Acórdão Nº 5000729-54.2021.8.24.0003 do Terceira Câmara de Direito Público, 02-08-2022

Número do processo5000729-54.2021.8.24.0003
Data02 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000729-54.2021.8.24.0003/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: IVANETE LUCIA MAGANHIM (IMPETRANTE) APELADO: PREFEITO - MUNICÍPIO DE ANITA GARIBALDI-SC - ANITA GARIBALDI (IMPETRADO)

RELATÓRIO

Na Comarca de Anita Garibaldi, Ivanete Lúcia Maganhim impetrou mandado de segurança com pedido de liminar contra ato do Prefeito Municipal de Anita Garibaldi, objetivando a concessão da segurança para que seja restabelecido o complemento de proventos de aposentadoria concedido através da Portaria n. 373/2020, que foi cancelado pelo Decreto n. 2.951/2021.

Aduziu que, "ex-servidora pública municipal no cargo efetivo de merendeira, teve seu vínculo empregatício encerrado com o impetrado em 25/07/2019, conforme Portaria n. 481/2019", em face de aposentadoria concedida pelo INSS; que requereu a complementação da aposentadoria, nos termos do art. 209, inciso III, alínea "a", do Estatuto dos Servidores Municipais de Anita Garibaldi/SC (Lei Municipal 1.013/1991), a qual lhe foi concedida através da Portaria n. 373/2020, com data de 14/08/2020; que, contudo, em 30/03/2021, a autoridade impetrada "editou o Decreto n. 2951/2021, no qual, em ato unilateral, suspendeu os pagamentos a titulo de complementação da aposentadoria da impetrante". Disse que se verifica "de pronto a ilegalidade do ato que determinou a suspensão dos pagamentos recebidos a titulo de complementação, uma vez que a eventual revogação, anulação ou suspensão do ato administrativo que concedeu benefícios deve, mediante regular processo administrativo, assegurar o contraditório e a ampla defesa".

Requereu a concessão da medida liminar, a ser confirmada ao final, "para suspender os efeitos do Decreto n. 2951/2021, restabelecendo, imediatamente, o pagamento do complemento salarial concedido através da Portaria n. 373/2020". Requereu a concessão da justiça gratuita.

Foi indeferido o pedido de liminar e deferido o pedido de gratuidade judiciária.

O Município de Anita Garibaldi manifestou-se nos autos, informando que não tem interesse na demanda.

Notificada, a autoridade coatora deixou fluir "in albis" o prazo para prestar informações.

Com vista dos autos, o representante do Ministério Público apresentou manifestação pela denegação da ordem.

Sentenciando, o digno Magistrado julgou improcedente o pedido e denegou a segurança.

Inconformada, a impetrante interpôs recurso de apelação repisando os argumentos despendidos na inicial, e reforçou a necessidade de regular processo administrativo para a suspensão do referido pagamento, o que não foi observado pela autoridade impetrada.

Após o oferecimento das contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pela Exma. Sra. Dra. Eliana Volcato Nunes, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

VOTO

Inicialmente, convém esclarecer que o inciso LXIX do art. 5º da Constituição Federal de 1988, reproduzido em termos pelo art. 1º da Lei Federal n. 1.533, de 31/12/1951 e mais recentemente pelo art. 1º da Lei Federal n. 12.016, de 7/8/2009, efetivamente garante a todos a concessão de "mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".

No entanto, o direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança deve vir comprovado desde logo com a impetração, porquanto nessa via processual não se admite dilação probatória para a sua comprovação.

HELY LOPES MEIRELLES, acerca do que se deve entender por direito líquido e certo, ensina:

"Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

"Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança" (Mandado de Segurança. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 37).

VICENTE GRECO FILHO, acerca da impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança, leciona:

"O pressuposto do mandado de segurança, portanto, é a ausência de dúvida quanto à situação de fato, que deve ser provada documentalmente. Qualquer incerteza sobre os fatos decreta o descabimento da reparação da lesão através do mandado, devendo a parte pleitear seus direitos através de ação que comporte a dilação probatória. Daí dizer-se que o mandado de segurança é um processo sumário documental, isto é, um processo rápido, concentrado, fundado em prova documental. No caso de não ser possível a apreciação do pedido por haver dúvida quanto à matéria de fato, por outro lado, pode o interessado propor a demanda adequada, não ocorrendo contra ele o fenômeno da coisa julgada" (Direito processual civil brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 308).

Então, a via do "writ of mandamus" é destinada à proteção de direito líquido e certo, cuja comprovação dos fatos e situações concretas para exercício do direito é verificada de plano, por prova pré-constituída incontestável, para que não pairem dúvidas ou incertezas sobre esses elementos.

Pois bem.

Há que se negar provimento ao recurso.

Em caso idêntico ao aqui discutido, o eminente Desembargador Hélio do Valle Pereira, em atenção ao entendimento firmado no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) n. 0001986-53.2013.8.24.0013/50001 (Tema 14), julgou improcedente o recurso de apelação interposto contra sentença que denegou a ordem, em mandado de segurança impetrado por outra servidora, em condições idênticas, contra ato do Prefeito Municipal de Anita Garibaldi.

Desta forma, com o intuito de evitar desnecessária tautologia, sobretudo a realidade fática dos autos é idêntica, adotam-se como razões do presente voto os fundamentos consignados na referida decisão, nos seguintes termos:

"1. A Administração goza da prerrogativa de anular seus próprios atos quando ilegais, mas isso não dispensa a instauração de procedimento administrativo que respeite os postulados da ampla de defesa e do contraditório (art. 5°, inc. LV, da CF), tanto menos em hipótese de que decorram efeitos evidentemente desfavoráveis ao destinatário.

"Essa é a orientação do STF firmada no Tema 138, que referenda o que estava na Súmula 473:

"EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. EXERCÍCIO DO PODER DE AUTOTUTELA ESTATAL. REVISÃO DE CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO E DE QUINQUÊNIOS DE SERVIDORA PÚBLICA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.1. Ao Estado é facultada a revogação de atos que repute ilegalmente praticados; porém, se de tais atos já decorreram efeitos concretos, seu desfazimento deve ser precedido de regular processo administrativo.2. Ordem de revisão de...

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