Acórdão Nº 5000824-48.2020.8.24.0091 do Quarta Câmara de Direito Público, 04-02-2021

Número do processo5000824-48.2020.8.24.0091
Data04 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000824-48.2020.8.24.0091/SC

RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTI

APELANTE: MARLA DE BRUM MACKMILL (AUTOR) ADVOGADO: ARNALDO DEMETRIO COELHO JUNIOR (OAB SC050356) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP)

RELATÓRIO

Marla de Brum Mackmill ajuizou "ação anulatória de ato administrativo com pedido de tutela de urgência", que tramitou na Vara de Direito Militar da comarca de Florianópolis, em face do Estado de Santa Catarina, visando anular as questões de n. 30, 31, 37 e 41 da prova objetiva do concurso público para ingresso no Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina (Edital n. 042/CGCP/2019).

Na inicial, sustenta, em resumo, que participou do aludido certame e que algumas questões da prova objetiva apresentam conteúdo que extrapola o contido no instrumento editalício. Além de referir jurisprudência sobre o assunto, destaca que o conteúdo programático da etapa da prova objetiva previa apenas "noções básicas de direito", de modo que seria vedado à banca examinadora a cobrança de temas mais complexos próprios de profissionais formados na área.

Quanto à questão de n. 30, ressalta que algumas das alternativas exigiram conhecimentos que extrapolam o edital, por se referirem a conceito doutrinário e jurisprudencial, o que seria incompatível com a ideia de "noções de Direito Constitucional". O mesmo vale para a questão de n. 31, alega que pressupunha conhecimento sobre a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Na questão n. 37 defende que seu conteúdo exige o conhecimento da Lei n. 9.099/95, por se referir a "infração de menor potencial ofensivo", e assim, extrapolaria o edital. Finalmente, sobre a questão n. 41, alega haver dúvida sobre os elementos do tipo do crime de abandono de incapaz descrito no enunciado, o que prejudicou a resolução desta questão.

Requereu, liminarmente, a anulação das questões de n. 30, 31, 37 e 41 e sua reclassificação no certame, e ao final, postulou o julgamento de procedência dos pedidos para confirmação da medida.

Por decisão interlocutória, o juízo singular deferiu em parte o pleito liminar para anular as questões de n. 30 e 37 (Evento 3). Esta decisão foi reformada, posteriormente, por este Tribunal de Justiça em sede de agravo de instrumento (autos n. 5002292-29.2020.8.24.0000).

O Estado de Santa Catarina apresentou contestação (Evento 14) alegando que as questões não apresentam conteúdo incompatível com o edital regulador do certame, estando inseridas no conteúdo programático previsto no Anexo III do edital. Diz que não houve erro material ou decisão teratológica da banca examinadora, a qual anulou as questões que estavam em descompasso com as regras editalícias na fase de julgamento dos recursos, preservando a isonomia entre os candidatos. Pugnou pela improcedência dos pedidos.

Houve réplica (Evento 17).

O Ministério Público declinou de seu interesse no feito (Evento 26).

Na sentença (Evento 20), o magistrado julgou improcedente o pedido da autora e o dispositivo encontra-se assim redigido:

Ante o exposto, JULGAM-SE IMPROCEDENTES os pedidos formulados por Marla de Brum Mackmill em desfavor do Estado de Santa Catarina.

Condena-se a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios em favor do réu, no montante de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), à luz do art. 85, §§2º e 8º, CPC.

Revoga-se a Liminar (Evento 3).

Comunique-se ao Desembargador Relator do Agravo de Instrumento (autos 5002292-29.2020.8.24.0000), quanto a presente decisão.

Sem reexame necessário.

Irresignada, a demandante interpôs, recurso de apelação (Evento 42), reforçando os argumentos lançados na inicial. Postulou a concessão do benefício da justiça gratuita.

O Estado de Santa Catarina apresentou contrarrazões (Evento 50).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Guido Feuser, que entendeu não ser hipótese a justificar intervenção ministerial (Evento 6).

Este é o relatório.

VOTO

Cuido de apelação cível, interposta por candidata de concurso público, inconformada com a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação ordinária e não anulou as questões n. 30, 31, 37 e 41 da prova objetiva do concurso público para ingresso no Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina (Edital n. 042/CGCP/2019).

Quanto ao juízo de admissibilidade, verifico que a pretensão recursal preenche os pressupostos processuais intrínsecos e extrínsecos, razão pela qual deve ser conhecida.

Em primeiro grau, o benefício de justiça gratuita foi indeferido, entendendo o juízo singular que a existência de um veículo de grande valia em nome da autora indicaria condição financeira suficiente para arcar com as custas processuais.

A justiça gratuita é o benefício previsto no art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal: "Art. 5º. [...] LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Por sua vez, o Código de Processo Civil (CPC) estabelece, em seu art. 98, que "A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei".

Além disso, o § 3º do art. 99, do mesmo Código, determina a presunção de veracidade acerca da alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. Todavia, tal presunção não é absoluta, de modo que pode o magistrado, se entender necessário, exigir da parte que a requer que comprove a insuficiência de recursos.

A Resolução n. 4/2006-CM do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a respeito, recomenda:

Art. 1º Recomendar:

I - aos magistrados, por ocasião do exame do pedido de assistência judiciária gratuita, que, em havendo dúvida quanto às condições financeiras de a parte custear o processo:

a) defiram o benefício em caráter provisório para que não haja prejuízo à tramitação do processo (Lei n. 1.060/50, art. 4º, § 2º);

b) instem-na a prestar esclarecimentos que permitam o exame mais aprofundado da pretensão e a juntar documentos que comprovem as suas alegações, se necessário; [...].

In casu, o pedido de gratuidade da justiça foi indeferido pelo magistrado a quo sob o fundamento de não comprovação da hipossuficiência. Todavia, diante da documentação juntada neste grau de jurisdição, a qual demonstra a alteração da condição financeira da recorrente, resta constatada a sua hipossuficiência econômica.

As informações trazidas com a apelação comprovam que a autora não possui bens imóveis e móveis registrados em seu nome, nem mesmo aquele veículo que tinha quando do ajuizamento da ação; além disso, trouxe cópia de sua carteira de trabalho, a qual não apresenta qualquer registro laboral, e acostou certidão de isenção de imposto de renda do exercício 2019/2020 (Evento 42, Outros 2 a 6). Nesse sentido, constato que, neste momento, a recorrente não aufere renda que comporte o pagamento das custas, sem prejudicar seu próprio sustento e de sua família.

Nessa linha, colhe-se da jurisprudência desta colenda Corte de Justiça:

É desnecessária a condição de miserabilidade para que a parte possa usufruir dos benefícios da justiça gratuita, bastando, para tanto, a comprovação da hipossuficiência e que os custos do processo possam acarretar prejuízos ao sustento próprio e/ou da família. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2014.088613-5, de Criciúma, rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, j. 28/05/2015).

E:

Para a concessão do benefício da justiça gratuita não é...

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