Acórdão Nº 5000884-25.2021.8.24.0046 do Terceira Câmara Criminal, 07-12-2021

Número do processo5000884-25.2021.8.24.0046
Data07 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5000884-25.2021.8.24.0046/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

RECORRENTE: JORGE PANIZ (ACUSADO) ADVOGADO: NILSON RIGONI (OAB SC005908) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Jorge Paniz (59 anos à época dos fatos) pela prática, em tese, dos delitos de homicídio qualificado e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (CP, art. 121, § 2º, II e IV e Lei n. 10.826/03, art. 14), em razão dos fatos assim narrados:

"1) Em 29 de maio de 2021, por volta das 15 horas, no bar da comunidade da Linha Cascalho, interior do Município de Palmitos, o denunciado JORGE PANIZ, por motivo fútil e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, com emprego de um revólver, calibre .38, marca Rossi, número de série D921828 (Evento 61 do Inquérito Policial nº 5000779-48.2021.8.24.0046, p. 11), matou a vítima DION LENON PEDERSINI, provocando nela lesão perfuro contundente por projétil de arma de fogo, que foi a causa eficiente de sua morte por choque hipovolêmico, conforme descrito no laudo pericial cadavérico n. 2021.22.02153.21.003-38 (Evento 58 do Inquérito Policial).

Na ocasião, o denunciado chegou ao bar e, em seguida, iniciou uma discussão com terceira pessoa. A vítima Dion Lenon Pedersini, filho do responsável pelo estabelecimento, pediu a JORGE PANIZ que não brigasse no local, tendo o denunciado, de imediato, sacado o revólver que portava e efetuado um disparo contra a vítima, ocasionando sua morte.

O denunciado JORGE PANIZ agiu por motivo fútil, porquanto matou a vítima Dion Lenon Pedersini em decorrência dela solicitar que cessasse a discussão no bar, motivação esta completamente desproporcional ao mal causado.

Ainda, o denunciado cometeu o delito mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, uma vez que a vítima foi surpreendida e não tinha razões para suspeitar da intenção homicida de JORGE PANIZ que a atacou de inopino, utilizando-se de arma de fogo, sem que esta pudesse oferecer defesa minimamente eficaz.

2) No dia 29 de maio de 2021 e nos dias anteriores, na Linha Cascalho e em outras localidades do interior do Município de Palmitos, o denunciado JORGE PANIZ portou arma de fogo de uso permitido, municiada, em condições de uso e funcionamento, consistente em um revólver, marca Rossi, calibre 38, número de série D921828, sem autorização e em desacordo com a determinação legal e regulamentar.

No dia dos fatos, pelo menos desde a manhã, o denunciado portava a arma de fogo antes descrita pela Linha Cascalho e comunidades vizinhas, utilizando-a, mais tarde, para a consecução do primeiro fato antes descrito.

A arma de fogo portada pelo denunciado foi apreendida e, submetida à perícia, mostrou-se eficiente (Evento 61 do Inquérito Policial, Laudo Pericial n. 2021.22.02153.21.004-00)." (Evento 1).

Homologado o flagrante, a prisão foi convertida em preventiva, a fim de garantir a ordem pública (Evento 17 dos autos n. 5000779-48.2021.8.24.0046).

Recebida a denúncia em 21.06.2021 (Evento 3), o acusado foi citado (Evento 7) e apresentou resposta à acusação (Evento 14), por meio de defensor constituído.

Encerrada a instrução, as partes apresentaram alegações finais (Eventos 88 e 97), sobrevindo decisão mista interlocutória de pronúncia, firmada pelo Magistrado Claudio Rego Pantoja, constando da parte dispositiva:

"Ante o exposto, DECIDO:

1. JULGO ADMISSÍVEL o pedido acusatório para PRONUNCIAR e SUBMETER, com fundamento no artigo 413 do Código de Processo Penal, o réu JORGE PANIZ, já qualificado, ao julgamento pelo Tribunal do Júri Popular desta Comarca, dando-o como incurso no artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, e artigo 14 da Lei n. 10.826/03.

2. Intime-se pessoalmente o réu, a defesa e o Ministério Público, nos termos do artigo 420, inciso I, do Código de Processo Penal.

3. NEGO ao réu o direito de recorrer em liberdade, uma vez que permanecem hígidos os motivos que ensejaram a prisão preventiva.'' (Evento 99).

Insatisfeito, Jorge Paniz interpôs recurso em sentido estrito, através de advogado constituído, sustentando: a) absolvição sumária, por ter agido em legítima defesa; b) sucessivamente, afastamento das qualificadoras do crime de homicídio; c) revogação da prisão preventiva; d) aplicação do princípio da consunção em relação ao crime de porte de arma de fogo (Evento 107).

Houve contrarrazões (Evento 114) pelo desprovimento do recurso.

A decisão foi mantida por seus próprios fundamentos (Evento 116).

Em 1º.10.2021, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que, por parecer do Procurador de Justiça Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (Evento 10). Retornaram conclusos em 14.10.2021 (Evento 11).

.

Documento eletrônico assinado por GETULIO CORREA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1579472v6 e do código CRC 0b6818a4.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): GETULIO CORREAData e Hora: 7/12/2021, às 22:56:9





Recurso em Sentido Estrito Nº 5000884-25.2021.8.24.0046/SC

RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA

RECORRENTE: JORGE PANIZ (ACUSADO) ADVOGADO: NILSON RIGONI (OAB SC005908) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

1. Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido e desprovido.

2. O réu foi denunciado pela prática, em tese, dos crimes de homicídio qualificado e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, assim tipificados no CP e na Lei n. 10.826/03, respectivamente:

''Art. 121. Matar alguém:

Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

§ 2° Se o homicídio é cometido:

II - por motivo futil;

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossivel a defesa do ofendido.

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.''

"Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.''

Apontou a defesa, nas razões recursais, que ''a vítima partiu para cima do réu quando ele estava fora e se retirando do local do crime'', tendo este agido em legítima defesa.

2.1. Inicialmente, destaca-se que a decisão interlocutória recorrida (pronúncia) trata-se de simples juízo de admissibilidade, decisão de cunho declaratório, na qual o magistrado procede à análise da existência do crime (materialidade) e de indícios da autoria delitiva.

Não se trata de decisão condenatória propriamente dita, motivo pelo qual, nessa fase processual, eventuais dúvidas que ainda pairem acerca da autoria do delito, bem como sobre o elemento volitivo dos agentes, devem ser dirimidas por meio do Tribunal Popular do Júri, não podendo o togado singular usurpar tal competência outorgada pela própria Constituição (art. 5º, XXXVIII, alíneas "c" e "d", da CF/88).

Da doutrina de Fernando da Costa Tourinho Filho, a propósito:

"Dês que haja prova da materialidade do fato e indícios suficientes de que o réu foi o seu autor, deve o Juiz pronunciá-lo. A pronúncia é decisão de natureza processual (mesmo porque não faz coisa julgada), em que o Juiz, convencido da existência do crime, bem como de que o réu foi seu autor (e procura demonstrá-lo em sua decisão), reconhece a competência do Tribunal do Júri para proferir o julgamento" (Código de processo penal comentado. Saraiva. 14 ed. São Paulo, 2012. v. 2, p. 80).

Acerca do tema, orienta o STJ:

"A pronúncia encerra simples juízo de admissibilidade da acusação, exigindo o ordenamento jurídico somente o exame da ocorrência do crime e de indícios de sua autoria, não se demandando aqueles requisitos de certeza necessários à prolação da sentença condenatória, sendo que as dúvidas, nessa fase processual, resolvem-se pro societate" (AgRg no AREsp n. 1532788, Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 19.09.2019)

"A sentença de pronúncia não encerra juízo de procedência acerca da pretensão punitiva, tão somente viabilizando a competência para o Tribunal do Júri, a quem competirá apreciar o pleito de reconhecimento da legítima defesa, decidindo a lide de acordo com os elementos probatórios produzidos." (AgRg no HC 605.748, Min. Nefi Cordeiro, j. 24.11.2020).

Deste Tribunal, igualmente:

"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA PELO CRIME DE TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, INCISO IV, C/C ART. 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). RECURSO DEFENSIVO. PEDIDO DE IMPRONÚNCIA. INVIABILIDADE. EXISTÊNCIA NOS AUTOS DE PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA PARA A MANUTENÇÃO DO JULGADO. PRESENÇA DE 2 (DUAS) VERSÕES PARA OS FATOS. DÚVIDA A SER DIRIMIDA PELO CONSELHO DE SENTENÇA. REQUISITOS DO ART. 413 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL PREENCHIDOS. MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. PRONÚNCIA PRESERVADA.

PLEITO DE AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO RECURSO QUE DIFICULTOU OU TORNOU IMPOSSÍVEL A DEFESA DA VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE. PRESENÇA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS PARA MANUTENÇÃO DA QUALIFICADORA. EXAME APROFUNDADO DA MATÉRIA QUE COMPETE AO CONSELHO DE SENTENÇA DO TRIBUNAL DO JÚRI.

'A exclusão de qualificadora constante na pronúncia somente pode ocorrer quando manifestamente improcedente, sob pena de usurpação da competência do Tribunal do Júri, juiz natural para julgar os crimes dolosos contra a vida' (STJ, HC 410148/RS, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 03.10.2017).

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO" (Recurso em Sentido Estrito n. 0006427-90.2012.8.24.0020, Des. Ernani Guetten de Almeida, j. 23.01.2018).

"'A pronúncia é mero juízo de admissibilidade; certa a existência do crime, toda e qualquer discussão que...

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