Acórdão Nº 5000827-95.2019.8.24.0007 do Primeira Câmara de Direito Público, 20-09-2022

Número do processo5000827-95.2019.8.24.0007
Data20 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000827-95.2019.8.24.0007/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000827-95.2019.8.24.0007/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FERNANDO BOLLER

APELANTE: INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - IPREV (RÉU) APELADO: ERNANI SOARES BUENO (Espólio) (AUTOR)

RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação interposta por IPREV-Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina, em objeção à sentença prolatada pelo magistrado César Augusto Vivan - Juiz de Direito titular da 2ª Vara Cível da comarca de Biguaçu -, que na Ação de Concessão de Pensão por Morte n. 5000827-95.2019.8.24.0007 ajuizada por Ernani Soares Bueno, julgou procedentes os pedidos, nos seguintes termos:

ERNANI SOARES BUENO ajuizou a presente "ação de concessão de pensão por morte" em face do INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - IPREV, ambos qualificados, alegando, em síntese, que possui 53 anos de idade, tendo sofrido grave acidente automobilístico no ano de 1998 que culminou na amputação de sua perna esquerda e na perda da visão de um olho, bem como passou a usar sonda vesical e permanece a maior parte do dia acamado.

Aduziu que na época residia com seus pais e que assim permaneceu até o óbito de ambos, sendo que sua genitora faleceu em 2011 e seu pai em 2019. Alega que nunca casou ou teve uma companheira, estando solteiro desde a época do acidente até os dias atuais, sendo que seus pais sempre foram seus cuidadores.

Assevera, ainda, a parte autora que não obstante o requerido tê-lo considerado totalmente inválido desde 17.11.2000 e terem concluído que era dependente financeiramente de seu genitor, decidiram por negar o benefício de pensão por morte, sob o argumento de inexistência de dependência financeira.

[...]

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, com resolução de mérito, para:

a) DETERMINAR que o réu conceda à parte autora o benefício de pensão por morte, desde a data do óbito de seu genitor (15.02.2019), no valor correspondente aos proventos integrais percebidos pelo servidor quando do seu falecimento, até o limite estabelecido em lei, com revisão na mesma proporção e data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade (ar. 40, §§ 7º e 8º, da Constituição Federal).

b) CONDENAR a autarquia ré ao pagamento das prestações vencidas, desde a data do requerimento administrativo (26.02.2019), observada a prescrição quinquenal, até a data em que o benefício for implementado em folha de pagamento, tudo acrescido de juros e correção monetária pelos índices previstos no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, na forma especificada na fundamentação.

Malcontente, o IPREV-Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina argumenta que:

No caso em tela, o apelado recebe proventos de aposentadoria superior ao salário mínimo, encontrando óbice à concessão do benefício de pensão, na legislação estadual, que dispõe acerca da ausência de dependência econômica quando a renda familiar bruta mensal supera o salário mínimo nacional.

Embora os gastos do autor superem sua aposentadoria, não compete ao IPREV o pagamento do benefício em detrimento do disposto em norma legal. Também não compete ao Judiciário afastar a lei, sob esse argumento

[...]

[...] não há direito a integralidade para os pensionistas de servidor falecido após a EC 41/2003, e a paridade somente se aplica quando o servidor estava aposentado conforme requisitos da EC 47/2005.

A parte apelada sequer postulou o cálculo do benefício conforme a paridade e integralidade, tampouco apresentou comprovação de que o instituidor preenchia os requisitos do art. 3º, EC 47/2005. Assim, em se mantendo a concessão do benefício, requer a reforma da decisão para excluir a paridade e integralidade, em atenção as regras vigentes na data do óbito.

Nestes termos, brada pelo conhecimento e provimento do apelo.

Na sequência sobrevieram as contrarrazões, onde Ernani Soares Bueno refuta uma a uma as teses manejadas, exorando pelo desprovimento da insurgência.

Posteriormente, foi noticiado o óbito do autor (Evento 63, CERTOBT2 dos autos de origem).

Intimada a parte autora, a representação processual foi regularizada (Eventos 21, 34 e 40).

Em manifestação da Procuradora de Justiça Eliana Volcato Nunes, o Ministério Público apontou ser desnecessária sua intervenção, deixando de lavrar Parecer.

Em apertada síntese, é o relatório.

VOTO

Conheço do recurso porque, além de tempestivo, atende aos demais pressupostos de admissibilidade.

O IPREV-Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina objetiva a reforma da sentença que concedeu o benefício de pensão por morte em favor de Ernani Soares Bueno, na qualidade de filho maior inválido do então servidor público estadual Heitor Soares Bueno, sob o argumento de inexistir dependência econômica entre o herdeiro e seu genitor, porquanto já detentor de vantagem previdenciária em valor superior a 1 (hum) salário-mínimo.

Ainda, defende que o óbito do instituidor do benefício ocorreu em 15/02/2019, o que atrai as alterações promovidas pela EC n. 41/2003, afastando-se a paridade e integralidade dos proventos.

Pois bem.

Sem delongas, antecipo: a irresignação prospera apenas em parte.

Ernani Soares Bueno, falecido em 12/09/2021 aos 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, era portador de paraplegia, amputação da coxa esquerda e perda da visão de um dos olhos, em decorrência de grave acidente automobilístico ocorrido no ano de 1998.

Em 17/11/2000, o beneficiário requerente teve a consolidação da sua invalidez reconhecida. Ou seja, antes da data do óbito de seu genitor (15/02/2019), Ernani Soares Bueno já era incapaz para o trabalho, necessitando do cuidado de terceiros para a administração de medicação, alimentação, higiene pessoal e enroupado.

Pois então.

Vis-à-vis a pertinência e adequação, por consubstanciar circunstância análoga que merece idêntica solução, trago à lume a interpretação da norma consagrada na decisão professada pelo notável Desembargador Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, quando do julgamento da congênere Apelação Cível n. 0303987-66.2017.8.24.0022, que parodio, imbricando-a ipsis verbis em meu voto, nos seus precisos termos, como ratio decidendi:

O Iprev sustentou que o autor não faz jus à pensão por morte porque recebe benefício do INSS em valor superior a um salário-mínimo.

A respeito, já decidiu esta Corte:

CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL DA PARTE AUTORA. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA INTERVIR EM PRIMEIRO GRAU DIANTE DA PRESENÇA DE INCAPAZ NO PROCESSO. PRIMAZIA DO MÉRITO. NULIDADE AFASTADA. MÉRITO. PENSÃO POR MORTE DE SERVIDORA PÚBLICA ESTADUAL. FILHO MAIOR INVÁLIDO. INCAPACIDADE PERMANENTE E DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADAS. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIO DO INSS DE VALOR SUPERIOR AO SALÁRIO MÍNIMO COM PENSÃO POR MORTE DE SUA GENITORA. POSSIBILIDADE DIANTE DAS ESPECIFICIDADES DO CASO CONCRETO. DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA SEVERIDADE DA DOENÇA INCAPACITANTE E DA INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS PARA SOBREVIVER APENAS COM O BENEFÍCIO PAGO PELA AUTARQUIA FEDERAL. DIREITO AO BENEFÍCIO ESTADUAL. PRESTAÇÕES VENCIDAS. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC A PARTIR DE CADA VENCIMENTO E JUROS DE MORA DESDE A CITAÇÃO PELOS ÍNDICES DE REMUNERAÇÃO ADICIONAL DA CADERNETA DE POUPANÇA. ORIENTAÇÃO DO STF (TEMA 810, RE 870.947/SE) E DO STJ (TEMA 905, REsp 1.495.146/MG). SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. (AC n. 0300569-37.2016.8.24.0061, de São Francisco do Sul, rel. Des. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 8-5-2018)

Extrai-se do voto-condutor:

Quanto ao mérito, percebe-se pela documentação acostada aos autos que a parte apelante é manifestamente incapaz para a prática de qualquer ato de sua vida civil, como comprovam os laudos e atestados médicos às páginas 16, 24/28. Todos reforçados pela decretação de sua interdição exarada nos Autos n. 061.08.003389-0 (p. 13).

Ademais, a própria Autarquia Previdenciária Estadual (p. 28) reconhece o estado de incapacidade absoluta da parte apelante, contudo entende que o fato de auferir benefício do INSS de valor superior ao salário mínimo lhe retira a condição de dependência econômica para com sua mãe, professora estadual aposentada que auferia proventos na condição de ex-segurada da parte apelada (p. 19) e que faleceu em 28/5/2015 (p. 15).

Ao direito de pensão previdenciária por morte de servidor estadual aplica-se a legislação vigente à data do óbito do segurado instituidor (tempus regit actum), como enunciado na Súmula n. 340 do STJ ("A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado").

Na espécie, o direito de pensão por morte de servidor estadual vem estabelecido...

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