Acórdão Nº 5000914-95.2019.8.24.0057 do Terceira Câmara de Direito Público, 01-11-2022

Número do processo5000914-95.2019.8.24.0057
Data01 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000914-95.2019.8.24.0057/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: MUNICÍPIO DE SANTO AMARO DA IMPERATRIZ/SC (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Santo Amaro da Imperatriz, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ajuizou ação civil pública com pedido de tutela provisória de urgência contra o Município de Santo Amaro da Imperatriz alegando que, com as fortes chuvas que "assolaram" o Município de Santo Amaro da Imperatriz no ano de 2011, inúmeras residências da Rua Antônio Francisco da Silva se encontravam em situação de risco de deslizamento/desmoronamento e, no entanto, o ente Público manteve-se inerte sobre a situação; que, em razão disso, foi instaurado Inquérito Civil n. 06.2013.00013924-3, com a finalidade de apurar os fatos acima delineados, eis que a situação coloca em risco a vida das pessoas que residem e/ou transitam no local; que é necessária a execução de um plano de mitigação de desastre no local; que o Município não adotou as medidas necessárias para eliminar, corrigir e/ou administrar o risco de desmoronamento na região.

Postulou, assim, a condenação do ente Público: i) na obrigação de fazer, consistente na elaboração e execução de um plano de mitigação de desastre na área de risco da Rua Antônio Francisco da Silva; e ii) na obrigação de não fazer, consubstanciada em abster a Municipalidade de expedir licenças, alvarás ou autorizações para implementação de novas residências, ampliação das existentes e parcelamento do solo, na região discutida no processo. Formulou, ainda, pedido liminar.

Postergada a análise do pedido liminar, o Município foi citado e contestou a lide alegando que está agindo dentro das possibilidades e dos recursos de que dispõe para elaborar projetos de mitigação de áreas suscetíveis de deslizamento e inundações no local; que o caso comporta o reconhecimento da ausência de interesse de agir do órgão ministerial, porque não foi demonstrada omissão da Municipalidade em sanar o "problema" destacado na vestibular; que não cabe ao Judiciário intervir em matéria afeta ao Poder Executivo; que a área é monitorada, constantemente, pela Defesa Civil; que o Município está adotando providências na região; que a questão indicada na exordial comporta violação ao Princípio Constitucional da Separação dos Poderes; que não possui dotação orçamentária, no presente momento, para cumprir a obrigação postulada na exordial.

Posteriormente, o pedido liminar foi deferido e, contra essa decisão, foi interposto recurso de agravo de instrumento, que foi parcialmente provido por esta Câmara para alongar os prazos dados (AI n. 5014908-36.2020.8.24.0000).

Após, os argumentos da contestação foram impugnados pelo órgão ministerial e, em seguida, foi proferida sentença, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, nos seguintes termos:

"Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, c/c art. 11 da Lei 7.347/85, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado, a fim de condenar o Município de Santo Amaro da Imperatriz ao cumprimento das seguintes obrigações:

"1. elaborar e executar um plano de mitigação de desastres na área de risco da Rua Antônio Francisco da Silva, mediante projeto técnico firmado por profissional habilitado (prazo: 6 meses para elaboração do projeto e 6 meses para execução das obras);

"2. para garantir a execução dos trabalhos e a segurança dos moradores, realocar os ocupantes das residências que estiverem em área de risco, mediante programa social de moradia ou aluguel social;

"3. enquanto não elaborado e executado o plano, abstenha-se de expedir licenças, alvarás ou autorizações para construção/ampliação/reforma de residências nas áreas de risco daquela rua.

"Confirmo a tutela de urgência anteriormente deferida, porque ainda presentes os requisitos legais, nos moldes da fundamentação acima exposta. Todavia, considerando o conteúdo e a data da decisão proferida pelo TJSC no mencionado agravo (fevereiro deste ano), e sopesando o agravamento da pandemia decorrente da covid-19 desde então, com inegável repercussão sobre as contas públicas e o procedimento para contratação de mão-de-obra, determino que o prazo estabelecido para o cumprimento das medidas começará a fluir a partir da intimação desta sentença.

"Fixo multa diária de R$1.000,00 para o caso de descumprimento das medidas (arts. 497 e 139 do CPC c/c art. 11 da Lei 7.347/85), limitada a R$100.000,00, a ser revertida ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina (FRBL)".

Inconformado, o Município interpôs recurso de apelação repisando, em síntese, os termos expendidos na contestação, reforçando que: i) a condenação imposta pelo juízo importa em violação do Princípio Constitucional da Separação dos Poderes; ii) que não possui verba orçamentária para cumprir a obrigação que lhe foi imposta. Postulou, ao final, a dilação do prazo determinado pelo juízo para cumprimento da medida.

Com as contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal e foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça que, no parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Jacson Côrrea, opinou pelo desprovimento do recurso.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Município de Santo Amaro da Imperatriz, inconformado com a sentença que julgou parcialmente procedente o pedido autoral formulado pelo órgão ministerial na presente ação civil pública, nos seguintes termos:

III - Dispositivo.

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do CPC, c/c art. 11 da Lei 7.347/85, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado, a fim de condenar o Município de Santo Amaro da Imperatriz ao cumprimento das seguintes obrigações:

1. elaborar e executar um plano de mitigação de desastres na área de risco da Rua Antônio Francisco da Silva, mediante projeto técnico firmado por profissional habilitado (prazo: 6 meses para elaboração do projeto e 6 meses para execução das obras);

2. para garantir a execução dos trabalhos e a segurança dos moradores, realocar os ocupantes das residências que estiverem em área de risco, mediante programa social de moradia ou aluguel social;

3. enquanto não elaborado e executado o plano, abstenha-se de expedir licenças, alvarás ou autorizações para construção/ampliação/reforma de residências nas áreas de risco daquela rua.

Confirmo a tutela de urgência anteriormente deferida, porque ainda presentes os requisitos legais, nos moldes da fundamentação acima exposta. Todavia, considerando o conteúdo e a data da decisão proferida pelo TJSC no mencionado agravo (fevereiro deste ano), e sopesando o agravamento da pandemia decorrente da covid-19 desde então, com inegável repercussão sobre as contas públicas e o procedimento para contratação de mão-de-obra, determino que o prazo estabelecido para o cumprimento das medidas começará a fluir a partir da intimação desta sentença.

Fixo multa diária de R$1.000,00 para o caso de descumprimento das medidas (arts. 497 e 139 do CPC c/c art. 11 da Lei 7.347/85), limitada a R$100.000,00, a ser revertida ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina (FRBL) (Evento 26, SENT1 - autos na origem).

O recorrente sustenta em suas razões de apelação que:

i) (...) o Poder Público Municipal vem agindo dentro das possibilidades e dos recursos cabíveis de que dispõe, elaborando estudos e projetos, com o objetivo de atenuar os possíveis riscos de deslizamentos e inundações, conforme os anexos do evento 9, os quais serão implementados de acordo com a necessidade e disponibilidade de recursos (Evento 32, Apelação1, p. 04 - autos na origem);

ii) (...) estando a Administração Municipal agindo nos estritos limites da legalidade, não pode o Judiciário determinar ao administrador a prática de ato que se insere no âmbito de sua discricionariedade administrativa, subtraindo-lhe, ademais, a devida e prévia apreciação, conveniência e oportunidade, sob pena de se verificar, com efeito, ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes, expressamente consagrado no artigo 2º da Carta Magna, ferindo, inclusive, o princípio republicano (Evento 32, Apelação1, p. 05 - autos na origem);

iii) (...) que muito embora não se tenha ainda o plano de mitigação de desastre do local, como já dito, a área é constantemente monitorada pela Defesa Civil, já estando no mapeamento das área de risco do Município, situação esta suficiente a contemplar o pedido do Ministério Público, ou seja, zelar pelo bem estar e segurança do cidadãos que lá residem (Evento 32, Apelação1, p. 06 - autos na origem);

iv) (...) a utilização das escassas verbas existentes no atendimento de pedidos específicos, como no presente caso, coloca em risco todas as demais áreas de atuação do Município, motivo pelo qual deve haver a reforma da sentença ora guerreada (Evento 32, Apelação1, p. 08 - autos na origem);

v) (...)considerando que a obra que o município foi condenado a realizar não encontra qualquer previsão em sua lei orçamentária, inviabiliza a realização da obra determinada (Evento 32, Apelação1, p. 13 - autos na origem).

Por fim, formulou pedido de reforma da sentença e, subsidiariamente, "caso não seja afastada a obrigação do Município, requer que a decisão seja reformada a respeito do prazo determinado para as realização das obras, sendo concedido prazo maior, não inferior a 24 meses, a partir da conclusão do projeto" (Evento 32, Apelação1, p. 14 - autos na origem).

Pois bem.

O conjunto probatório permite uma conclusão segura no sentido de que, de fato, o Município de Santo Amaro da Imperatriz possui a responsabilidade de cumprir as obrigações que lhe foram impostas pelo Juízo.

Primeiro, porque se pode observar das argumentações apresentadas pela Municipalidade no curso do processo que estas se restringem, basicamente, a destacar a inexistência de verba orçamentária necessária para cumprir a ordem emanada na sentença.

Segundo, porquanto a própria Municipalidade reconhece, de forma expressa, a existência de "riscos" no local discutido nos autos...

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