Acórdão Nº 5000852-76.2021.8.24.0092 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 23-05-2023

Número do processo5000852-76.2021.8.24.0092
Data23 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000852-76.2021.8.24.0092/SC



RELATOR: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO(A): ANTONIO MARCOS GAVAZZONI (OAB SC013240) APELADO: JOAO PEDRO VENTURA (AUTOR) ADVOGADO(A): SIMON MANCIA (OAB SC057083)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação cível interposto por JOAO PEDRO VENTURA contra sentença de parcial procedência (evento 19) da denominada ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com restituição de indébito e indenização por danos morais, a qual foi prolatada nos seguintes termos:
ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:
a) anular o contrato firmado, retornando as partes ao status quo ante:
b) determinar à parte autora que proceda a devolução ao banco réu do valor tomado emprestado, com correção monetária pelo INPC, a partir da data do crédito.
c) determinar à instituição financeira o ressarcimento dos valores descontados indevidamente do benefício da parte demandante, assim como outros pagamentos eventualmente realizados, os quais devem ser corrigidos monetariamente pelo INPC, a partir da data do efetivo desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% a.m. (um por cento ao mês), nos termos do art. 406 do Código Civil c/c 161, § 1º, do CTN, desde a citação, em consonância com o disposto no art. 405 do CC c/c art. 240 do CPC, oportunizada a compensação dos créditos e débitos (368, do Código Civil);
d) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais à parte autora, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que deverá ser corrigido pelo INPC, desde a presente data (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, contados da data da citação (artigo 405 do Código Civil).
Ante o princípio da sucumbência, considerando que a parte autora decaiu de parte mínima dos pedidos, com espeque no art. 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo, moderadamente, em R$ 2.000,00, nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.
Em suas razões recursais (evento 25), a casa bancária sustenta, preliminarmente, a ocorrência de prescrição. Em relação ao mérito argumenta, em síntese, a legalidade do negócio jurídico celebrado entre as partes, ressaltando a inexistência de prova de que o apelado teria sido levado a erro, não se vislumbrando, assim, irregularidade que dê causa à anulação do instrumento. Assevera que, à época da pactuação, o recorrido já não tinha margem consignável em seus rendimentos, inviabilizando a contratação de empréstimo consignado, restando apenas a obtenção de crédito consignado através da adesão ao contrato de cartão de crédito com margem consignável. Aduz a inexistência de termo final a caracterizar dívida impagável, porquanto o débito é extinto com pagamento do débito, na data do vencimento da fatura, constitui liberalidade do autor. Defende que o uso cartão fica constituído e provado pelo saque de valores, razão pela qual não há falar em nulidade. Também, afirma inexistir danos indenizáveis, requerendo, subsidiariamente, a minoração do "quantum". Ainda, discorre acerca do descabimento da restituição de valores, vislumbrando, em caso de manutenção do "decisum", que eventual importância disponibilizada à parte adversa sejam devolvidos ou compensados, e devidamente corrigidos monetariamente, sob pena de enriquecimento ilícito.
Foram apresentadas contrarrazões (evento 32).
Este é o relatório

VOTO


Insurge-se a instituição financeira contra sentença de parcial procedência da ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais.
Os pontos atacados no apelo serão analisados separadamente com o objetivo de facilitar a compreensão.
Prescrição
Como prejudicial de mérito, a recorrente afirma a prescrição da pretensão autoral de indenização dos danos morais e materiais, alegando que a pretensão da parte recorrida, visando indenização por danos morais e materiais, encontra-se prescrita, conforme regra disposta no art. 206, § 3º, V, do Código Civil.
Enuncia referido dispositivo: "Art. 206. Prescreve: [...] § 3º. Em três anos: [...] V - a pretensão de reparação civil; [...]".
Sem razão, a apelante.
Conforme tem se manifestado este Órgão Fracionário, "a pretensão da demandante tem natureza dúplice, qual seja, declaratória, que visa a nulidade do contrato em razão de abusividades e condenatória, que almeja o ressarcimento pelos descontos indevidos, bem como a indenização por danos morais. Contudo, sob qualquer ótica, seja quanto a pretensão declaratória ou, ainda, a condenatória, não há falar em prescrição" (Apelação Cível n. 0302134-35.2019.8.24.0092, rel. Des. Rejane Andersen, j. em 24/9/2019), porquanto em se tratando de relação de trato sucessivo, no qual, a cada desconto indevido, surge uma nova lesão, o prazo prescricional começa a fluir a partir da data do última dedução realizada no benefício previdenciário da autora.
Nesse sentido:
É assente o entendimento desta Corte Superior que em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC e o termo inicial do prazo prescricional, é a partir da data em que ocorreu a lesão, ou seja, a data do pagamento/desconto indevido (STJ,AREsp 1.539.571/MS, rel. Ministro Raul Araújo, j. em 24/9/2019) (sem grifos no original)
E:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com o entendimento desta Corte, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. No tocante ao termo inicial do prazo prescricional, o Tribunal de origem entendeu sendo a data do último desconto realizado no benefício previdenciário da agravante, o que está em harmonia com o posicionamento do STJ sobre o tema: nas hipóteses de ação de repetição de indébito, "o termo inicial para o cômputo do prazo prescricional corresponde à data em que ocorreu a lesão, ou seja, a data do pagamento" (AgInt no AREsp n. 1056534/MS, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2017, DJe 3/5/2017). Incidência, no ponto, da Súmula 83/STJ. 3. Ademais, para alterar a conclusão do acórdão hostilizado acerca da ocorrência da prescrição seria imprescindível o reexame do acervo fático-probatório, vedado nesta instância, nos termos da Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no AREsp 1372834/MS, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, DJe 29/3/2019) (sem grifos no original)
Dessarte, ainda que aplicada a contagem do prazo prescricional de três anos insculpido no art. 206, § 3º, do Código Civil, respectivo lapso sequer teve seu curso iniciado pois, na data do ajuizamento da presente demanda (fevereiro de 2021), o dano discutido sequer havia cessado, conforme se evidencia dos extratos de empréstimos consignados acostados ao evento 1 (extrato 8), que apontam dedução ativa por contrato de cartão.
Portanto, rejeita-se a rebeldia, no ponto.
Contratação via cartão de crédito consignado
Relativamente ao tema, importa esclarecer que, durante o curso do processado, a parte autora defendeu a nulidade da contratação ajustada com a ré, sustentando ter sido vítima de fraude por esta ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), operação diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado, o qual acreditou efetivamente ter celebrado.
No pronunciamento judicial atacado, o Magistrado de Primeiro Grau concluiu pela nulidade do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável, determinando que os valores depositados na conta bancária do autor, atualizados monetariamente pelo INPC, sejam compensados, na forma simples, com os valores descontados indevidamente pelo banco a título de RMC, corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar de cada desembolso.
Em seu reclamo, pretende a apelante a reforma do referido "decisum", a fim de que seja julgada improcedente a demanda, no que assevera, para tanto, a validade do contrato de cartão de crédito consignado, defendendo ter sido entabulado com anuência do demandante, a significar, em consequência, a licitude dos descontos efetuados no seu benefício previdenciário e a inviabilidade de restituição de valores.
Pois bem.
Sobre as modalidades de mútuo bancário, o Banco...

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