
f) não há nada nos autos que comprove a alegada dificuldade financeira que a impediu de repassar ao erário o valor que cobrou de seus clientes a título de ICMS;
g) não há reparos a serem efetuados na dosimetria da pena;
h) a substituição da pena corporal por restritivas de direito obsta a suspensão condicional da pena, conforme inciso III do art. 77 do CP.
Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença (evento 100/PG - em 16-8-2022).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Rogério A. da Luz Bertoncini opinou pelo conhecimento parcial e desprovimento do recurso (evento 8/SG - em 22-8-2022).
VOTO
Trata-se de apelação criminal interposta por Cátia Adriane Mueller contra a sentença que a condenou à pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, por infração ao art. 2º, II da Lei nº 8137/90, por vinte e três vezes, na forma do art. 71, caput, do CP.
Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche parcialmente os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido em parte.
Isso porque falta interesse recursal à apelante no tocante à fixação da pena no mínimo legal, já que o aumento operado na sentença não guardou relação com as circunstâncias do art. 59, do Código Penal, mas com a continuidade delitiva.
Nota-se que a pena-base foi fixada no mínimo legal de 6 (seis) meses, vindo a incidir o aumento de 2/3 (dois terços) apenas na terceira fase dosimétrica, em atenção ao disposto no art. 71, caput, do CP.
Desse modo, não se conhece do recurso no ponto.
Do mérito
Adianta-se que a defesa não logrou derruir os elementos amealhados pela acusação que serviram de base para a formação da convicção do Juízo "a quo" acerca da presença da materialidade e da autoria delitivas, bem como da tipicidade da conduta, culminando na prolação do édito condenatório.
Cumpre pontuar que o art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 não padece de inconstitucionalidade em virtude do disposto no art. 5º, LXVII, da Constituição Federal, que veda a prisão civil por dívida.
A lição do emérito jurista Andreas Eisele é clara e demonstra a impropriedade da tese:
A prisão é uma modalidade de sanção e, como tal, configura em consequência jurídica da ocorrência do fato ilícito.Portanto, não é classificada em face de sua configuração própria, pois é um instrumento acessório que visa conferir efetividade a uma norma (principal).Como consequência dessa relação de acessoriedade, a natureza da sanção é dependente (e decorrente) da natureza da norma em face da qual é cominada.Ou seja, a sanção cominada em relação a uma norma civil possui natureza civil, o mesmo ocorrendo no âmbito penal.Tal ocorre porque, conforme afirma Bustos Ramírez, "a sanção não aparece como definidora da norma nem sequer, das demais regras jurídicas: o caráter e a natureza destas não estão dados pela pena".Por este motivo, Decomain afirma que "não se trata de prisão civil por dívida, mas sim da criminalização do não pagamento de uma".A distinção é relevante, pois as finalidades das sanções civil e penais são diversas, eis que, enquanto a primeira é um instrumento coercitivo de imposição do cumprimento de uma prestação (cobrança), a segunda busca efeitos preventivos e retributivos.Álvaro Villaça alude à diferença, ao afirmar que a prisão civil "é a que se realiza no âmbito, estritamente, do Direito Privado (...), não importando, pois em condenação criminal, uma vez que é tão-somente meio legal compulsório de obter o cumprimento de determinado dever. (...) A prisão penal, portanto, decorre da aplicação de pena criminal. (...) A prisão civil, ao contrário, não apresenta o caráter de pena, mas de meio coercitivo, imposto ao cumprimento de determinada obrigação."O mesmo entendimento expressa Pinto Ferreira, quando esclarece que "a locução constitucional prisão civil distingue-se da prisão penal, devem ser...
RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI
APELANTE: CATIA ADRIANE MUELLER (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)
RELATÓRIO
Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia perante o juízo da comarca de JOINVILLE em face de Cátia Adriane Mueller, dando-a como incursa nas sanções do art. 2º, II, da Lei 8.137/1990, por vinte e três vezes, na forma do art. 71, caput, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:
A denunciada, na condição de sócia-administradora de 'BOVARY SNOOKER PUB LTDA. ME.', CNPJ n. 07.805.080/0001-00 e Inscrição Estadual n. 25.624.602-5, estabelecida na Rua Visconde de Taunay, n. 166, Centro, em Joinville, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 21.448,89 (vinte e um mil quatrocentos e quarenta e oito reais e oitenta e nove centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação por meio do PGDAS-D (Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional - Declaratório) quanto aos meses de maio e outubro de 2013, março, maio e agosto de 2014, maio e agosto de 2015, maio, junho, agosto e dezembro de 2016 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2017, documentos geradores da Dívida Ativa n. 19046434829, inscrita em 05/08/2019.
É de se registrar que os débitos referentes aos meses de maio e outubro de 2013 e março, maio e agosto de 2014 foram alvos do Parcelamento n. 001 (extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional até 27/10/2015. Ainda, os débitos referentes aos meses de maio e outubro de 2013, março, maio e agosto de 2014 e maio e agosto de 2015 foram objetos do Parcelamento n. 002 (extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 27/10/2015 a 25/10/2016. Por fim, os débitos referentes aos meses de maio e outubro de 2013, março, maio e agosto de 2014, maio e agosto de 2015 e maio, junho e agosto de 2016 foram sujeitos ao Parcelamento n. 003 (extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 25/10/2016 a 19/06/2017, tudo conforme preceitua o §2º do art. 83 da Lei n. 9.430/96, com nova redação dada pelo art. 6º da Lei n. 12.382/11 (evento 1/PG - em 12-1-2021).
Suspensão do processo: no evento 31/PG, aceita a proposta pela denunciada, foi determinada a suspensão condicional do processo do feito (art. 89 da Lei 9.099/1995), o que perdurou de 29-9-2021 a 6-6-2022, ocasião em que o benefício foi revogado ante o descumprimento das condições previamente estabelecidas (evento 59/PG).
Sentença: o juiz de direito Felippi Ambrósio julgou procedente a denúncia para condenar Catia Adriane Mueller ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime aberto, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal (art. 49, § 1º do CP), por infração ao art. 2º, II da Lei 8137/90, por 23 vezes, na forma do art. 71, caput, do CP, substituída a reprimenda corporal por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, concedendo-lhe o direito de recorrer em liberdade (evento 86/PG - em 26-7-2022).
Trânsito em julgado: foi certificado o trânsito em julgado da sentença para o Ministério Público, ocorrido em 27-7-2022 (evento 91/PG - em 3-8-2022).
Recurso de apelação de Catia Adriane Mueller: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:
a) a conduta da apelante é atípica, pois não houve sonegação de tributos, tendo em vista que o débito foi declarado ao fisco;
b) a criminalização do mero inadimplemento fiscal é inconstitucional e afronta o princípio da não prisão por dívida;
c) a apelante não atuava na administração da empresa Bovary na época dos fatos, pois era sócia minoritária com apenas 1% do capital social;
d) o inadimplemento se deu por estado de necessidade, considerando que a empresa teve dificuldades financeiras no período apurado, de modo que a culpabilidade deve ser afastada;
e) a apelante deve ser absolvida, pois não agiu com dolo específico de se apropriar dos valores não recolhidos ao fisco;
f) as circunstâncias judiciais favoráveis do art. 59 do Código Penal autorizam a fixação da pena no mínimo legal, além de inexistir causas de aumento de pena;
g) a apelante faz jus à suspensão condicional da pena prevista no art. 77 do CP.
Requereu o conhecimento e o provimento do recurso para reformar a sentença, nos termos da fundamentação, sem prejuízo do prequestionamento das matérias previstas no art. 5º, LXVII, da CF, no art. 381 do CPP e no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 (evento 94/PG - em 11-8-2022).
Contrarrazões Do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:
a) autoria delitiva está suficientemente demonstrada, pois a apelante era, à época dos fatos, sócia-administradora da empresa denominada 'BOVARY SNOOKER PUB LTDA. ME';
b) a tese de atipicidade da conduta deve ser afastada, pois ao responsável tributário cabe apenas o repasse dos valores recolhidos dos contribuintes quando da aquisição dos produtos;
c) a constitucionalidade da criminalização da conduta praticada pela apelante já foi assentada pelo Supremo Tribunal Federal, com o julgamento do RHC 163.334;
d) o dolo de apropriação é evidente, na medida em que a recorrente voluntariamente se omitiu em recolher tempestivamente os tributos correspondentes aos períodos de apuração mencionados, declarados pela empresa sob sua gestão, assim agindo com finalidade de apropriação;
e) a omissão da insurgente em procurar corrigir o prejuízo causado ao erário, por si só, demonstra evidente intenção, consciente e deliberada, de ganho ilícito;
f) não há nada nos autos que comprove a alegada dificuldade financeira que a impediu de repassar ao erário o valor que cobrou de seus clientes a título de ICMS;
g) não há reparos a serem efetuados na dosimetria da pena;
h) a substituição da pena corporal por restritivas de direito obsta a suspensão condicional da pena, conforme inciso III do art. 77 do CP.
Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença (evento 100/PG - em 16-8-2022).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Rogério A. da Luz Bertoncini opinou pelo conhecimento parcial e desprovimento do recurso (evento 8/SG - em 22-8-2022).
VOTO
Trata-se de apelação criminal interposta por Cátia Adriane Mueller contra a sentença que a condenou à pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, por infração ao art. 2º, II da Lei nº 8137/90, por vinte e três vezes, na forma do art. 71, caput, do CP.
Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche parcialmente os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido em parte.
Isso porque falta interesse recursal à apelante no tocante à fixação da pena no mínimo legal, já que o aumento operado na sentença não guardou relação com as circunstâncias do art. 59, do Código Penal, mas com a continuidade delitiva.
Nota-se que a pena-base foi fixada no mínimo legal de 6 (seis) meses, vindo a incidir o aumento de 2/3 (dois terços) apenas na terceira fase dosimétrica, em atenção ao disposto no art. 71, caput, do CP.
Desse modo, não se conhece do recurso no ponto.
Do mérito
Adianta-se que a defesa não logrou derruir os elementos amealhados pela acusação que serviram de base para a formação da convicção do Juízo "a quo" acerca da presença da materialidade e da autoria delitivas, bem como da tipicidade da conduta, culminando na prolação do édito condenatório.
Cumpre pontuar que o art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 não padece de inconstitucionalidade em virtude do disposto no art. 5º, LXVII, da Constituição Federal, que veda a prisão civil por dívida.
A lição do emérito jurista Andreas Eisele é clara e demonstra a impropriedade da tese:
A prisão é uma modalidade de sanção e, como tal, configura em consequência jurídica da ocorrência do fato ilícito.Portanto, não é classificada em face de sua configuração própria, pois é um instrumento acessório que visa conferir efetividade a uma norma (principal).Como consequência dessa relação de acessoriedade, a natureza da sanção é dependente (e decorrente) da natureza da norma em face da qual é cominada.Ou seja, a sanção cominada em relação a uma norma civil possui natureza civil, o mesmo ocorrendo no âmbito penal.Tal ocorre porque, conforme afirma Bustos Ramírez, "a sanção não aparece como definidora da norma nem sequer, das demais regras jurídicas: o caráter e a natureza destas não estão dados pela pena".Por este motivo, Decomain afirma que "não se trata de prisão civil por dívida, mas sim da criminalização do não pagamento de uma".A distinção é relevante, pois as finalidades das sanções civil e penais são diversas, eis que, enquanto a primeira é um instrumento coercitivo de imposição do cumprimento de uma prestação (cobrança), a segunda busca efeitos preventivos e retributivos.Álvaro Villaça alude à diferença, ao afirmar que a prisão civil "é a que se realiza no âmbito, estritamente, do Direito Privado (...), não importando, pois em condenação criminal, uma vez que é tão-somente meio legal compulsório de obter o cumprimento de determinado dever. (...) A prisão penal, portanto, decorre da aplicação de pena criminal. (...) A prisão civil, ao contrário, não apresenta o caráter de pena, mas de meio coercitivo, imposto ao cumprimento de determinada obrigação."O mesmo entendimento expressa Pinto Ferreira, quando esclarece que "a locução constitucional prisão civil distingue-se da prisão penal, devem ser...
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