Acórdão Nº 5000777-50.2019.8.24.0175 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 23-06-2022

Número do processo5000777-50.2019.8.24.0175
Data23 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000777-50.2019.8.24.0175/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: ANTONIO BENEDITO ZANELATO (AUTOR) ADVOGADO: GUSTAVO PALMA SILVA (OAB SC019770) ADVOGADO: Stephany Sagaz Pereira (OAB SC035218) APELANTE: BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU) ADVOGADO: RONALDO GOIS ALMEIDA (OAB RS056646) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

BANCO BMG SA e ANTONIO BENEDITO ZANELATO interpuseram recursos de apelação cível em face da sentença que, proferida pelo juízo da Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense da Comarca de Meleiro, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor na ação de restituição de valores e de indenização por danos morais.

Cuida-se, na origem, de ação de restituição de valores e de indenização por danos morais aforada por ANTONIO BENEDITO ZANELATO contra BANCO BMG SA, na qual pede o reconhecimento da inexistência de contratação de empréstimo consignado na modalidade de cartão de crédito, bem como a condenação da instituição financeira ao ressarcimento dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, de maneira dobrada, e a condenação ao pagamento de danos morais, em razão da inexistência de contratação de reserva de margem consignada em seu benefício previdenciário, para contratação de cartão de crédito não solicitado.

Foi concedida a gratuidade da justiça requerida pelo demandante e indeferida a antecipação dos efeitos da tutela (evento 3, autos da origem).

Devidamente citado, o BANCO BMG SA apresentou contestação (evento 10, autos da origem), na qual defendeu a regularidade da contratação realizada entre as partes. Afirmou, neste sentido, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito. Argumentou que, inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência da demanda. Juntou o contrato firmado com a parte autora, comprovante de disponibilização do valor sacado do cartão de crédito, cópia das faturas do cartão de crédito emitidas durante o período da contratação.

Houve réplica (evento 14, autos da origem).

Sobreveio sentença de mérito prolatada em 27-06-2020 pelo magistrado Marciano Donato, da Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense da Comarca de Meleiro, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor, o que se deu nos seguintes termos (evento 18, autos da origem):

JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ANTONIO BENEDITO ZANELATO em desfavor de BANCO DAYCOVAL S.A., para, acolhendo o pedido subsidiário e com amparo no artigo 6º, incisos III e V do Código de Defesa do Consumidor, determinar que a instituição financeira requerida proceda, no prazo de 30 (trinta) dias, a readequação dos termos do contrato de "Cartão de Crédito Consignado" conforme parâmetros acima elencados.

Ainda, JULGO EXTINTO o processo com resolução de mérito, na forma do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Frente a sucumbência recíproca, CONDENO as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), a serem partilhados no percentual de 50% (cinquenta por cento) para cada uma, à luz do artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil - sobretudo por se tratar de demanda de pouca complexidade, com reduzido número atos processuais e sem instrução do processo -, corrigidos monetariamente a partir da publicação desta sentença e acrescidos de juros de mora após o trânsito em julgado.

Por ser beneficiária da gratuidade da justiça (evento 3), fica suspensa exigibilidade dos ônus sucumbenciais em relação à parte requerente.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Oportunamente, arquivem-se.

Ambas as partes interpuseram recursos de apelação (evento 23 e 38, autos da origem).

Inconformada, a instituição financeira interpôs recurso de apelação (evento 23, autos da origem), no defende, em síntese, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, sendo esta modalidade de crédito a única operação viável para a concessão do valor perseguido. Aduziu que mesmo após o ajuizamento da ação subjacente, o autor efetuou saques por meio do cartão de crédito impugnado. Afirma que, diante da regularidade da contratação realizada entre as partes, é incabível a sua condenação ao pagamento de danos morais em favor do demandante. Pugna pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, sendo julgada totalmente improcedente a demanda de origem.

Por sua vez, o autor em seu apelo (evento 23, autos da origem), sustenta: a) que o réu deve ser condenado ao pagamento de indenização a título de dano moral; b) a restituição dos valores deve se dar na forma dobrada.

Contrarrazões apresentadas nos eventos 40 e 47 (autos da origem).

Os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça.

Vieram-me os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise dos presentes recursos, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isto, tem-se que os recursos devem ser conhecidos porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Fundamentação

2.1 Da regularidade da operação contratada entre as partes

Sustenta a instituição financeira recorrente, inicialmente em seu recurso, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de maneira clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, uma vez que mesmo após o ajuizamente da ação, ele continuou efetuando saques por meio do cartão contestado.

Analisados os autos, verifica-se que razão possui mesmo o banco recorrente.

A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).

As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):

Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.

[...]

Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1o Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:

I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1o;

II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;

III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;

IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;

V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e

VI - as demais normas que se fizerem necessárias.

[...]

§ 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite...

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