Acórdão Nº 5000736-46.2021.8.24.0003 do Terceira Câmara de Direito Público, 19-07-2022

Número do processo5000736-46.2021.8.24.0003
Data19 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000736-46.2021.8.24.0003/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: CLAUDETE FELTRIN (IMPETRANTE) APELADO: PREFEITO - MUNICÍPIO DE ANITA GARIBALDI-SC - ANITA GARIBALDI (IMPETRADO) APELADO: MUNICÍPIO DE ANITA GARIBALDI-SC (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Na Comarca de Anita Garibaldi, Claudete Feltrin impetrou mandado de segurança com pedido de liminar contra ato do Prefeito Municipal de Anita Garibaldi, objetivando a concessão da segurança para que seja restabelecido o complemento salarial concedido através da Portaria n. 286/2020 e suspenso pelo Decreto n. 2951/2021.

Aduziu que, "ex-servidora pública municipal no cargo efetivo de professora, teve seu vínculo empregatício encerrado com o impetrado em 15/04/2020, conforme Portaria n. 235/2020"; que requereu a complementação da aposentadoria, nos termos do art. 209, inciso III, alínea "a", do Estatuto dos Servidores Municipais de Anita Garibaldi/SC (Lei Municipal 1.013/1991), a qual lhe foi concedida, através da Portaria n. 286/2020, com data de 29/05/2020; que, contudo, em 30/03/2021, a autoridade impetrada "editou o Decreto n. 2951/2021, no qual, em ato unilateral, suspendeu os pagamentos a titulo de complementação da aposentadoria da impetrante". Disse a impetrante que "verifica-se de pronto a ilegalidade do ato que determinou a suspensão dos pagamentos recebidos à titulo de complementação, uma vez que a eventual revogação, anulação ou suspensão do ato administrativo que concedeu benefícios deve, mediante regular processo administrativo, assegurar o contraditório e a ampla defesa".

Requereu a concessão da medida liminar, a ser confirmada ao final, "para suspender os efeitos do Decreto n. 2951/2021, restabelecendo, imediatamente, o pagamento do complemento salarial concedido através da Portaria n. 286/2020". Requereu a concessão da justiça gratuita.

Foi indeferido o pedido de liminar.

Intimada para comprovar a alegada hipossuficiência, a impetrante juntou documentos.

O Município de Anita Garibaldi manifestou-se nos autos, informando que não tem interesse na demanda.

Notificada, a autoridade coatora prestou informações, arguindo que "o Município de Anita Garibaldi/SC, pela Lei n. 1013/91, optou por vincular ao Regime Geral da Previdência Social todos os servidores efetivos do quadro de pessoal do Município, ou seja, as contribuições previdenciárias dos servidores municipais são direcionadas para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), acarretando, quando da passagem para a inatividade, em benefício previdenciário de aposentadoria regido pelas regras e dentro do regime geral de previdência social"; que "a Constituição Federal determina que para a complementação de aposentadorias para os servidores vinculados ao RGPS somente será possível após a instituição de lei do respectivo Poder Executivo, criando regime de previdência complementar, posicionamento este defendido pelo TCE/SC"; que "o Município optou por adotar o regime geral de previdência social para seus servidores, mas não constituiu, por lei, fundo visando à complementação de aposentadoria, o que inviabiliza a concessão/manutenção de complementação de aposentadoria do impetrante", nos termos do "Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, tema 14". Por fim, disse que, "levando-se em conta inúmeros julgados acerca da matéria, bem como a inexistência de Lei Municipal que autorize a complementação dos proventos da aposentadoria aos servidores aposentados pelo INSS, não há qualquer ilegalidade no ato praticado pelo Alcaide Municipal e ora parte requerida, de modo que a presente demanda deve ser julgada improcedente".

A impetrante impugnou as informações prestadas.

Com vista dos autos, o representante do Ministério Público opinou pela denegação da ordem.

Sentenciando, o digno Magistrado julgou improcedente o pedido e denegou a segurança.

Inconformada, a impetrante interpôs recurso de apelação repisando os argumentos despendidos na inicial, e reforçou a necessidade de regular processo administrativo para a suspensão do referido pagamento, o que não foi observado pela autoridade impetrada.

Após o oferecimento das contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Exmo. Sr. Dr. Guido Feuser, manifestou-se pela desnecessidade de intervenção no feito.

VOTO

Inicialmente, convém esclarecer que o inciso LXIX do art. 5º da Constituição Federal de 1988, reproduzido em termos pelo art. 1º da Lei Federal n. 1.533, de 31/12/1951 e mais recentemente pelo art. 1º da Lei Federal n. 12.016, de 7/8/2009, efetivamente garante a todos a concessão de "mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".

No entanto, o direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança deve vir comprovado desde logo com a impetração, porquanto nessa via processual não se admite dilação probatória para a sua comprovação.

HELY LOPES MEIRELLES, acerca do que se deve entender por direito líquido e certo, ensina:

"Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

"Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança" (Mandado de Segurança. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 37).

VICENTE GRECO FILHO, acerca da impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança, leciona:

"O pressuposto do mandado de segurança, portanto, é a ausência de dúvida quanto à situação de fato, que deve ser provada documentalmente. Qualquer incerteza sobre os fatos decreta o descabimento da reparação da lesão através do mandado, devendo a parte pleitear seus direitos através de ação que comporte a dilação probatória. Daí dizer-se que o mandado de segurança é um processo sumário documental, isto é, um processo rápido, concentrado, fundado em prova documental. No caso de não ser possível a apreciação do pedido por haver dúvida quanto à matéria de fato, por outro lado, pode o interessado propor a demanda adequada, não ocorrendo contra ele o fenômeno da coisa julgada" (Direito processual civil brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 308).

Então, a via do "writ of mandamus" é destinada à proteção de direito líquido e certo, cuja comprovação dos fatos e situações concretas para exercício do direito é verificada de plano, por prova pré-constituída incontestável, para que não pairem dúvidas ou incertezas sobre esses elementos.

Pois bem.

Há que se negar provimento ao recurso.

Em caso idêntico ao aqui discutido, o eminente Desembargador Hélio do Valle Pereira, em atenção ao paradigma vinculante firmado no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) n. 0001986-53.2013.8.24.0013/50001 (Tema 14), negou provimento a recurso de apelação interposto contra sentença que denegou a...

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