Acórdão Nº 5000953-35.2020.8.24.0000 do Sétima Câmara de Direito Civil, 19-11-2020

Número do processo5000953-35.2020.8.24.0000
Data19 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5000953-35.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador OSMAR NUNES JÚNIOR

AGRAVANTE: UNIMED GRANDE FLORIANÓPOLIS - COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO ADVOGADO: MILTON LUIZ CLEVE KUSTER (OAB SC017605) AGRAVADO: CARLOS ALBERTO FULLGRAF ADVOGADO: LAURO MACHADO LINHARES (OAB SC003184)

RELATÓRIO

Cuido de agravo de instrumento interposto por Unimed Grande Florianópolis - Cooperativa de Trabalho Médico contra decisão interlocutória proferida nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenizatória por danos morais, autuada sob o n. 50078252420198240090, ajuizada por Carlos Alberto Fullgraf em face da ora agravante.

Em sede liminar, o juízo a quo deferiu a tutela de urgência requerida, determinando à operadora de saúde ré que fornecesse o medicamento Revolade 75mg ao demandante, conforme indicação médica, no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, no limite de R$ 36.000,00.

Da decisão, insurgiu-se a requerida, alegando, em síntese, que o contrato firmado possuiria exclusão expressa para o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar, além de que excluiria também todos os procedimentos não listados no rol da ANS. Ainda, também argumenta que a imposição de tal obrigação ocasionaria em um nítido desequilíbrio contratual.

Assim, requereu a reforma do interlocutório vergastado com o afastamento da tutela de urgência concedida na origem.

Decorrido o prazo sem a apresentação de contrarrazões, vieram os autos conclusos.

É o relato necessário.

VOTO

1. ADMISSIBILIDADE

A admissibilidade do recurso, bem como o presente julgamento, será realizada sob o enfoque do CPC/2015, vigente à época da publicação da decisão recorrida, consoante Enunciado Administrativo n. 3 do STJ.

O prazo para a interposição do agravo foi respeitado (Evento 23 - origem), e foi recolhido o devido preparo (Evento 4).

Ainda, os interesses recursais são manifestos e suas razões desafiam os fundamentos da decisão, encontrando-se satisfeitos, pois, os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. MÉRITO

Sustenta a agravante que equivocado estaria o juízo da origem ao conceder a tutela de urgência pleiteada pelo agravado, à medida que não estaria configurada, no caso, a plausibilidade do direito alegado.

Afirma que o contrato firmado entre as partes possui exclusão expressa de todos os procedimentos não listados no rol da ANS - o qual afirma não se tratar de lista exemplificativa, mas, sim, taxativa -, bem como que o medicamento seria de uso domiciliar e não estaria coberto pelo plano.

Assim, requer a reforma da decisão vergastada com o afastamento da tutela de urgência concedida.

De início, ressalto que à presente demanda é aplicado o Código de Defesa do Consumidor, nos termos de seus arts. 2º e 3, bem como por força da Súmula 608, do STJ, que dispõe: "aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão".

Pois bem, sabe-se que o intuito da contratação de plano de saúde pelo consumidor é justamente a busca de segurança para quando necessária for a prestação de assistência médica, como assim esclarece a doutrinadora Claudia Lima Marques:

O objeto principal destes contratos é a transferência (onerosa e contratual) de riscos referentes a futura necessidade de assistência médica ou hospitalar. A efetiva cobertura (reembolso, no caso dos seguros de reembolso) dos riscos futuros à sua saúde e de seus dependentes, a adequada prestação direta ou indireta dos serviços de assistência médica (no caso dos seguros pré-pagamento ou de planos de saúde semelhantes) é o que objetivam os consumidores que contratam com essas empresas. (...) Esta é justamente a obrigação do fornecedor desses serviços: prestar assistência médica-hospitalar ou reembolsar os gastos com saúde, é a expectativa legítima do consumidor, contratualmente aceita pelo fornecedor. (MARQUES. Claudia Lima. Conflitos de Lei no Tempo e Direito Adquirido dos Consumidores de Planos de Saúde e Seguros de Saúde. In Saúde e Responsabilidade: seguros e planos de assistência privada à saúde. São Paulo. Revista dos Tribunais).

Nessa senda, também é sabido - e pacificado pela jurisprudência do STJ - que existente previsão contratual para cobertura de determinada doença, bem como recomendação de médico especialista, não pode a operadora do plano negar fornecimento de tratamento, exames ou medicamentos aos seus beneficiários, pois estes, por questões técnicas, apenas podem ser baseados em indicação médica com anseio na redução de riscos e na preservação da saúde do paciente.

Aqui, registro:

O plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado, sendo abusiva a negativa de cobertura do procedimento, tratamento, medicamento ou material considerado essencial para sua realização de acordo com o proposto pelo médico. O fato do procedimento não constar do rol da ANS não afasta o dever de cobertura do plano de saúde, tendo em vista que se trata de rol meramente exemplificativo. (AgInt no AREsp 1345913/PR, Rel. Mi. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/02/2019, DJe 27/02/2019)

Segue essa mesma linha de entendimento a jurisprudência desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (ADIMPLEMENTO CONTRATUAL) COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA C/C REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PLANO DE SAÚDE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. CONDENAÇÃO DA OPERADORA A CUSTEAR AS DESPESAS DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO POR RADIOFREQUÊNCIA. REJEITADA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INCONFORMISMO DA OPERADORA RÉ. NEGATIVA DO TRATAMENTO SOLICITADO (CIRURGIA POR RADIOFREQUÊNCIA) SOB ALEGAÇÃO DE TAL TÉCNICA NÃO TER ESPECIFICAÇÃO NO ROL DA ANS. IRRELEV NCIA. LISTAGEM DE COBERTURAS MÍNIMAS A SEREM OFERECIDAS PELAS OPERADORAS DE SAÚDE. REGULAMENTO QUE NÃO DESINCUMBE A ACIONADA DA SUA OBRIGAÇÃO CONTRATUAL DE CUSTEAR AS DESPESAS DO TRATAMENTO. AO REVÉS, RECONHECIDO PELA OPERADORA QUE HÁ COBERTURA CONTRATUAL, POR SEGMENTO SIMPLES, PARA O PROCEDIMENTO CIRÚRGICO SOLICITADO. RECUSA IMPOSTA EXCLUSIVAMENTE EM RAZÃO DA TÉCNICA (RADIOFREQUÊNCIA) A SER EMPREGADA NA CIRURGIA. CONDIÇÃO ABUSIVA. AO PLANO DE SAÚDE INCUMBE APENAS SELECIONAR AS DOENÇAS COBERTAS, MAS NÃO AS TERAPIAS OU OS PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS QUE MELHOR CONVÊM À CURA DO PACIENTE. FUNÇÃO EXCLUSIVA DO MÉDICO HABILITADO, QUE DEVE SER ACATADA. ADEMAIS, INEXISTENTE EXCLUSÃO EXPRESSA ACERCA DA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA NOS MOLDES REQUERIDOS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INTERPRETAÇÃO CONTRATUAL QUE DEVE SER FEITA DA FORMA MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. EXEGESE DO ART. 47 DO CDC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0302729-54.2014.8.24.0045, de Palhoça, rel. Des. Cláudia Lambert de Faria, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 30-05-2017). (grifei)

Isso posto, analisando os autos, tenho que restou incontroverso que as partes possuem contrato de prestação de serviços de assistência à saúde com cobertura médico-hospitalar (Evento 33, Contrato 4 - origem), cabendo destaque à previsão expressa de cobertura contratual a serviços de "apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais, incluindo procedimentos cirúrgicos ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente, mesmo quando realizados em ambiente hospitalar", além da "cobertura de medicamentos registrados e regularizados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA" (Cláusula 4ª, itens 3 e 5).

Inconteste também que o beneficiário foi diagnosticado com a doença púrpura trombocitopênica imune - CID D 69.3 (Evento 1, Outros 7 - origem), razão pela qual lhe foi recomendado por médica...

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