Acórdão Nº 5000856-04.2019.8.24.0054 do Primeira Câmara de Direito Civil, 27-10-2022

Número do processo5000856-04.2019.8.24.0054
Data27 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000856-04.2019.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: MARCIO BURINI (REQUERENTE) ADVOGADO: INÁCIO PAVANELLO (OAB SC010133) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (REQUERIDO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por MARCIO BURINI, contra sentença prolatada pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Rio do Sul, que nos autos da ação "DE RESSARCIMENTO DE DANOS" n. 50008560420198240054, ajuizada contra CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos (evento 63, da origem):

(...)

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Arca o autor com o pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, ressalvada a suspensão da exigibilidade em razão da gratuidade já deferida (Ev. 3), nos moldes do art. 98, § 3º, do CPC.

Transitado em julgado, arquivem-se os autos.

Inconformado, o apelante sustentou a incontroversa acerca da interrupção do fornecimento de energia, cuja consequência foi a ocorrência de dano material a ser indenizado, atestado no laudo técnico apresentado junto à inicial. Pugnou pelo provimento do recurso a fim de que a sentença de mérito seja inteiramente reformada ao aduzir: POSTO ISTO, requer a Vossa Excelência, se digne receber o presente recurso, quem for distribuído, haverá de conhecê-lo e dar provimento no mérito, para reformar a sentença, julgando-se totalmente procedente a presente ação de reparação de danos, na forma da razões apresentadas nos termos expostos, condenando-se nos consectários legais. (evento 69 - APELAÇÃO1).

Com as contrarrazões (evento 74, da origem), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

1. Da ocorrência do evento danoso

Inicialmente, há que se ressaltar que o caderno processual indica não haver controvérsia acerca da interrupção de fornecimento de energia elétrica, tendo em vista que a própria apelada trouxe relatório de fornecimento de energia com a informação que alude aos eventos ocorridos entre as datas de 16 a 22 de janeiro e 2018 (evento 9 - anexo 2).

Neste particular, imperioso esclarecer que o tema enfrentado neste apelo já possui respaldo na jurisprudência desta Corte de Justiça que, em casos análogos, reconhece a responsabilidade objetiva da concessionária decorrente de interrupção de fornecimento de energia elétrica e os danos ocasionados em safra de fumo, veja-se um exemplo:

CIVIL - RESPONSABILIDADE CIVIL - CELESC - FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA - INTERRUPÇÃO - PRODUTOR DE FUMO - FENÔMENO CLIMÁTICO PREVISÍVEL - EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE AFASTADA - DANOS MATERIAIS - DEVER DE INDENIZAR APENAS O PREJUÍZO EFETIVAMENTE COMPROVADO1 Presentes os elementos identificadores da relação de consumo, a responsabilidade civil da concessionária de serviço público de abastecimento de energia elétrica é objetiva, com fundamento na lei de proteção ao consumidor.2 As intempéries não associadas a eventos climáticos surpreendentes e catastróficos, malgrado possam figurar como incontroláveis, encontram-se na esfera de previsibilidade do empreendedor, fazendo, portanto, parte do risco assumido ao desenvolver uma atividade no setor de consumo (TJSC, Súm. n. 33).3 A indenização por danos materiais imprescinde da prova do efetivo prejuízo, de modo que o produtor rural deve ser indenizado apenas pelo total de fumo que comprovadamente foi prejudicado pela injustificada interrupção do serviço de energia elétrica prestado pela concessionária de serviço público. (TJSC, Apelação n. 0301355-57.2019.8.24.0035, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 29-06-2021).

Ou seja, a jurisprudência deste Sodalício orientou-se no sentido de que o afastamento da obrigação de indenizar pela ruptura do nexo causal diante da ocorrência de evento imprevisível não admite alegações simplistas no sentido de que a queda no fornecimento deu-se por conta de intempéries comuns à mudança climática cotidiana. Há necessidade de que se trate de eventos naturais incomuns, catastróficos e anormais, capazes de ocasionar prejuízos de larga extensão em residências, estabelecimentos comerciais, lugares públicos, etc, fatos não encontrados nos autos e que a Celesc não comprovou.

Neste particular, o julgamento de mérito pelo juízo de piso diferiu da solução jurídica adotada na miríade de ações correlatas já apreciadas por esta Corte essencialmente fundamentado na seguintes razões:

[...];

Ocorre que na maior parte das demandas os requerentes possuem contrato com alguma fumageira ou com intermediadores, vendem a safra de fumo e recebem por isso, mas não apresentam espontaneamente e logo na petição inicial, como gesto de boa-fé e lealdade substancial e processual, as respectivas notas fiscais, o fazendo apenas após requerimento da parte contrária ou determinação judicial - ressalvando-se que, neste caso, o autor apresentou notas fiscais durante a instrução processual. Assim agindo, omitem informações ao seu alcance, ao passo que o laudo técnico por eles apresentado na grande parte das vezes não esclarece o fato precisamente, em especial à luz das notas fiscais dos produtos que foram comercializados e que podem ou não corroborar suas afirmações.

Além do mais, observa-se que tanto no julgamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência autos nº 2014.044805-2 quanto em diversos outros precedentes, praticamente todos os profissionais que atuam nesse tipo de demanda têm se olvidado de que o Código de Processo Civil regulamenta, nos artigos 381 e seguintes, a produção antecipada de prova para salvaguardar direitos em casos como tais. Não é tecida uma única justificativa plausível sequer para convencer da impossibilidade de se instaurar aquele incidente nos casos concretos. Ora, os plantadores de fumo estão há anos sendo assistidos por advogados, são organizados em associação, têm condições de pagar os laudos técnicos conforme se observa neste caso, e na maioria das vezes obtêm o benefício da gratuidade, e mesmo assim não se utilizam do mecanismo processual adequado para a produção...

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