Acórdão Nº 5000807-20.2019.8.24.0035 do Primeira Câmara de Direito Civil, 02-06-2022

Número do processo5000807-20.2019.8.24.0035
Data02 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000807-20.2019.8.24.0035/SC

RELATOR: Desembargador RAULINO JACÓ BRUNING

APELANTE: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU) APELADO: NERI SCHEFER (AUTOR) ADVOGADO: VALDEVINO EIFLER (OAB SC040688)

RELATÓRIO

Na Comarca de Ituporanga, houve sentença de parcial procedência dos pedidos veiculados na ação de indenização por danos materiais decorrentes de queda de energia elétrica e perda de fumo, proposta pelo fumicultor Neri Schefer em face de Celesc Distribuição S.A. Contra o decisum, insurge-se a parte ré por meio da presente apelação (EVENTO 61), argumentando as matérias a seguir expostas na fundamentação do voto.

O autor apresentou contrarrazões, alegando ofensa ao princípio da dialeticidade e, no mérito, rebatendo as teses da parte contrária (EVENTO 69).

VOTO

1. Do não conhecimento de parte do reclamo

De início, cumpre consignar que, da leitura das razões recursais, verifica-se que a concessionária faz longa explanação sobre a natureza do serviço prestado, a relatividade da responsabilidade objetiva, a ausência de falhas ou defeitos, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e a falta de cuidados por parte do fumicultor, que deveria ter tomado precauções para evitar o prejuízo. Nada diz a respeito do caso concreto.

Inclusive, uma das teses ataca a unilateralidade do laudo técnico acostado pelo autor com a exordial, refutando-o como prova hábil a quantificar o valor dos danos (argumento da contestação). Ocorre que, na espécie, o Magistrado a quo designou perícia judicial - fato solenemente ignorado no recurso -, dela advindo as conclusões da sentença. Assim, forçoso reconhecer que, como reiteradamente tem ocorrido, falta dialeticidade neste tocante, motivo pelo qual o conhecimento do recurso será apenas parcial.

A propósito:

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.010, INCISOS II e III, DO CPC/15. RECURSO NÃO CONHECIDO. "Se o recorrente não expõe os fundamentos que dão causa a seu inconformismo, seja por fazê-lo de forma estranha ao contexto entabulado na decisão, seja por repetir ipsis litteris argumentos já enfrentados e rejeitados pelo magistrado de primeiro grau, e não discorre especificamente sobre as razões de decidir constantes da sentença, atenta contra o princípio da dialeticidade e, por isso, seu recurso não pode ser conhecido" (TJSC, Apelação Cível n. 0803570-92.2013.8.24.0023, rel. Des. Janice Goulart Garcia Ubialli, j. 03-04-2018). (TJSC, Apelação Cível n. 0315842-91.2017.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Paulo Ricardo Bruschi, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 12-12-2019, grifou-se).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. APELO DA PARTE AUTORA. PRETENDIDA LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS À TAXA MÉDIA ESTIPULADA PELO BANCO CENTRAL. ALEGAÇÕES DISSOCIADAS DOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. Carece de dialeticidade o recurso quando as suas razões recursais não se contrapõem à sentença. In casu, a recorrente repisou seus argumentos iniciais, olvidando das razões de fato e de direito que conduziram ao indeferimento da petição inicial. Assim, sem contrapor qualquer fundamentação jurídica à sentença, o reclamo não merece ser conhecido. HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS EM FAVOR DA PARTE RECORRIDA, EM FACE DO TRABALHO ELABORADO NA SEGUNDA INSTÂNCIA, NOS TERMOS DO ART. 85, §§ 1º e 11, DO CPC/15. RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0301967-06.2018.8.24.0075, de Tubarão, rel. Des. Jaime Machado Junior, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 27-06-2019, grifo acrescido).

Quanto ao restante da insurgência, a despeito de ser deveras genérica, a verdade é que algumas questões sobre a responsabilidade da apelante também são pertinentes e capazes de, em tese, afastar a condenação (ou parcela dela). Por esse motivo, satisfeitos os pressupostos de admissibilidade recursal (intrínsecos e extrínsecos), prossegue-se ao exame dos fundamentos abaixo.

2. Do recurso

A Constituição Federal, em seu art. 37, § 6º, estabelece:

Art. 37. [...]

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Segundo a diretriz constitucional, portanto, a Administração Pública Direta e Indireta, bem como as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, respondem objetivamente pelos danos decorrentes da sua atuação, ou seja, independentemente de culpa do agente público. Trata-se da teoria do risco administrativo, segundo a qual o Estado somente se exime do dever de indenizar se comprovar culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior.

Sobre o tema, colhe-se da doutrina de Hely Lopes Meirelles:

O exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 622).

Retira-se da jurisprudência deste Tribunal os seguintes precedentes:

Por força da responsabilidade civil objetiva consagrada pelo art. 37, § 6º, da CF/88, a fazenda pública e os concessionários de serviços públicos estão obrigados a indenizar os danos causados em virtude de seus atos, e somente se desoneram se provarem que o ato ilícito se deu por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior (TJSC, Apelação Cível n. 2015.084383-9, de Itaiópolis, rel. Des. Jaime Ramos, j. 26-1-2016).

Não se pode deslembrar que a responsabilidade do Estado se assenta no risco administrativo e independe de prova da culpa, bastando que se demonstre o nexo causal entre o acidente e o dano. Aliás, sequer se exige a prova de culpa do servidor causador do dano. Em casos que tais o ônus da prova é invertido: ao Estado é que compete provar a existência de uma das causas de exclusão da responsabilidade, como a culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito ou a força maior (Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 282) (TJSC, Apelação Cível n. 2013.064549-5, de Garopaba, rel. Des...

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