Acórdão Nº 5000765-07.2022.8.24.0086 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 08-12-2022

Número do processo5000765-07.2022.8.24.0086
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000765-07.2022.8.24.0086/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: EDILUIR DOS SANTOS (AUTOR) ADVOGADO: ALINE DOS SANTOS SOUZA BARROS (OAB PR104030) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: CRISTIANA NEPOMUCENO DE SOUSA SOARES (OAB MG071885)

RELATÓRIO

Da ação

Adota-se o relatório da sentença recorrida (Evento 18), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Trata-se de "AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO e NULIDADE CONTRATUAL c/c RESTITUIÇÃO DE VALORES, COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL" ajuizada por EDILUIR DOS SANTOS em face de BANCO BMG S.A, sob o argumento de que contratou um empréstimo consignado, quando, na verdade, era um empréstimo em cartão de crédito com constituição de "reserva de margem consignável" (RMC).

Assim, pugnou a parte autora por: a) concessão de tutela de urgência antecipada para que o réu se abstenha de descontar do contracheque da autora; b) declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito com RMC; c) repetição de indébito, em dobro, dos descontos realizados mensalmente, a título de empréstimo sobre a RMC; d) declaração de nulidade do contrato, na hipótese de comprovação da contratação do cartão de crédito consignado; e e) condenação da parte ré ao pagamento de danos morais.

Recebida a petição inicial, foi concedido o benefício da justiça gratuita, sendo indeferido o pedido de tutela de urgência e invertido o ônus da prova (Evento 04).

Citada, a parte requerida apresentou contestação, em que alegou, em preliminar, a possibilidade de defeito de representação/fraude processual e suscitou questão prejudicial de prescrição. No mérito, discorreu sobre a regularidade da contratação. Postulou, à vista disso, a improcedência dos pleitos iniciais (Evento 12).

Houve réplica (Evento 15).

É o relatório.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. HELENA VONSOVICZ ZEGLIN, da Vara Única da Comarca de Otacílio Costa, julgou improcedente os pedidos iniciais, nos autos de n. 5000765-07.2022.8.24.0086/SC, nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, bem como ao pagamento dos honorários de advogado em favor do procurador da parte contrária, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, observadas as condicionantes do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Suspensa a exigibilidade do pagamento dos ônus sucumbenciais, tendo em vista o deferimento do pedido de justiça gratuita, conforme art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil (Evento 04). (Evento 18).

Da Apelação

Inconformada com a prestação jurisdicional, o autor, ora Apelante, interpôs recurso de Apelação (Evento 23), no qual reedita os argumentos vertidos na inicial, ressaltando que, após a celebração de contrato de empréstimo consignado com o Apelado, foi surpreendido com o desconto de reserva de margem consignável (RMC) de cartão de crédito, o qual segundo alega, nunca recebeu e jamais utilizou.

Reitera que mesmo sem ter solicitado cartão, o Apelado simulou uma contratação de cartão de crédito consignado, cujos descontos realizados em seu benefício previdenciário sequer abatem o saldo devedor, mas apenas cobrindo os juros e encargos mensais.

Pugna a reforma da decisão recorrida, uma vez que a conduta perpetrada pelo Apelado é contrária às regras de proteção ao consumidor, por violar o direito à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços.

Por conta disso, pretende o reconhecimento da ilegalidade da contratação, com a consequente declaração de inexistência de relação jurídica entre as partes, com a condenação do Apelado a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados.

No que se refere ao dano moral, sustenta que o ato ilícito está configurado, diante da ilicitude praticada pelo Apelado, sendo o abalo moral, portanto, presumido.

Por fim, requer a reforma da sentença, e, consequentemente, o provimento do recurso para julgar procedentes os pedidos deduzidos na exordial.

Das contrarrazões

Devidamente intimado, o Apelado apresentou contrarrazões, alegando a regularidade da contratação e, por isso, pugna a manutenção da sentença (Evento 28).

Após, vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

II - Das contrarrazões

a) Da prejudicial de mérito - prescrição

O Banco BMG S.A, em sede de contrarrazões, alega a ocorrência da prescrição, diante do transcurso do prazo de 3 (três) anos estabelecido no art. 206, § 3º, IV, do CC, considerando que o contrato foi firmado 18/10/2018.

No entanto, não incide na hipótese o prazo prescricional trienal, uma vez que a presente demanda visa à reparação dos danos decorrentes de descontos supostamente indevidos lançados em benefício previdenciário, bem como caracteriza relação de consumo, o que sujeita a aplicação ao caso do art. 27 do CDC.

Ademais, o termo inicial para contagem da prescrição quinquenal é a data do último desconto.

Nesse norte, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes (AgInt no AREsp n. 1.412.088/MS, rel. Min. RAUL ARAÚJO, Quarta Turma, j. 27/08/2019 - grifei).

Assim, considerando que entre a data do ajuizamento da ação (30/03/2022) e a data do último desconto mencionado nos autos (10/05/2022), conforme fatura do cartão de crédito juntada ao Evento 12 - FATURA 03, p. 43), não transcorreu prazo superior a 5 (cinco) anos, não há falar em prescrição.

Sobre o tema, já decidiu este Órgão Julgador:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL CUMULADA COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. PRELIMINAR EM CONTRARRAZÕES. DEFENDIDA PRESCRIÇÃO TRIENAL REFERENTE AOS DANOS MORAIS E MATERIAIS. REJEIÇÃO. CONTRATO COM PRESTAÇÕES MENSAIS, CONTÍNUAS E SUCESSIVAS. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL QUE FLUI A PARTIR DO ÚLTIMO DESCONTO EFETUADO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E TERMO DE ADESÃO A CARTÃO DE CRÉDITO COM ABATIMENTO DE "RESERVA DE MARGEM" (RMC) DIRETAMENTE NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO PELA DEMANDANTE. DEFENDIDA A ILEGALIDADE DO CONTRATO. TESE ACOLHIDA. PRÁTICA ABUSIVA EVIDENCIADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO QUE MERECE REPRIMENDA JUDICIAL AMPARADA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATO ANULADO. RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE QUE DEVE OCORRER NA FORMA DOBRADA. EXEGESE DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. PERMITIDA A COMPENSAÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 368 DO CÓDIGO CIVIL.DANOS MORAIS. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA DEVIDA. PRECEDENTES DESTA CORTE. QUANTUM COMPENSATÓRIO ARBITRADO DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO. INVERSÃO DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA EM RAZÃO DO RESULTADO DO JULGAMENTO. HONORÁRIOS RECURSAIS. ART. 85, §§ 1º E 11, DO CPC/15. CRITÉRIOS CUMULATIVOS NÃO PREENCHIDOS (STJ, EDCL NO AGINT NO RESP 1.573.573/RJ). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5023649-14.2021.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Des. JAIME MACHADO JÚNIOR, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 30/09/2021 - grifei).

Desse modo, afasto a prejudicial de prescrição.

III - Do julgamento do recurso

Trata-se de Apelação interposta por EDILUIR DOS SANTOS...

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