Acórdão Nº 5000969-41.2021.8.24.0036 do Primeira Câmara Criminal, 08-04-2021

Número do processo5000969-41.2021.8.24.0036
Data08 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 5000969-41.2021.8.24.0036/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


AGRAVANTE: BEN HUR NEUKIRCHEN DE DEUS BATISTA (AGRAVANTE) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)


RELATÓRIO


Pronunciamento judicial agravado: o juiz de direito Samuel Andreis, da 2ª Vara Criminal da comarca de Jaraguá do Sul, indeferiu o pedido formulado pelo apenado Ben Hur Neukirchen De Deus Batista de aplicação do percentual previsto no inciso V do art. 112 da LEP para o cálculo do requisito objetivo da progressão de regime, nos seguintes termos:
A Defensoria Pública pugna pela aplicação dos novos percentuais para progressão de regime instituídos pela Lei n. 13.964/2019.
Conforme a decisão do evento 54, as condenações do apenado somam 19 anos, 7 meses e 17 dias de reclusão, sendo 13 anos, 5 meses e 20 dias por crimes equiparados a hediondo e 6 anos, 1 mês e 27 dias por crimes comuns.
Nos autos da ação penal n. 0003596-11.2018.8.24.0036 (PEC n. 0008172-47.2018.8.24.0036), que o condenou pela prática de crime equiparado a hediondo, foi reconhecida a reincidência em razão da condenação anterior (autos n. 0003172-03.2017.8.24.0036 - crime comum).
A regra anterior à Lei n. 13.964/19 previa que, no caso de crime comum, "a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva, com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos 1/6 da pena no regime anterior e seu mérito indicar a progressão" (art. 112 da LEP).
Já no caso de crime hediondo, de tortura, tráfico de entorpecentes e de terrorismo, a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva, com a transferência para regime menos rigoroso, quando se tiver cumprido ao menos 2/5 de pena se primário e 3/5 se reincidente e o seu mérito indicar a progressão (art. 112 da LEP c/c art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.072/90).
O necessário resgate da fração de 3/5 da pena nos crimes hediondos e a eles equiparados, como já decidido pelos tribunais superiores, se estende à totalidade das penas somadas, não se exigindo que a reincidência seja específica, nem mesmo que seja reconhecida em cada uma das condenações.
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE INDEFERIU O PLEITO DE PROGRESSÃO DO REGIME. RECURSO DEFENSIVO. TESE ACERCA DA IMPOSSIBILIDADE DE SOMA DAS PENAS DE RECLUSÃO E DETENÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE. SOMA QUE VIABILIZA O RESGATE CONCOMITANTE DAS REPRIMENDAS EM REGIME MAIS GRAVOSO. INTELIGÊNCIA DO ART. 111 DA LEP. PRECEDENTES. INSURGÊNCIA EM RELAÇÃO À FRAÇÃO DE 3/5 ADOTADA PELO MAGISTRADO A QUO PARA FINS DE CÁLCULO DA PROGRESSÃO DO REGIME, NO TOCANTE ÀS CONDENAÇÕES POR CRIME HEDIONDO, NAS QUAIS NÃO FOI CONSIDERADO REINCIDENTE. INSUBSISTÊNCIA. REINCIDÊNCIA RECONHECIDA EM PROCESSO POSTERIOR, NO QUAL O APENADO FOI CONDENADO POR CRIME COMUM. CONDIÇÃO PESSOAL QUE, POR ISSO, GERA EFEITOS EM TODAS AS SUAS CONDENAÇÕES, SEJAM ELAS ANTERIORES OU POSTERIORES, COM OU SEM RECONHECIMENTO NA SENTENÇA CONDENATÓRIA, BEM COMO SEJA A REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA OU GENÉRICA. DECISUM INALTERADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (grifei - TJSC, Agravo de Execução Penal n. 0003293-05.2019.8.24.0022, de Curitibanos, Rel. Antônio Zoldan da Veiga, Quinta Câmara Criminal, j. em 14/05/2020.
Nota-se, portanto, que uma vez reconhecida a reincidência, será necessário o cumprimento de 3/5 da pena em relação às condenações por crime hediondo ou a ele equiparado.
A Lei n. 13.964/2019, em relação à progressão de regime nos crimes hediondos, não trouxe inovação, uma vez que os percentuais previstos correspondem às frações que já eram anteriormente previstas (40% para réu primária e 60% para réu reincidente).
Anoto que a norma também não estabeleceu como necessário o reconhecimento da reincidência específica, permanecendo inalterada a sistemática já adotada anteriormente à vigência desta Lei.
Nesse sentido, destaca-se recente decisão do nosso Tribunal de Justiça:
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL - DECISÃO QUE MANTEVE A INCIDÊNCIA DA FRAÇÃO DE 3/5 NO QUE SE REFERE À PROGRESSÃO DE REGIME - RECURSO DO APENADO.PLEITO DE APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DE 2/5 DIANTE DA REINCIDÊNCIA GENÉRICA - INVIABILIDADE - APENADO QUE É REINCIDENTE ESPECÍFICO - ADEMAIS, CONDIÇÃO DE REINCIDENTE QUE INDEPENDE SE A REINCIDÊNCIA É ESPECÍFICA OU GENÉRICA - MUDANÇA LEGISLATIVA TRAZIDA PELO PACOTE ANTICRIME QUE EM NENHUM MOMENTO ESPECIFICA A NECESSIDADE DA REINCIDÊNCIA SER ESPECÍFICA - FRAÇÃO DE 3/5 QUE DEVE SER UTILIZADA - PRECEDENTES DESTA CÂMARA.I - A reincidência não se presta como mera ferramenta de cálculo; trata-se de verdadeira condição pessoal do apenado, que serve de baliza para a aferição da conveniência ou não de benefícios.II - A condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre a totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada condenação e tampouco a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das reprimendas (STJ, HC 307.889/RS, rel. Min. Félix Fischer, j. em 01.09.2015).II - Ao tratar dos impactos do Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/2019) na Lei de Execução Penal, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, "apesar da atecnia ao não deixar clara a situação do apenado reincidente por crime comum e condenado por delito hediondo, o legislador, em momento algum, exige que a reincidência mencionada no inciso VII seja específica, conforme argumentado pela Defesa" (HC n. 583.751/SP, rel. Min. Félix Fischer, j. 16-6-2020). Nesse sentido: TJSC, Agravo de Execução Penal n. 0000720-63.2020.8.24.0020, rel. Des. Alexandre d"Ivanenko, j. Em 10/07/2020) (grifei - Agravo de Execução Penal n. 0000878-79.2020.8.24.0033, de Itajaí, Rel. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. Em 27/08/2020).
Pelo exposto, não prospera a tese defensiva, razão porque a indefiro. (evento 104 dos autos originários).
Recurso de Agravo de Execução Penal: o apenado, por intermédio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, interpôs recurso e argumentou que o art. 2º, §2º, da Lei 8.072/1990 foi expressamente revogado pela Lei 13.964/2019, a qual, ainda, passou a fazer distinção entre primariedade e reincidência específicas em crime hediondo ou equiparado, e "não trouxe qualquer previsão sobre o condenado por crime hediondo ou equiparado quando primário em crime desta natureza mas reincidente em crime comum [...], de modo que deve prevalecer o patamar de 40%".
Requereu o conhecimento e provimento do presente recurso a fim de reformar a decisão impugnada e aplicar aos crimes equiparados a hediondo a fração de 2/5 para progressão de regime (evento 1, Eproc/PG).
Contrarrazões: o Ministério Público do Estado de Santa Catarina impugnou os argumentos apresentados sob o fundamento de que "o percentual de 40% deve ser considerado para o apenado primário, condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, ao passo em que o percentual de 60% deve ser considerado para o apenado reincidente condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, pouco importando se específica ou comum a reincidência".
Postulou a manutenção da decisão objurgada (evento 9, Eproc/PG).
Juízo de retratação: o juiz de direito Samuel Andreis manteve a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos (evento 11, Eproc/PG).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Francisco Bissoli Filho manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 7).
Este é o relatório

VOTO


O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se aos argumentos expostos em sede recursal.
A progressão de regime da pena privativa de liberdade, como se sabe, permite a transferência do condenado para um regime menos gravoso, a fim de que possa comprovar o seu senso de responsabilidade e aptidão à vida em liberdade, porquanto a finalidade da Lei de Execução Penal é a ressocialização do apenado.
O referido benefício está previsto no art. 112 da Lei de Execução Penal, que, nos termos da redação dada pela Lei 10.792, de 1º de dezembro de 2003, assim previa:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.
Com o advento da Lei 11.464/2007, foi admitida expressamente a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos, determinando como critério objetivo para esses delitos e a eles equiparados o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se primário, e 3/5 (três quintos), se reincidente (Lei 8.072/1990, art. 2º, § 2º), mantendo-se a fração do art. 112 da LEP quando o crime hediondo foi praticado antes da entrada em vigor da referida legislação.
Oportunamente, firmou-se posicionamento no sentido de que, a progressão de regime para os condenados por crime hediondo dar-se-á, se o sentenciado for reincidente, após o cumprimento de 3/5 da pena, ainda que a reincidência não seja específica em crime hediondo ou equiparado, pois a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum e a específica, conforme informativo 563 da jurisprudência do STJ (vide: STJ, AgRg no HC 521.434/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. em 1-10-2019, v.u.; AgRg no HC 460.910/PR, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, j. em 21-11-2019, v.u.; STF, RHC 176131 AgR, Rel. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. em 5-11-2019; TJSC, Agravo de Execução Penal 0002390-50.2017.8.24.0018, de Chapecó, rela. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, Primeira Câmara...

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