Acórdão Nº 5000941-21.2020.8.24.0000 do Segunda Câmara de Direito Público, 31-08-2021

Número do processo5000941-21.2020.8.24.0000
Data31 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5000941-21.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

AGRAVANTE: COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN AGRAVADO: MUNICÍPIO DE LAGUNA/SC

RELATÓRIO

Trata-se de agravo por instrumento interposto por COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Laguna, Pablo Vinicius Araldi que, em "ação de obrigação de fazer c/c preceito cominatório e pedido de tutela provisória de urgência" proposta pelo Município de Laguna em desfavor da parte ora agravante, deferiu o pedido de tutela de urgência para determinar aos réus que "franqueiem a entrada do Interventor designado no Decreto 6.169/2020 (Outros 10), possibilitando a este cumprir os fins do Decreto mencionado sem qualquer impedimento ou obstrução por parte dos demandados ou de seus servidores, sob pena de multa diária".

A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos (Evento 03 do processo originário):

"Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c preceito cominatório e pedido de tutela provisória de urgência movida pelo Município de Laguna em face da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - Casan, Roberta Maas dos Anjos e Diego Rodrigues, todos qualificados, por meio da qual busca a concessão de tutela de urgência a fim de que os requeridos franqueiem a entrada do Interventor designado pelo Decreto municipal, bem como possa cumprir os fins do Decreto sem qualquer impedimento ou obstrução por parte dos demandados ou respectivos servidores, sob pena de astreintes.

Sabe-se que na antecipação da tutela o Juiz cuida de abreviar a prestação jurisdicional de mérito que ao final seria proferida, eis que, como leciona Luiz Guilherme Marinoni, "não é razoável e nem justo que se imponha ao autor o ônus do tempo do processo" (Tutela Antecipatória, Julgamento Antecipado e Execução Imediata da Sentença, RT, 1996, p. 104).

Todavia, não seria razoável nem justo aplicar referido instituto indiscriminadamente, sob pena de, com o pretexto de celeridade e efetividade, acabar-se por promover lesões irreparáveis ou de difícil reparação à parte contrária.

Percebe-se, pois, que a tutela de urgência é medida excepcional, somente deferível quando rigorosamente presentes os pressupostos autorizadores, a saber: a) probabilidade do direito; b) perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo; e c) inexistência de risco de irreversibilidade do provimento antecipado (CPC, art. 300 e art. 298, §3º).

Por fim, é certo que, na aplicação do disposto no art. 300 do CPC, deve o magistrado ter sempre em conta o princípio constitucional da proporcionalidade, cabendo-lhe fazer a ponderação entre os direitos postos em risco e decidir no sentido de evitar lesão àquele que, à luz da Constituição, tiver preponderância sobre o outro.

Preceitua o artigo 175, parágrafo único, inciso I da Constituição Federal:

Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Parágrafo único. A lei disporá sobre:

I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

[...]

Observa-se que, conforme determinação da Carta Magna, a lei disporá inclusive sobre a fiscalização da concessão. Disposições que foram devidamente redigidas através da Lei 8987/95. Deste modo, tem-se que:

Art. 29. Incumbe ao poder concedente:

I - regulamentar o serviço concedido e fiscalizar permanentemente a sua prestação;

II - aplicar as penalidades regulamentares e contratuais;

III - intervir na prestação do serviço, nos casos e condições previstos em lei; (grifo nosso)

[...]

Assim, dados os documentos apresentados juntamente com a inicial, verifica-se que o ente público exerceu, por meio do Decreto 6.169/2020 o seu poder de intervenção na concessão efetuada, poder este intimamente ligado ao poder de controle da Administração Pública e previsto na Lei 8987/95, como visto anteriormente.

O ato emanado do Executivo municipal encontra vasto lastro fático e jurídico para sua edição. Pela documentação que acompanha a inicial, tem-se que a concessionária CASAN vem executando o serviço concedido de forma muito aquém do contratado e esperado. Pelo que dos autos consta, a requerida vem reiteradamente descumprindo a legislação ambiental vigente, ensejando a atuação dos órgãos ambientais IMA e FLAMA, bem como da agência reguladora ARESC, em diversas oportunidades.

Assim, a expedição do Decreto n. 6.169/2020 pelo Sr. Prefeito Municipal se encontra dentro de sua esfera de competência, sendo o ato normativo plenamente válido.

Diante de tal contexto, não cabe à concessionária ou a qualquer de seus agentes impedir a execução da norma. A insatisfação com seu conteúdo deverá ser manifestada pelos meios previstos em lei, caso assim entenda pertinente, e não com a simples negativa de reconhecimento do ato.

Assim sendo, mostra-se o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela como o mais acertado para o caso em apreço, visto que se verifica estarem presentes os requisitos do art. 300 do CPC.

Pelo exposto, DEFIRO a medida postulada pela parte autora e, em consequência, determino aos réus que franqueiem a entrada do Interventor designado no Decreto 6.169/2020 (Outros 10), possibilitando a este cumprir os fins do Decreto mencionado sem qualquer impedimento ou obstrução por parte dos demandados ou de seus servidores, sob pena de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), até o limite de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), para os réus Roberta Maas dos Anjos e Diego Rodrigues, bem como multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais), até o limite de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), para a concessionária CASAN.

Designo audiência conciliatória para o dia 03/02/2020, às 17:30 horas, tendo em vista a relevância e urgência do caso concreto.

Cumpra-se, com urgência, pelo oficial de justiça plantonista, ficando desde logo autorizada a requisição de auxílio policial, caso entenda necessário.

Comunique-se, ainda, a Polícia Militar de que fica autorizado ao interventor a requisição de auxílio policial para o caso de obstrução ou impedimento dos trabalhos por parte dos réus ou de quaisquer outros servidores da CASAN, o que configuraria, em tese, crime de desobediência."

Em suas razões recursais, a parte agravante sustenta, em apertada síntese, haver ilegalidades no Decreto n. 6.169/2020, o qual determinou a intervenção sobre os serviços prestados pela CASAN, porquanto, segundo defende, não houve instauração de procedimento administrativo com prazo para eventuais correções (art. 38, § 3º, da Lei n. 8.987/1995) nem indicação da Agência Reguladora (cláusula "14.2" do Contrato de Programa firmado no Convênio n. 014/2008).

Afirma que há urgência a justificar a antecipação da tutela uma vez que a intervenção pode prejudicar a continuidade dos serviços de água e esgoto prestados à população.

Postulou a antecipação da tutela recursal e, por fim, a reforma da decisão de primeiro grau (evento 1, 2G).

Houve o deferimento da almejada antecipação de tutela recursal, porquanto "há prova convincente, ao menos nesta fase, à vista dos documentos coligidos, da verossimilhança do alegado, pois, a teor do Ofício n. 46/2020, expedido pela Aresc - Agência de Regulação de Serviços Públicos em Santa Catrina, em 15.1.2020 (evento 1 - anexo 6), não houve a indicação, por parte dela, de intervenção, circunstância que afronta o disposto no Contrato de Programa, firmado entre agravante e agravado (evento 1 - anexo 8)" (evento 09, 2G).

Em seguida, houve pedido de reconsideração por parte do Município de Laguna

Juntadas as contrarrazões (evento 23, 2G), os autos voltaram conclusos, sendo redistribuídos a este Relator.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Eliana Volcato Nunes, opinando pelo conhecimento e não provimento do presente recurso (Evento 28, 2G).

É o breve relatório.

VOTO

Inconformada com o pronunciamento judicial que deferiu o pedido de tutela de urgência para determinar aos réus que "franqueiem a entrada do Interventor designado no Decreto 6.169/2020 (Outros 10), possibilitando a este cumprir os fins do Decreto mencionado sem qualquer impedimento ou obstrução por parte dos demandados ou de seus servidores, sob pena de multa diária"; COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN interpôs o presente recurso de agravo por instrumento.

Conheço do reclamo, porquanto satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

Inicialmente, a análise da controvérsia enseja uma breve resenha acerca dos fatos ocorridos na lide, afetos aos auto conexos - o mandamus n. 5000190-11.2020.8.24.0040 impetrado pela CASAN contra ato tido como ilegal do Prefeito do Município de Laguna e da Presidente da Fundação Lagunense do Meio Ambiente (FLAMA) - , bem como aos presentes autos, vale dizer, à "ação de obrigação de fazer c/c preceito cominatório e pedido de tutela provisória de urgência" n. 5000249-96.2020.8.24.0040 proposta pelo Município de Laguna em desfavor da CASAN.

Narra a parte agravante, em apertada síntese, que em 2 de abril de 2012 celebrou Contrato de Programa com o Município de Laguna, consectário do convênio n. 014/2008, firmado entre o Estado de Santa Catarina, Casan e o Município de Laguna, e que desde então vem cumprindo integralmente com suas obrigações contratuais.

Ocorre, entretanto, que, segundo a parte agravante, o Município de Laguna teria violado seu direito, uma vez que, na temporada de verão do ano de 2019, decretou a intervenção nos serviços de água e esgoto administrados pela agravante, com a consequente nomeação de um profissional particular, a escolha do município, para administração dos serviços.

Alega a parte agravante que no pacto estabelecido entre as partes consta na cláusula...

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