Acórdão Nº 5000772-34.2022.8.24.0042 do Primeira Câmara Criminal, 21-06-2022

Número do processo5000772-34.2022.8.24.0042
Data21 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5000772-34.2022.8.24.0042/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: MARCELO NUNES (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo em Execução Penal interposto pelo Ministério Público contra a decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Maravilha, que, nos autos do processo de execução penal n. 8000202-10.2021.8.24.0049, afastou o caráter equiparado a hediondo do delito de tráfico de drogas, para determinar a utilização da porcentagem de 16% (dezesseis por cento) para cálculo da progressão de regime no tocante ao referido crime e concedeu a progressão para o regime aberto ao apenado Marcelo Nunes, estabelecendo como data-base o dia 18/03/2021 (Seq. 89.1 dos autos do PEC).

Sustenta o Parquet, nas razões do recurso de agravo, em síntese, que a decisão recorrida não encontra amparo na legislação pátria, uma vez que a Constituição Federal prevê, expressamente, no art. 5º, inciso XLIII, tratamento especialmente gravoso ao delito de tráfico de drogas. Afirma, também, que a Lei n. 13.964/2019 não afastou a hediondez por equiparação do crime, pelo contrário, atualizou a redação do art. 112 da Lei de Execução Penal para enrijecer o cumprimento das penas.

Assim, defende que deve ser mantido o percentual de 40% (quarenta por cento) para progressão de regime no tocante ao crime de tráfico e que, portanto, não teria sido adimplido o requisito objetivo para progressão, motivo pelo qual objetiva a cassação da decisão, para que o apenado retome o cumprimento no regime semiaberto, diante do não adimplemento do requisito objetivo para transferência ao regime menos rigoroso.

Ainda, pugna pelo prequestionamento do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, do art. 2º da Lei n. 8.072/90 e do art. 112, § 5º, da Lei n. 7.210/84.

Por tais razões, requer o conhecimento e provimento do recurso, a fim de que seja reformada a decisão recorrida, reconhecendo-se a característica equiparada a hedionda do crime de tráfico de drogas e, por conseguinte, alterando-se a fração exigida para a progressão de regime. Assim, almeja o imediato retorno do cumprimento da pena no regime semiaberto ou, subsidiariamente, caso já adimplido, que seja considerada como data-base aquela em que cumprida a porcentagem adequada para progressão de regime.

Por fim, pleiteia que seja determinada a instauração de incidente de resolução de demandas repetitivas, nos termos do artigo 976 do Código de Processo Civil, com o fito de uniformizar a jurisprudência desta Corte a respeito da manutenção da equiparação a hediondo do crime de tráfico de drogas, para fins de definição da fração de progressão de regime (Evento 1 dos autos do agravo).

Posteriormente, em peça apartada, o Parquet reiterou o pedido de instauração de incidente de resolução de demandas repetitivas (Evento 7 dos autos do agravo).

Em contrarrazões, a defesa manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 9 dos autos do agravo).

Mantida a decisão recorrida (Evento 11 dos autos do agravo), os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Genivaldo da Silva, opinado pelo conhecimento do recurso e, em preliminar, pela suspensão do julgamento e instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas, e, caso não conhecida a preliminar, pelo provimento do reclamo (Evento 7 dos presentes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Cuida-se de agravo em execução penal interposto pelo Ministério Público, inconformado com a decisão que deferiu o pedido defensivo de retificação das frações exigidas à progressão de regime, ao afastar a hediondez do delito de tráfico de drogas, e, em consequência, concedeu ao apenado Marcelo Nunes a progressão ao regime aberto, a partir de 18/03/2021.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o agravo de execução em tela merece conhecimento.

A pretensão ministerial comporta acolhimento.

Isso porque, muito embora a Lei n. 13.964/19, conhecida como Pacote Anticrime, tenha, de fato, revogado o § 2º do art. 2º da Lei n. 8.072/90 (que previa frações diferenciadas para a progressão de regime aos crimes hediondos e equiparados), o fez não como forma de excluir a exigência de cumprimento de requisito objetivo próprio a esses delitos, mas, apenas, a fim de unificar, em um mesmo diploma legal - isto é, no art. 112 da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) -, os critérios para a progressão de regime às diferentes espécies de infrações.

Tal proceder em nada alterou a característica equiparada a hedionda de que é dotado o crime de tráfico de entorpecentes, a qual é prevista no caput do art. 2º da Lei n. 8.072/90 (não revogado pelo Pacote Anticrime), que reproduz, inclusive, previsão constitucional (art. 5º, inciso XLIII, da Constituição da República).

Ademais, se a novel legislação houvesse excluído a hediondez do delito de tráfico de entorpecentes, previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, o teria feito de forma expressa, assim como fizera em relação à figura privilegiada da mesma infração, ao estabelecer, no art. 112, § 5º, da Lei de Execução Penal, que "Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006".

Ora, se todas as formas do delito de tráfico de drogas não mais fossem consideradas hediondas, desnecessário seria o legislador ter realizado tal ressalva.

Sobre o tema, colhe-se da doutrina de Guilherme de Souza Nucci:

Figuras equiparadas aos delitos hediondos: a tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e o terrorismo somente não são considerados hediondos - embora sejam igualmente graves e repugnantes - porque o constituinte, ao elaborar o art. 5.º, XLIII, CF, optou por mencioná-los expressamente como delitos insuscetíveis de fiança, graça e anistia, abrindo ao legislador ordinário a possibilidade de fixar uma lista de crimes hediondos, que teriam o mesmo tratamento. Assim, essas três modalidades de infrações penais são, na essência, tão ou mais hediondas que os crimes descritos no rol do art. 1.º da Lei 8.072/90. (Leis penais e processuais penais comentadas. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 534). (Grifo não original).

Este Tribunal, a propósito, tem...

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