Acórdão Nº 5000724-57.2022.8.24.0242 do Primeira Câmara de Direito Público, 20-06-2023

Número do processo5000724-57.2022.8.24.0242
Data20 Junho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000724-57.2022.8.24.0242/SC

RELATOR: Desembargador PAULO HENRIQUE MORITZ MARTINS DA SILVA

APELANTE: MUNICÍPIO DE IPUMIRIM/SC (RÉU) APELADO: PEGORARO EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS, AGROPECUARIA E FLORESTAL LTDA (AUTOR)

RELATÓRIO

Pegoraro Empreendimentos Imobiliários, Agropecuária e Florestal Ltda. propôs "ação regressiva de cobrança" em face do Município de Ipumirim.

Sustentou que: 1) empreendeu loteamento denominado Sintrial III; 2) em 2012, foi ajuizada ação indenizatória contra si, Imobiliária Estrela Ltda. e Município de Ipumirim em razão da irregularidade do empreendimento (autos n. 001100-80.2012.8.24.0242; 3) os pedidos foram julgados procedentes e foram condenados solidariamente ao pagamento de indenização por dano moral e material; 4) por conta do título executivo respondeu a dois pedidos de cumprimento de sentença; 5) optou por satisfazer voluntariamente a obrigação, adimplindo o valor de R$ 166.886,81 e 6) em razão do pagamento total do débito, sub-rogou-se nos direitos dos credores em relação aos demais coobrigados.

Postulou o pagamento de R$ 55.628,94.

Em contestação, o ente público argumentou que: 1) a dívida solidária interessa somente ao autor, pois é obrigação do loteador regularizar o loteamento e arcar com os danos da atividade, até mesmo porque é o único beneficiado pela instalação do condomínio e 2) a obrigação é solidária mas de execução subsidiária (autos originários, Evento 18).

Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:

[...] Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR o réu MUNICÍPIO DE IPUMIRIM/SC a pagar ao autor PEGORARO EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS, AGROPECUARIA E FLORESTAL LTDA o valor de R$ 55.628,94.

Quanto aos consectários legais, deverão incidir desde a data de desembolso, haja vista tratar-se de dívida líquida. Até 8-12-2021, deverá incidir correção monetária pelo IPCA-E e juros conforme o índice da caderneta de poupança (tema n. 810, do STF). Após, haverá incidência unicamente da SELIC a título de juros de mora e correção monetária (EC 113/2021).

O réu é isento de custas (art. 7º, I, da Lei Estadual n. 17.654/2018).

Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% do valor da condenação (art. 85, § 2º, do CPC). [...] (autos originários, Evento 18)

O Município réu, em apelação, reiterou os argumentos já apresentados (autos originários, Evento 24).

Contrarrazões no Evento 29 dos autos originários.

VOTO

1. Mérito

Amelio Roque Neis, Valesca Neis, Arildo Mosconi e Irene Sienbeneichlep Mosconi ajuizaram ação indenizatória em face do Município de Ipumirim, Imobiliária Estrela Ltda. e Pegoraro Empreendimentos Imobiliários, Agropecuária e Florestal Ltda.

Os réus foram condenados solidariamente ao pagamento de indenização por dano moral de R$ 15.000,00 e material a ser apurado em liquidação, em razão de avarias provocadas pela realização de loteamento de propriedade de Pegoraro Empreendimentos Imobiliários.

O loteador pagou a integralidade do débito e, por meio desta ação, pretende o direito de regresso contra o Poder Público e a co-ré.

A controvérsia reside em definir se o Município está obrigado a ressarcir ao autor a sua quota-parte da dívida.

Dispõe o Código Civil:

Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.

[...]

Art. 283. O devedor que satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos co-devedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do insolvente, se o houver, presumindo-se iguais, no débito, as partes de todos os co-devedores.

Como se vê, em regra, se um dos coobrigados solidários solver o compromisso, espontânea ou compulsoriamente, tem o direito de haver de cada um dos consortes a respectiva quota-parte.

Ocorre que o art. 285 do CC estabelece uma exceção:

Se a dívida solidária interessar exclusivamente a um dos devedores, responderá este por toda ela para com aquele que pagar.

Trata-se da hipótese de solidariedade imperfeita, que ocorre quando algum ou alguns devedores solidários têm responsabilidade externa, ficando, por isso, perante os credores, obrigados a pagá-la, mas não têm qualquer responsabilidade no nível das relações internas.

Colho dos ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves:

A presunção de igualdade, no débito, das quotas de todos os coobrigados, é juris tantum, admitindo, portanto, prova em contrário.

Pode, no entanto, haver desigualdade, mesmo que a dívida interesse exclusivamente a um dos devedores, ou seja, que o negócio jurídico que deu origem ao débito só diga respeito a um dos devedores.

A situação delineada, no dispositivo em estudo pode ser representada dessa forma, ad exemplum: "A" tem necessidade de obter um empréstimo para efetuar a colheita em sua propriedade rural. O banco exige a garantia de dois avalistas. O referido mutuário obtém o aval, lançado de favor no título, dos amigos B" e C", que se tornam, assim, devedores solidários, tanto quanto o emitente do título, que pode ser uma nota promissória ou outra espécie de título, perante o estabelecimento de crédito.

Nesse caso, temos o devedor a como embolsador da importância emprestada e único interessado em sua aplicação, e B e C como devedores por aval de favor.

Vencido e não pago o título que representa a dívida, pode o credor cobrá-la integralmente de qualquer devedor solidário, mesmo que não seja o principal interessado, mas apenas avalista ou fiador. Se um destes saldá-la sozinho, terá ação regressiva contra referido emitente, podendo dele cobrar todo o valor pago. [...]

Nas relações externas com o credor, ou seja, perante este, todos os devedores, tanto o interessado como os demais, encontram-se na situação jurídica de devedores solidários. Por essa razão, cada um é obrigado pela dívida inteira, estando todos sujeitos ao regime comum da solidariedade, nos termos do art. 264 do Código Civil.

No tocante às relações internas entre os devedores, o Código disciplina somente as que se formam entre codevedor interessado e os não interessados, submetendo-as, ao declarar ser aquele responsável por toda a dívida para com aquele que pagar, à mesma disciplina da fiança, pois da realidade estes serão tratados como autênticos fiadores.

Se o único interessado paga a dívida inteira, nenhuma ação tem contra os codevedores não interessados, pois nada mais fez do que solver a sua obrigação. Se, no entanto, estes efetuam o pagamento, ficam sub-rogados no direito do credor e têm direito a se ressarcir, nos termos dos arts. 831 a 833 do Código Civil. [...] (Direito Civil Brasileiro, volume 2: teoria geral das obrigações. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, f. 176/177)

Assim, se o devedor solidário, a quem...

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