Acórdão Nº 5000884-05.2020.8.24.0064 do Quinta Câmara de Direito Público, 06-04-2021

Número do processo5000884-05.2020.8.24.0064
Data06 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5000884-05.2020.8.24.0064/SC



RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA


APELANTE: ALINE ESTÉTICA (IMPETRANTE) APELADO: Secretário Municipal de Saúde - MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ - São José (IMPETRADO) E OUTRO


RELATÓRIO


Aline Estética impetrou mandando de segurança em relação a ato atribuído ao Secretário de Saúde do Município de São José, alegando que após advertência verbal de servidores do órgão, suspendeu as atividades de bronzeamento artificial oferecidas em seu estabelecimento.
A sentença foi pela denegação da ordem.
A impetrante recorre e afirma que a aquisição do maquinário se deu porque teve conhecimento de que no Estado de São Paulo o uso é permitido; por isso, acreditou que a atividade era regular em seu Estado de residência. Manifesta a surpresa com que recebeu a advertência dos servidores municipais, ressaltando o prejuízo financeiro pelo óbice à empreitada de atendimentos, que iniciou pela compra do equipamento, eleição de ponto comercial e agendamento de clientes.
Argumenta que em processo ajuizado pelo Sindicato Patronal dos Empregadores em Empresas e Profissionais Liberais em Estética e Cosmetologia do Estado de São Paulo (autos 0001067-62.2010.4.03.6100, da 24ª Vara Federal), houve sentença favorável aos profissionais da categoria que prestam serviços de bronzeamento artificial, pensamento seguido pelo Tribunal de Justiça do mesmo estado. Por questões de isonomia, defende que não se justifica que persevere a proibição, mesmo que não haja precedente local referendando a mesma visão.
Depois, enfatiza que a Anvisa, cuja RDC n. 56/2009 está embasada em um único estudo científico, não pode proibir o exercício de profissão nem suspender atividade. Não há, identicamente, lei específica impedindo o uso do equipamento, o que seria uma exigência à vista do art. 5º, inc. II, da CF. Ademais, ainda que à autarquia especial recaia a atribuição de fiscalização sanitária, o ato normativo criticado tem conteúdo vago e não dita possíveis níveis de exposição segura. Discorre então que o correto, longe de se impedir a utilização, seria possibilitar aos usuários a escolha, desde que cientes dos eventuais riscos.
Busca que seja conferida a tutela antecipada para ter garantida a prestação do serviço de bronzeamento artificial em sua clínica.
Houve contrarrazões nas quais se trouxe que nem mesmo houve autuação do órgão municipal, mas sendo a Anvisa competente para dispor sobre o "controle e fiscalização de produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde", é válida a proibição quanto ao uso de câmaras de bronzeamento artificial. Além do mais, em face do direcionamento da International Agency for Research on Cancer - IARC, órgão ligado à Organização Mundial da Saúde, a inclusão dessa prática no rol de procedimentos cancerígenos, justifica a proibição da agência.
A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso

VOTO


1. A impetrante ataca decisão que ratificou a validade de Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa (RDC n. 56/2009), que dispõe o seguinte:
Art.1º Fica proibido em todo o território nacional a importação, recebimento em doação, aluguel, comercialização e o uso dos equipamentos para bronzeamento artificial, com finalidade estética, baseados na emissão de radiação ultravioleta.
§ 1º Os equipamentos para bronzeamento artificial considerados nesta resolução são os aparelhos emissores de radiação ultravioleta (UV) destinados ao bronzeamento artificial estético.
§ 2º A proibição não se aplica aos equipamentos com emissão de radiação ultravioleta, registrado ou cadastrado na ANVISA conforme regulamento sanitário aplicável, destinados a tratamento médico ou odontológico supervisionado.
A partir daí, as objeções que apresenta orbitam especialmente em torno da liberação da oferta de bronzeamento artificial em clínicas no Estado de São Paulo - decisão cujos reflexos, na sua visão, podem ser transpostos para o caso por questões de isonomia -, e também em face de a Anvisa não deter legitimidade para regular proibições de tamanho alcance, pois restrições ao exercício profissional ou suspensão de atividades só podem ser reguladas por lei em sentido estrito.
Levanta outros argumentos de ordem pouco pragmática, como o prejuízo financeiro e o suporte do ato normativo da Anvisa em um único estudo científico.
Seja como for, são teses que não superam a sentença.
Sob aquela primeira perspectiva, é verdade que sentença proferida na 24ª Vara Federal de São Paulo (autos 0001067-62.2010.4.03.6100) declarou a nulidade da Resolução da Diretoria Colegiada n. 56/2009 da Anvisa, visto que se deu prevalência à liberdade econômica e individual.
Trata-se, no entanto, de demanda ajuizada pelo sindicato da categoria daquela unidade federativa, que pretendia ter assegurado o direito à continuidade do oferecimento do serviço de bronzeamento artificial pelos seus representados em seu âmbito territorial de abrangência. Não convém, portanto, a pretensão para que aquela visão seja meramente estendida para cá, conferindo-lhe efeitos de vinculatividade. Aliás, note-se, é deliberação relativa a processo de 2010...
Em relação aos fatores técnico e científico, não vejo, identicamente, motivos para se ignorar o teor do ato normativo formatado pela Anvisa: não é de se supor que a agência que possui expertise na área e com a atribuição de regulação do setor possa ser substituída, a partir de critérios imprecisos, por decisão do Poder Judiciário, órgão gabaritado para analisar a conformidade do poder de polícia aos limites impostos pela lei de regência.
Soaria pretensioso que, na alegada falta de evidências de que a exposição a raios ultravioleta ocasione danos à saúde, suprimir-se a normatização da Anvisa, optando-se pela liberação do uso do equipamento. A razão para isso, outrossim, é também de ordem pragmática: o modelo de legalidade atualmente vigente supera, em grande medida, uma rigidez quase dogmática sobre a obrigatoriedade de uma manifestação exaustiva pelo Parlamento.
Significa dizer, muito resumidamente, que se insere na atribuição das agências reguladoras tratar das minúcias de ordem técnica a que estarão submetidos determinados agentes econômicos. É uma vocação que naturalmente ostentam, sendo mesmo preferível, pela aptidão profissional, que essas decisões sejam de sua alçada. É claro que estão vinculadas às balizas legais (de caráter abstrato, conforme uma determinada diretriz política), mas isso não inviabiliza que se reconheça a legitimidade de sua atuação.
2. Rememoro o caso célebre recentemente apreciado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da fosfoetanolamina. Em um, por assim dizer, arroubo legislativo o Congresso Nacional franqueou a...

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