Acórdão Nº 5000833-76.2020.8.24.0166 do Segunda Câmara Criminal, 23-05-2023

Número do processo5000833-76.2020.8.24.0166
Data23 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5000833-76.2020.8.24.0166/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


APELANTE: PEDRO BORBA FERRARI (RÉU) ADVOGADO(A): MAURICIO MARTINHAGO OLIVEIRA (OAB SC039324) ADVOGADO(A): ROBSON TIBÚRCIO MINOTTO (OAB SC016380) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Denúncia (ev. 1 dos autos originários): o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Pedro Borba Ferrari, nos autos n. 5000833-76.2020.8.24.0166, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 14 e 15 da Lei n. 10.826/03, em razão dos seguintes fatos:
FATO 1
No dia 7 de fevereiro de 2020, por volta das 22h30min, na via pública situada na Rua Adelina Rosa Bosa Búrigo, s/n, em frente ao Bar do Grêmio, no bairro Santa Líbera, nesta cidade e Comarca de Forquilhinha/SC, o denunciado PEDRO BORBA FERRARI, com consciência e vontade, portanto, dolosamente, portou e transportou uma arma de fogo de uso permitido, tipo pistola, marca Taurus, modelo pt838c, calibre 380, bem como pelo menos duas munições, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Segundo restou apurado, na data dos fatos, por volta das 18h30min, o denunciado teria saído de sua residência a bordo seu carro HB20, de cor vermelha, a fim de levar alimento a um parente próximo, levando no interior de seu veículo a arma de fogo acima mencionada.
FATO 2
No mesmo contexto do Fato 1, o denunciado PEDRO BORBA FERRARI efetuou disparos de arma de fogo, consistente numa pistola, marca Taurus, modelo pt838c, calibre 380, em lugar habitado e em via pública, trazendo risco à segurança das pessoas que se encontravam nas proximidades.
Conforme consta nos autos, na sequência do Fato 1, o denunciado estava a bordo de seu veículo quando avistou dois masculinos em vias de fato em frente ao Bar do Grêmio, ocasião em que efetuou dois disparos com a arma de fogo descrita no tópico anterior, cujas cápsulas deflagradas foram apreendidas pela Polícia Militar, conforme termo do evento 1, p. 23.
Registra-se que a Polícia Militar foi acionada e, ao chegar no local, frequentadores do bar indicaram nome e residência do suposto autor dos disparos, oportunidade em que a guarnição foi até o local e constatou ser o Sr. Pedro, apreendendo a arma de fogo e munições que estavam em sua posse.
Sentença (ev. 92 dos autos originários): a Juíza de Direito Elaine Veloso Marraschi julgou PROCEDENTE a denúncia para condenar Pedro Borba Ferrari ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, por reconhecer que praticou os crimes previstos nos arts. 14 e 15, ambos da Lei n. 10.826/03.
Recurso de apelação de Pedro Borba Ferrari (ev. 105 dos autos originários): a defesa arguiu, preliminarmente, nulidade das provas colhidas mediante violação de domicílio, sob o argumento de que não ocorreu a situação de flagrante delito prevista no art. 5º, inc. XI, da Constituição Federal. Alegou, ainda que, não bastasse, o apelante teve sua imagem exposta em mídia televisiva como homicida, o que impediu o retorno de sua família para sua residência. Ainda, seu papagaio de estimação, legalmente adquirido, foi recolhido e até o momento não foi devolvido.
Quanto ao mérito, pugnou por sua absolvição diante da atipicidade da conduta pelo reconhecimento de legítima defesa de terceiro.
Requereu, subsidiariamente, a aplicação do princípio da consunção e o consequente oferecimento de acordo de não persecução penal.
Contrarrazões do Ministério Público (ev. 109 dos autos originários): a acusação impugnou as razões recursais e postulou o conhecimento e não provimento do recurso, com a consequente manutenção incólume da sentença condenatória.
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (ev. 8 dos autos de Segundo Grau): o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Ernani Dutra opinou pelo conhecimento e o desprovimento do recurso.
Este é o relatório

Documento eletrônico assinado por HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3419769v11 e do código CRC 75d45079.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOData e Hora: 5/5/2023, às 19:19:1
















Apelação Criminal Nº 5000833-76.2020.8.24.0166/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


APELANTE: PEDRO BORBA FERRARI (RÉU) ADVOGADO(A): MAURICIO MARTINHAGO OLIVEIRA (OAB SC039324) ADVOGADO(A): ROBSON TIBÚRCIO MINOTTO (OAB SC016380) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto por Pedro Borba Ferrari contra a sentença que o condenou ao cumprimento da pena privativa de liberdade fixada em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento da pena de multa de 20 (vinte) dias-multa, por reconhecer que praticou os crimes previstos nos arts. 14 e 15, ambos da Lei n. 10.826/03.
A reprimenda corporal foi substituída por restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade ou à entidade beneficente, nos termos do art. 46 do Código Penal, à razão de uma hora de tarefa diária por dia de condenação, e o pagamento de multa no valor de um salário mínimo vigente, ambas em favor de entidade eleita pelo Juízo da Execução.

1 - Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual é conhecido.

2 - Da preliminar
A defesa arguiu, preliminarmente, nulidade das provas colhidas mediante violação de domicílio, sob o argumento de que não ocorreu a situação de flagrante delito prevista no art. 5º, inc. XI, da CRFB/88. Alegou, ainda que, não bastasse, o apelante teve sua imagem exposta em mídia televisiva como homicida, o que impediu o retorno de sua família para sua residência. Ainda, seu papagaio de estimação, legalmente adquirido, foi recolhido e até o momento não foi devolvido.
A arguição não merece guarida.
Com efeito, conforme se infere dos relatos do policial militar que participou da ocorrência, e não há razões para se duvidar da sua narrativa, o ingresso dos agentes públicos na residência do apelante foi autorizado, pelo que se mostra descabido falar-se em maltrato ao princípio da inviolabilidade do domicílio.
Segundo o declarado pelo agente estatal Thiago de Souza Leandro, em Juízo, a guarnição policial dirigiu-se a um bar, em razão de uma ocorrência na qual deveria ser averiguada a situação de um indivíduo que "estaria caído em frente" ao referido estabelecimento e "teria apanhado bastante". Diante disso, colhendo informações de populares, estes relataram que houve uma briga e "outro indivíduo efetuou dois disparos de arma de fogo". Outra pessoa, ainda, teria dito quem seria o autor dos disparos, informando onde ele residia (mídia audiovisual de evento 64).
A circunstância da notícia da ocorrência de um crime derivar de uma informação privilegiada não obsta a que a autoridade policial tome providências para apurar o fato, porquanto o inquérito policial pode ser encetado pelo Delegado de Polícia em se tratando de crimes de ação penal pública, até mesmo de ofício (art. 5º, inc. I, do Código de Processo Penal).
Nesse norte, assentou o Supremo Tribunal Federal que a persecução penal pode ser instaurada com base em denúncias, sejam elas anônimas ou não, desde que tal comunicação seja sucedida por diligências empreendidas com o propósito de averiguar a veracidade dos fatos nela mencionados (HC n. 105.484, rel. Min. Cármen Lúcia; HC n. 99.490, rel. Min. Joaquim Barbosa; RHC n. 86.082, rel. Min. Ellen Gracie).
No caso vertente, a partir de denúncias de populares, agentes da polícia militar foram informados acerca da identidade do apelante, que estaria portando uma arma de fogo, bem como que teria efetuado disparos com o armamento em aludido bar. Em razão disso, os agentes públicos compareceram ao local indicado na delação, sendo que a entrada policial foi autorizada, conforme já gizado.
Nesse viés: "A casa é asilo inviolável do cidadão enquanto respeitada sua finalidade precípua de recesso do lar. Isso porque o direito constitucional de inviolabilidade domiciliar não se estende a lares desvirtuados, tais como locais ou pontos clandestinos de drogas (TJSP, Ap. Crim. 130.489-3, 1ª Câm. Crim., Rel. Des. Andrade Cavalcanti, j. 1º-2-1993)" (In. MARCÃO, Renato. Tóxicos: Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006: Lei de Drogas. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 276).
Sabe-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, com repercussão geral previamente reconhecida, assentou que "a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados" (Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010).
Não obstante, as razões para o ingresso no domicílio, sem autorização judicial, foram amplamente demonstradas no decorrer da instrução processual.
A prova oral colhida ao longo da persecução penal reforça a hipótese de inexistência de ilegalidade na atuação dos agentes de segurança pública.
Tanto o apelante Pedro Borba Ferrari, quanto sua esposa Morgana Zanelatto Minotto, em momento algum de suas declarações fornecidas sob o crivo do contraditório informaram que o ingresso dos agentes estatais não teria sido procedido sem suas permissões. A esposa do apelante, inclusive, perante o Juízo, asseverou que "pediram para abrir a porta" e "eles entraram", sem manifestar que a...

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