Acórdão Nº 5000917-71.2021.8.24.0092 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 03-11-2022

Número do processo5000917-71.2021.8.24.0092
Data03 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000917-71.2021.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO

APELANTE: BANCO AGIBANK S.A (RÉU) APELADO: MARIA JOSE SILVA LEITE (AUTOR)

RELATÓRIO

Por brevidade, adota-se o relatório da sentença (evento 23), verbis:

MARIA JOSE SILVA LEITE, propôs ação de revisão de contrato em face de BANCO AGIBANK S.A, ambos devidamente qualificados nos autos, sustentando, em síntese, a existência de cláusulas ilegais e abusivas no contrato de empréstimo firmado pelas partes. Requereu a adequação do referido contrato aos parâmetros permitidos pela lei, pleiteando, especificamente: 1) a aplicação dos ditames do Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus da prova; 2) a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central para empréstimo; 3) a restituição em dobro ou de forma simples dos valores cobrados indevidamente. Por fim, pugnou a procedência dos pedidos iniciais, com a condenação da parte ré ao pagamento do ônus sucumbencial e a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Apresentou procuração e documentos.

Concedida a justiça gratuita e determinada a citação (evento 3), a instituição financeira apresentou contestação (evento 11), arguindo, preliminarmente, a existência de conexão e a falta de interesse de agir. Alegou, no mérito, a licitude do contrato, pois firmado livremente pelas partes, devendo, portanto, ser respeitado. Carreou aos autos procuração e documentos.

Sobreveio réplica (evento 16), na qual a parte autora rebateu as preliminares arguidas pela instituição financeira e reiterou os pedidos formulados na proemial.

No evento 17, o banco/réu apresentou proposta de acordo, sobre a qual manifestou-se a parte autora no evento 21, em discordância.

Vieram-me conclusos.

É o relatório.

Entregando a prestação jurisdicional, o magistrado a quo julgou procedente a demanda, nos seguintes termos:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, I, do CPC, resolvo o mérito e JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos na ação de revisão de contrato por MARIA JOSE SILVA LEITE em face de BANCO AGIBANK S.A, para, descaracterizando a mora nos termos da fundamentação, limitar os juros remuneratórios à taxa de 119,20% ao ano e determinar a repetição simples de eventual indébito ou compensação, desde que verificado pagamento a maior (dos juros remuneratórios estipulados na avença), a ser apurado na fase de liquidação de sentença por simples cálculo aritmético, corrigidos em índice da CGJ e acrescidos de juros moratórios de 12% a.a., desde a data da citação.

Ante o princípio da sucumbência, considerando que a parte autora restou vencedora, condeno a instituição financeira ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do artigo 85, §8º do CPC (o proveito econômico é desconhecido nesta data e uma porcentagem sobre o valor da causa resultaria em remuneração irrisória ao advogado), corrigidos monetariamente a partir da data da publicação desta e acrescidos de juros de mora a partir do trânsito em julgado.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, oportunamente, arquivem-se. (evento 23)

Irresignada, a casa bancária interpôs recurso de apelação alegando, em suma: a) a impossibilidade de revisão contratual; b) a ausência de abusividade nos juros remuneratórios pactuados; c) subsidiariamente, a necessária aplicação da taxa média de mercado, em dobro; d) a impossibilidade de restituição de valores porquanto regularmente cobrados. Forte em tais argumentos, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 30).

Ofertadas contrarrazões (evento 47), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça e, distribuídos, vieram-me conclusos.

É, no essencial, o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Banco Agibank S.A. em face da sentença que julgou procedente a "Ação de Revisão de Taxa de Juros c/c Restituição de Valores" n. 5000917-71.2021.8.24.0092, movida em seu desfavor por Maria José Silva Leite.

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.

1. Da possibilidade de revisão contratual

Alega o banco réu, a inexistência de pressupostos para a revisão contratual porquanto seus termos foram livremente avençados entre as partes, com cláusulas previstas em atendimento à legislação aplicável.

Com efeito, quanto à revisão dos contratos, encontra-se sumulado o entendimento de que "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras" (Súmula n. 297 do STJ), sendo um direito básico do consumidor "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas" (art. 6º, V, Lei n. 8.078/1990).

Logo, há de ser mitigado o princípio "pacta sunt servanda", mormente porque os contratos bancários apresentam nítido caráter de adesão, conforme disciplina o art. 54, caput e § 1º, do CDC:

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato.

Da jurisprudência, cita-se precedente do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ARRENDAMENTO MERCANTIL. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO DO PROCESSO. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO. MERA NEGATIVA. IMPUGNAÇÃO DEFICIENTE. ENUNCIADOS 283 DA SÚMULA DO STF E 182 E 297 DO STJ. ARGUIÇÃO INFUNDADA. [...] 2. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras" (Súmula 297, do STJ). 3. Como decorrência disso, é pacífica na jurisprudência deste Tribunal Superior a possibilidade de revisão das cláusulas dos contratos bancários [...] (AgRg no REsp 1385831/PI, relª. Minª. Maria Isabel Gallotti. J. em: 24-6-2014). (grifei)

Assim, admitida a mitigação do princípio pacta sunt servanda sob a hermenêutica consumerista, não merece acolhida a tese do recorrente.

2. Dos juros remuneratórios

Sustenta o apelante, a necessária...

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