Acórdão Nº 5000919-41.2022.8.24.0016 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 04-10-2022

Número do processo5000919-41.2022.8.24.0016
Data04 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5000919-41.2022.8.24.0016/SC

RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN

APELANTE: NELSON DO PRADO (AUTOR) ADVOGADO: BRUNO HENRIQUE MAGGIONI (OAB SC051355) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: FELIPE BARRETO TOLENTINO (OAB SC057388A)

RELATÓRIO

NELSON DO PRADO ajuizou ação declaratória de nulidade c/c repetição de indébito e indenização por danos morais (RMC) em face de BANCO BMG S.A, ao argumento de que, em síntese, está sofrendo descontos indevidos em seu benefício previdenciário, os quais são realizados a título de reserva de margem consignável oriunda de contrato de cartão de crédito que aduz ter sido contratado mediante um desvirtuamento da real operação de crédito que pretendia contratar.

Concedido o benefício da justiça gratuita à parte autora (evento 4).

Contestação apresentada (evento 12).

Réplica no evento 20.

Sobreveio sentença de mérito, com o seguinte dispositivo (evento 24):

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados por Claudino Antônio Cristóvão em face do Banco BMG S.A. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Suspensa a exigibilidade das verbas sucumbenciais, porquanto a parte demandante é beneficiária da justiça gratuita (art. 98, § 3º, do CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Com o trânsito em julgado, inexistindo outras providências, arquivem-se com as devidas baixas.

Irresignada, a parte requerente interpôs recurso de apelação (evento 29), no qual requer: a) seja declarada a inexistência da contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito e da reserva de margem consignável, a título de RMC (cartão de crédito); b) a condenação da instituição financeira ré ao pagamento de danos morais, no valor sugerido de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e à repetição do indébito, em dobro; c) a inversão dos ônus sucumbenciais, com a condenação do banco demandado ao pagamento integral das custas processuais.

Contrarrazões no evento 34.

É o relatório.

VOTO

Realizada a admissibilidade recursal, passa-se à análise das insurgências levadas ao duplo grau de jurisdição.

1 Litigância de má-fé

No que tange ao pedido da casa bancária em contrarrazões referente à prática de advocacia predatória e alegada má-fé do procurador do autor diante da propositura de inúmeros processos da mesma natureza do aqui tratado, é de ser rejeitado, uma vez que não configurada a conduta temerária apontada, bem como incabível, neste grau de jurisdição, a apuração do alegado.

Neste sentido, já disse esta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM DESCONTO EM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC, EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.CONTRARRAZÕES DO BANCO. SUSTENTADA INDISPENSABILIDADE DE INTIMAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA COMPARECER EM JUÍZO PARA CIÊNCIA E CONFIRMAÇÃO DO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. DESNECESSIDADE, PORQUANTO O DEMANDANTE SUBSCREVEU O INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO E DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA, O QUE, POR SI SÓ, JÁ VALIDA A CIÊNCIA E O DESEJO DA PARTE COM O AJUIZAMENTO DO FEITO. OUTROSSIM, ALMEJADA CONDENAÇÃO DA PENA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DO PROCURADOR DA PARTE AUTORA EM RAZÃO DO AJUIZAMENTO DE AÇÕES SIMILARES "EM LOTE". INVIABILIDADE. CAUSÍDICO QUE NÃO FAZ PARTE DA RELAÇÃO PROCESSUAL INSTAURADA, PELO QUE SE TORNA IMPOSSÍVEL SUA CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ [...].RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (Apelação n. 5004932-79.2020.8.24.0040, rel. José Maurício Lisboa, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 22-4-2021, grifo nosso).

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATO, COM PEDIDOS DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCONTOS DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, QUE, ACOLHENDO O PEDIDO SUBSIDIÁRIO, DETERMINOU À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA REQUERIDA QUE PROCEDA, NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS, A READEQUAÇÃO DOS TERMOS DO CONTRATO DE "CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO", DE MODO A, DENTRE OUTRAS MEDIDAS, LIMITAR OS JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA PERMITIDA PELA LEGISLAÇÃO E PELO INSS.[...].PARTE RÉ QUE ALMEJA A CONDENAÇÃO DA ADVOGADA DA PARTE AUTORA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, ALÉM DE PLEITEAR A EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS AO NUMOPEDE, À ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, AO MINISTÉRIO PÚBLICO E À AUTORIDADE POLICIAL, PARA QUE POSSAM SER APURADOS INDÍCIOS DE INFRAÇÕES DISCIPLINARES E OCORRÊNCIA DE CONDUTA TÍPICA, SOB A ARGUIÇÃO DE PRÁTICA DE CONDUTA TEMERÁRIA NO AJUIZAMENTO DE INÚMERAS AÇÕES "EM LOTE", PRATICAMENTE IDÊNTICAS. DESACOLHIMENTO. SANÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ ENDEREÇADA À PARTE, E NÃO A SEU PATRONO. RECORRENTE, ADEMAIS, QUE PODE BUSCAR DIRETAMENTE AS AUTORIDADES OU O ÓRGÃO DE CLASSE COMPETENTES, CONFORME O CASO, CASO ENTENDA HAVER INDÍCIOS DE INFRAÇÕES E DE TIPOS PENAIS. [...]. (Apelação n. 5000072-52.2019.8.24.0175, rel. Tulio Pinheiro, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 29-10-2020, sublinhei).

Do voto:

A súplica não pode prosperar, não apenas considerando que a sanção por litigância de má-fé é endereçada à parte, e não a seu patrono (v.g. Apelação Cível n. 2012.080167-4, rel. Des. Jorge Luis Costa Beber, j. em 24.09.2015), mas também o fato de o próprio insurgente, caso entenda haver indícios de infrações e de tipos penais (o que, por ora, não se pode aferir à luz do que foi anexado), poder buscar diretamente as autoridades administrativamente ou o órgão de classe competentes, conforme o caso.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. [...] ALEGAÇÃO DO BANCO RÉU DE PRÁTICA DE "ADVOCACIA PREDATÓRIA" PELO PROCURADOR DA AUTORA. AÇÕES JUDICIAIS PROPOSTAS COM A MESMA PRETENSÃO EM FACE DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS QUE NÃO FAZ DO PROCURADOR UM LITIGANTE DE MÁ-FÉ. ASSINATURA NA PROCURAÇÃO E NA DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA QUE DEMONSTRA A CIÊNCIA E A INTENÇÃO DA AUTORA DE MOVER A PRESENTE DEMANDA (Apelação n. 5001416-34.2020.8.24.0175, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 17-12-2020).

E, corpo do acórdão:

''[..] Se não o fez a tempo e modo é porque assim entendeu desnecessário. A alegação em tela, nesta fase processual, data venia, flerta com a litigância de má-fé, porquanto se aproxima do proceder de modo temerário (art. 80, V, CPC).

Ainda, o suposto ajuizamento de centenas de ações versando sobre os mesmos pedidos e causas de pedir patrocinadas pelo procurador da autora não o transforma, por si só, em causídico agressor. Isso porque se trata de seu ofício e, pelo visto, da matéria que, por ora, mais lhe condiz.

Igualmente, mostra-se descabido, no presente momento e através deste Colegiado, oficiar a Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério Público e a competente autoridade policial sobre os fatos aqui alegados, mormente porque, como já explanado, tais providências podem ser adotadas diretamente pelo réu''.

Rejeita-se, portanto, a alegação de litigância de má-fé.

2 Legalidade do contrato firmado entre as partes

Sustenta a parte apelante que a sentença singular deve ser reformada para declarar a inexistência da contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito, o qual originou os descontos a título de reserva de margem consignável, realizados no seu benefício previdenciário.

Para tanto, alega que sua intenção era apenas a de fazer um empréstimo consignado simples e jamais a de contratar cartão de crédito, o qual aduz nunca sequer ter utilizado ou desbloqueado. Argumenta, ainda, que a manutenção dos termos do contrato sub judice implicará em uma dívida vitalícia e impagável, a qual representa obrigação totalmente desproporcional ao consumidor.

Depreende-se, portanto, que a celeuma principal cinge-se na verificação da (i)legalidade da contratação de empréstimo de numerário, por meio de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) e, também, na averiguação da existência de eventual vício de consentimento em relação à referida contratação.

Compulsando detidamente o caderno processual, verifica-se, por incontroverso, que houve uma transação formalizada pelas partes para realização de empréstimo de dinheiro, o qual se consolidou por meio do documento "termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado Banco BMG e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento", acostados no evento 12, CONTR2.

Entretanto, apesar de os referidos documentos estarem formalmente perfeito e possuírem a assinatura da ora parte recorrente, o contexto fático-probatório coligido nos autos, revela uma ilicitude na referida contratação, a qual se materializa no fato de que a parte autora foi induzida a contratar o cartão de crédito em questão com o fim único e exclusivo de viabilizar uma operação financeira de mútuo, qual seja, o empréstimo na modalidade consignado, o qual lhe é disponibilizado em razão da sua condição de aposentado pelo Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.

Oportunamente, cabe destacar que a casa bancária não apresentou as faturas do cartão de crédito supostamente contratado pela parte autora para fins de aquisição de produtos ou pagamento de serviços.

Doutro vértice, dessume-se dos autos que a instituição financeira recorrida sequer comprovou o envio ou a efetiva entrega do aludido cartão no endereço do demandante, o que poderia ser facilmente provado por meio da apresentação de documento idôneo assinado pela parte.

Sendo assim, tem-se por evidente que a pretensão da parte autora, ora apelante, era firmar, tão somente, o denominado "empréstimo consignado puro e simples", com parcelas fixas e preestabelecidas e não a de adquirir cartão de crédito que, conforme já salientado, não foi sequer utilizado para aquisição de produtos e serviços de consumo (fim específico de um cartão de crédito).

Com efeito...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT