Acórdão Nº 5000847-85.2022.8.24.0038 do Segunda Câmara Criminal, 07-06-2022

Número do processo5000847-85.2022.8.24.0038
Data07 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5000847-85.2022.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: JEAN CARLOS CORREA (RÉU) ADVOGADO: THIAGO YUKIO GUENKA CAMPOS (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Jean Carlos Corrêa, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 155, § 4º, II, c/c o 14, II, do Código Penal, nos seguintes termos:

No dia 21 de dezembro de 2021, por volta das 21h40min., o denunciado dirigiu-se ao "Supermercado Giassi", situado na Rua Doutor João Colin, n. 762, Bairro América, nesta Cidade e Comarca.

No local, imbuído de animus furandi, o denunciado selecionou e escondeu em sua mochila 2 (dois) perfumes da marca Fiorucci, 1 (um) shampoo da marca Dove, 1 (um) condicionador da marca Dove, 2 (dois) licores da marca Schluch e 1 (um) coquetel, produtos avaliados em R$ 387,46 (trezentos e oitenta e sete reais e quarenta e seis centavos).

Ato contínuo, ao passar pelo caixa do estabelecimento comercial, com o intuito de subtrair os referidos produtos mediante fraude, o denunciado apresentou outras mercadorias e simulou ter esquecido sua carteira, sem realizar o pagamento de nenhum dos produtos supracitados.

O crime somente não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do denunciado, vez que funcionários do estabelecimento perceberam a sua ação e o abordaram quando ele estava saindo do local com os produtos escondidos em sua mochila.

O denunciado é multirreincidente (Evento 1).

Concluída a instrução, a Doutora Juíza de Direito julgou parcialmente procedente a exordial acusatória e condenou Jean Carlos Corrêa à pena de 7 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, e 5 dias-multa, arbitrados individualmente no mínimo legal, pelo cometimento do delito previsto no art. 155, caput, c/c o 14, II, do Código Penal (Evento 51).

Insatisfeito, Jean Carlos Corrêa deflagrou recurso de apelação (Evento 60).

Em suas razões, requer o reconhecimento de que o delito era de execução impossível, devido à vigilância efetiva exercida pelos seguranças do estabelecimento.

Pretende, ainda, a declaração da atipicidade material da conduta, pela insignificância do dano ao bem jurídico tutelado.

Subsidiariamente, almeja a revisão da dosimetria da pena, para que seja afastada a exasperação da pena-base em razão dos maus antecedentes, que devem ser valorados apenas enquanto reincidência.

Na segunda fase do procedimento trifásico de dosimetria, pugna pela compensação entre a reincidência e a confissão espontânea.

Quanto ao regime de inicial resgate da privativa de liberdade, pede que seja o aberto, por proporcionalidade e ausência de "fundamentação apta a ensejar regime mais gravoso".

Finalmente, requer seja-lhe reconhecido o direito de recorrer em liberdade (Evento 60).

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 67).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Rogério A. da Luz Bertoncini, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (Evento 6).

VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

No mérito, merece apenas parcial provimento.

A materialidade e autoria dos fatos estão bem assentadas no feito, vindo positivadas no boletim de ocorrência, no auto de exibição e apreensão, no auto de avaliação, e no termo de reconhecimento e entrega, todos no Evento 1, doc1, do inquérito policial; e na totalidade da prova oral, incluindo a confissão integral do Apelante Jean Carlos Corrêa, em ambas as fases procedimentais, acerca da tentativa de subtração de bens avaliados em R$ 387,46, descritos na exordial, da propriedade da Vítima "Supermercado Giassi", tal qual consta na denúncia.

Bem por isso, tais questões não foram objeto de recurso.

1. O Recorrente almeja, no entanto, o reconhecimento da hipótese de crime impossível, pois, "além de o apelante ter sido observado constantemente pelo infalível sistema de monitoramento interno do estabelecimento, também esteve vigiado pelo chefe de segurança do local Gilson Fabrini dos Santos".

A tese, entretanto, não convence.

O art. 17 do Código Penal estabelece as condições para reconhecimento da hipótese de crime impossível: "Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime".

É fato que a ação do Apelante, de colocar produtos no interior de sua mochila, foi flagrada pela equipe que cuidava do sistema de monitoramento eletrônico do estabelecimento, que, então, passou a acompanhá-lo até que passasse pelos caixas sem realizar o seu pagamento. Por isso, foi abordado na sequência, e foi recuperada a res furtiva, sem que o delito pudesse atingir a consumação.

Acontece que a incidência do dispositivo legal apenas estaria configurada se, no caso, efetivamente houvesse absoluta ineficácia do meio ou absoluta impropriedade do objeto, hipóteses não ocorrentes, uma vez que a subtração somente não se aperfeiçoou porque funcionários do estabelecimento flagraram a ação e intervieram antes de que o Recorrente conseguisse livremente deixar o local, o que sabidamente poderia ter ocorrido.

Assim, a existência de sistemas de monitoramento e vigilância apenas torna mais custosa a consumação do crime de furto, porém não impossibilita o agente de praticá-lo, nem sequer torna seu meio absolutamente ineficaz, diante da notória falibilidade humana e dos possíveis problemas nos meios eletrônicos.

Sobre a diferença entre crime impossível e tentativa punível, Júlio Fabbrini Mirabete leciona:

No crime impossível, enquanto se desenrola a ação do agente ela não sofre interferência alheia, ao passo que na tentativa quase sempre a ação é interrompida por injunção externa. Nesta, também, o resultado delituoso é sempre possível porque os meios empregados são, por sua natureza, idôneos, e o objeto contra o qual o agente dirigiu sua conduta é um bem jurídico suscetível de sofrer lesão ou perigo de lesão, ao passo que naquele, o emprego de meios eficazes ou o ataque a objetos impróprios, isto é, a bens jurídicos que não comportam ofensa ou perigo de ofensa, inviabiliza o resultado delituoso (Manual de direito penal. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 159).

O Superior Tribunal de Justiça sumulou a questão: "Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto" (Súmula 567).

Ainda nos dias de hoje o entendimento é mantido:

A presença de sistema eletrônico de vigilância e de agentes no...

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