Acórdão Nº 5000764-87.2020.8.24.0087 do Quarta Câmara Criminal, 26-11-2020

Número do processo5000764-87.2020.8.24.0087
Data26 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5000764-87.2020.8.24.0087/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: RODRIGO HELARIO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Lauro Müller, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Rodrigo Helário, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 155, § 1º, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:
No dia 22 de maio de 2020, por volta das 23h40min, durante o repouso noturno, na residência localizada na Rua Valter Veterlli, s/n, Bairro Centro, Lauro Müller/SC, o denunciado RODRIGO HELÁRIO, imbuído de animus furandi, com firme desiderato de desfalcar o patrimônio alheio, subtraiu, para si, um botijão de gás, avaliado em R$ 170,00 (cento e setenta reais), de propriedade da vítima Luiz Antônio Geremias (auto de avaliação da fl. 8, auto de exibição e apreensão da fl. 9 e termo de entrega da fl. 11 do Inquérito Policial EPROC n. 5000740-59.2020.8.24.0087) (Evento 1, DENUNCIA1).
Finalizada a instrução, a Magistrada a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar o acusado Rodrigo Helário ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado, mais o pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, fixados no mínimo legal, por infração ao disposto no art. 155, § 1º, c/c o art. 61, I, ambos do Código Penal (Evento 55, SENT1).
Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs recurso de apelação criminal, mediante o qual requereu a absolvição pelo reconhecimento da causa excludente de ilicitude do estado de necessidade e também com fulcro no princípio da insignificância, nos termos do art. 386, III e/ou VI, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, postulou a fixação do regime aberto, a fim de se evitar desproporção entre o desvalor da conduta e o regime inicial da pena. Ao final, pugnou pela determinação da verba honorária ao defensor nomeado pelo trabalho suplementar, com base no anexo único da resolução CM n. 5/2019 do Conselho de Magistratura (Evento 75, RAZAPELA1).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 78, CONTRAZAP1), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 8, PROMOÇÃO1)

Documento eletrônico assinado por SIDNEY ELOY DALABRIDA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 449356v7 e do código CRC 5fd5b7e1.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SIDNEY ELOY DALABRIDAData e Hora: 6/11/2020, às 17:5:10
















Apelação Criminal Nº 5000764-87.2020.8.24.0087/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: RODRIGO HELARIO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


VOTO


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do apelo.
1 A defesa busca o reconhecimento da excludente de ilicitude do estado de necessidade e, por consequência, a absolvição do acusado, sob o argumento de que subtraiu somente para se alimentar, em razão do atual momento pandêmico e desemprego.
Sorte não lhe socorre.
Acerca do tema, colhe-se dos ensinamentos de Fernando Capez:
A maioria da jurisprudência inadmite a mera alegação de miserabilidade do agente como causa excludente da criminalidade. Assim, dificuldades financeiras, desemprego, situação de penúria, por si sós, não caracterizam essa descriminante. Do contrário, estariam legalizadas todas as condutas dos marginais ou mesmo de grande parte da população desempregada que, por não exercer atividade laborativa, apoderam-se do patrimônio alheio para sua subsistência.
Assim, para que se reconheça o estado de necessidade, por exemplo, nos casos de furto famélico, exige-se prova convincente dos requisitos do art. 24 do CP (atualidade do perigo, involuntariedade, inevitabilidade por outro modo e inexigibilidade de sacrifício do direito ameaçado). Desse modo, a prática do ato ilícito deve ser um recurso inevitável, uma ação in extremis. Se o agente tinha plenas condições de exercer trabalho honesto, não opera a excludente. Também poderá desfigurar a excludente o emprego da quantia obtida ilicitamente em bens supérfluos (Curso de direito penal - Parte Geral. 22 ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 380).
Assim, verifica-se que, para a configuração do furto famélico, é imprescindível que o réu comprove a miserabilidade, bem como o preenchimento dos requisitos do art. 24 do CP, quais sejam, atualidade do perigo, involuntariedade, inevitabilidade por outro modo e inexigibilidade de sacrifício do direito ameaçado.
In casu, contudo, não ficou comprovada a extrema miserabilidade do apelante, bem como os demais elementos integrativos essenciais à configuração da referida causa justificante.
Sem se descurar da pandemia de COVID-19 que nos assola e ainda que o réu se trate de pessoa de poucos recursos, tais circunstâncias não são suficientes para isentá-lo da responsabilidade pela prática delitiva. Para a aplicação da exculpante em questão, imprescindível que esteja devidamente configurada a extrema miserabilidade, o que, no presente caso, não ocorreu.
Infere-se da prova oral coligida que, na ocasião dos fatos, a vítima Luiz Antônio Geremias - antes de ter o botijão subtraído pelo acusado - preparou-lhe um sanduíche, saciando, portanto, a sua fome. Não fosse isso, o próprio réu, em seu interrogatório judicial, asseverou que tinha alimentos em casa, apesar de alegar que não teria como cozinhá-los sem o gás (Evento 44, VÍDEO2).
Destarte, ausente se encontra o elemento exculpante, consistente no intuito do agente em "salvar de perigo atual" (art. 24, CP), motivo pelo qual é impossível falar-se em estado de necessidade e, consequentemente, em furto famélico.
Sobre o assunto:
APELAÇÃO CRIMINAL (RÉU SOLTO). CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO PELA ESCALADA (ART. 155, §4º, INCISO I, C/C ART. 14, INCISO II, AMBOS DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO COM O RECONHECIMENTO DO ESTADO DE NECESSIDADE, DE ALTERAÇÃO DO REGIME PRISIONAL E SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO POR MAIORIA. 1. ESTADO DE NECESSIDADE. FURTO FAMÉLICO. A figura do furto famélico apenas se caracteriza se comprovado que o agente se encontra em situação de...

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